segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Bachelet: carisma para impulsionar reformas no Chile

Ex-presidente, eleita para novo mandato, enfrenta altas expectativas e desafio de aprovar medidas para diminuir a desigualdade no país

Reuters

SANTIAGO - Quando Michelle Bachelet foi designada ministra da Saúde, em 2000, o então presidente Ricardo Lagos lhe deu uma tarefa desafiadora: terminar em três meses com as longas filas nos centros médicos. Bachelet trabalhou duro para cumprir o prazo, mas não conseguiu. No entanto, quando Lagos visitou um posto para avaliar a situação, uma mulher se aproximou dele para elogiar a ministra e pedir-lhe para mantê-la no cargo.

- Nesse curto período, ela estabeleceu um relacionamento, uma empatia (com as pessoas) - contou Lagos.

Os esforços para melhorar e aumentar os centros de saúde e seu estilo descontraído abriram as portas para Bachelet se tornar a primeira mulher a ocupar a Presidência chilena, entre 2006 e 2010. A política socialista volta para um segundo mandato com o mesmo carisma e uma meta ainda mais ambiciosa - reduzir o fosso cada vez maior entre ricos e pobres.

Torturada durante a ditadura de Augusto Pinochet e mãe solteira de três filhos, Bachelet foi um dos presidentes mais incomuns no conservador Chile desde o retorno à democracia, em 1990. Ela é amada pela maioria das mulheres das classes média e baixa, desencantadas com a elite política chilena - que se orgulha de estabilidade e crescimento da economia de um país com o pior índice de distribuição de renda entre os membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) .

Mas seus críticos dizem que sua popularidade depende muito de sua personalidade. E muitos eleitores - desiludidos com o seu primeiro mandato por suas políticas moderadas - estão céticos em relação às promessas de mudança. Bachelet prometeu várias reformas, incluindo um aumento nos impostos corporativos para financiar melhorias na educação pública, mudanças na Constituição herdada da ditadura e a legalização do aborto em alguns casos.

Tortura, exílio e medicina
Muitos daqueles que se sentem marginalizados em um país citado como uma história de sucesso na América Latina depositaram suas esperanças sobre ela. Longe dos arranha-céus brilhantes e dos parques imaculados de Santiago, dezenas de fãs em êxtase, no bairro humilde de Cerrillos, aplaudiram a ex-presidente durante um comício de campanha no mês passado.

- Ela é uma lutadora. Isso é o que eu mais valorizo - disse Josefina Osorio, uma estudante de direito de 32 anos, que deu os gritos de boas-vindas a Bachelet . - Ela vem com novas ideias.

Impedida de concorrer a um segundo mandato consecutivo pela Constituição, Bachelet se mudou para Nova York para chefiar o Escritório das Nações Unidas para a Mulher. Nesse cargo, viajou ao redor do mundo para defender os direitos das mulheres, o que lhe permitiu desenvolver sua capacidade de negociação e autoconfiança, dizem analistas.

Em um exemplo de simplicidade, Bachelet disse durante uma entrevista de televisão recentemente que uma das coisas que gostou em viver fora do Chile foi a liberdade de ir às compras de bermuda. Durante o mesmo programa, dançou com o popular apresentador Don Francisco.

- Ela defende uma espécie de ideologia social e não uma ideologia política - explica Guillermo Holzmann, analista político da Universidade de Valparaíso. - Não há uma explicação lógica ou teórica (sobre sua popularidade).

Algumas de suas propostas estão enraizadas em sua própria vida, refletindo as cicatrizes da ditadura militar chilena. Como uma jovem ativista de esquerda, a vida de Bachelet foi profundamente marcada pelo golpe de Estado que derrubou o presidente Salvador Allende em 1973. O pai de Bachelet, um general da Força Aérea leal a Allende, foi preso e torturado por agentes de Pinochet. Alberto Bachelet morreu na prisão em 1974.

Dois anos mais tarde, dois policiais à paisana invadiram o apartamento no qual viviam Bachelet e sua mãe, que foram levadas de olhos vendados para Villa Grimaldi, um centro de tortura nos arredores de Santiago. Bachelet foi espancada e torturada durante a detenção. Uma vez livre, partiu com a mãe, a arqueóloga Angela Jeria, para a Austrália e depois para a Alemanha Oriental. No exílio, ela conheceu Jorge Davalos, um arquiteto chileno, pai de dois dos seus filhos.

Bachelet voltou ao Chile em 1979 para completar seus estudos em medicina, depois entrou para o Ministério da Saúde e começou sua carreira política. Muitos se perguntam por que ela não implementou antes as propostas apresentadas na nova campanha. E as expectativas são altas para o novo mandato.

- Espero, principalmente, que implante a educação gratuita. Isto é o que eu mais quero, porque tenho netos - disse Marta Monica Ramirez, uma comerciante de 65 anos.

Fonte: O Globo

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