domingo, 27 de abril de 2014

Petrobras já temia, em 2012, danos à imagem por causa de Pasadena

Uma das preocupações era que administradores tivessem de depor na Justiça

Chico de Gois, Vinicius Sassine e Danilo Fariello – O Globo

BRASÍLIA - Documento interno assinado por dois gerentes-executivos da Petrobras e endereçado à presidente da empresa, Maria das Graças Foster, com data de 4 de junho de 2012, demonstra que a estatal estava preocupada com prejuízos à sua imagem e, por isso, queria pôr fim o mais rapidamente possível à disputa judicial que se arrastava desde 2008 com a companhia belga Astra Oil sobre a refinaria de Pasadena, no Texas.

Uma das preocupações da diretoria, segundo ofício encaminhado a Graças Foster, ao qual O GLOBO teve acesso, era "proteger os administradores, ex-administradores e executivos de uma eventual exposição". A presidente Dilma Rousseff presidia o Conselho de Administração da Petrobras em 2006, quando foi autorizada a compra de Pasadena. Nestor Cerveró era diretor da área internacional na época e sugeriu a transação ao conselho, com base em parecer "falho e incompleto", como acusou a presidente para justificar ter sido favorável à compra da refinaria.

O temor da Petrobras era motivado pelo fato de que a disputa entre as ex-sócias envolvia diversas ações judicias nos Estados Unidos, e, assim, os administradores e ex-administradores poderiam ser chamados a prestar esclarecimentos à Justiça americana, como admitiu a própria petroleira em nota enviada ao GLOBO. Hipoteticamente, portanto, se a disputa jurídica entre Petrobras e Astra continuasse, Dilma e Cerveró poderiam ser chamados a depor nos EUA.

O ofício enviado a Graças Foster tem como tema o "encerramento de todas as disputas judiciais envolvendo a Petrobras America Inc (PAI) e o Grupo Transcor Astra". A PAI foi a subsidiária que se tornou sócia da Astra em Pasadena. Graças Foster havia assumido a presidência da Petrobras em 13 de fevereiro de 2012. Na época, o gasto bilionário para a aquisição de Pasadena já começava a se tornar público.

Uma das maiores preocupações da empresa brasileira, apontam documentos internos, era com a exposição do caso na imprensa e no mercado internacional. O ofício de 4 de junho de 2012 lista cinco motivações para a Petrobras celebrar um acordo com a Astra Oil: liquidar todos os litígios ("a exposição total da Petrobras chega a US$ 1,2 bilhão"); viabilizar dois projetos de desinvestimento em curso; liberar recursos congelados em dois bancos, da ordem de US$ 160 milhões; cessar o acréscimo de juros de 5% ao ano e despesas processuais de US$ 40 milhões/ano; e proteger os administradores, ex-administradores e executivos.

Um trecho do ofício diz que é preciso "eliminar riscos intangíveis inerentes à continuidade do contencioso, por exemplo, eventuais impactos no valor da marca Petrobras, principalmente no mercado externo, na imagem e na capacidade de captação direta de recursos pela PAI, em razão de seu balanço apresentar essa contingência material, e na posição da Petrobras em atuais e/ou futuras negociações com parceiros internacionais".

Outro documento deixa claro que a empresa também estava preocupada com a tramitação do processo nos tribunais dos Estados Unidos. Para os diretores da Petrobras, isso poderia expor a petroleira brasileira. Trecho do documento diz que era preciso "retirar a controvérsia das cortes dos EUA, que seguem procedimentos de produção de prova/documentos extremamente dispendiosos e arriscados e expõem a comunicação interna". Os brasileiros queriam tentar levar o caso para os fóruns da Bélgica ou do Brasil, o que, em sua visão, seria melhor.

Entre as preocupações com o processo que tramitava nos EUA estaria a possibilidade de o Departamento de Justiça local avaliar o caso à luz do Foreign Corrupt Practices Act (FCPA, a Lei Anticorrupção Americana para Estrangeiros). Em casos onde há falta de controles internos de ativos no país, as empresas estrangeiras podem ser multadas e até impedidas de fazer negócios com o país.

Para tentar reduzir o impacto negativo na imagem da empresa, a diretoria executiva da Petrobras autorizou um repasse de US$ 58,7 milhões à refinaria de Pasadena, em 2008. O propósito era resolver problemas urgentes no funcionamento do empreendimento e, assim, evitar o "desgaste político e de imagem da Petrobras junto ao governo norte-americano". As informações estão em outros documentos confidenciais obtidos pelo GLOBO.

A briga travada desde 2007 com a então sócia da refinaria levo Pasadena a enfrentar um grave problema de caixa, por conta da interrupção de repasses de dinheiro pela sócia belga.
A Diretoria Internacional da Petrobras, então, validou um documento interno para pedir autorização de repasses imediatos de verba à refinaria do Texas. O documento, de setembro de 2008, foi validado pelo então diretor da área, Jorge Luiz Zelada. No pedido, fica evidenciada a preocupação com um desgaste do Brasil com o governo dos EUA.

“Não houve nem há ação”
Se as remessas não fossem feitas, poderia haver a declaração de insolvência de "ambas as empresas" envolvidas no negócio, como consta no ofício. As consequências, dizem os documentos, seriam o desgaste político e de imagem da estatal brasileira com o governo dos Estados Unidos, com acionistas e com a sociedade em geral, assim como "perda de pessoal qualificado e prejuízos econômicos irreversíveis". Os recursos necessários, em caráter de urgência, somavam US$ 83,7 milhões. A refinaria precisava fazer um "depósito imediato do valor correspondente ao déficit no banco, sob risco de encerramento imediato da linha de crédito".

A assessoria de imprensa da Petrobras informou que "não houve nem há ação judicial contra executivos da companhia no caso Pasadena". A assessoria também negou que a intenção de encerrar logo a contenda com a Astra foi proteger a imagem de Dilma. Ainda segundo os assessores, a empresa não fez nenhum levantamento sobre os prejuízos à sua imagem.

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