quarta-feira, 23 de abril de 2014

Rosângela Bittar: A carta forte na mesa

O novo Banco Central, com autonomia e mandato

- Valor Econômico

Em um governo Eduardo Campos (PSB), o Banco Central terá autonomia não apenas informal. O candidato a presidente começou a debater internamente com sua equipe de economistas e acadêmicos que elaboram o programa de governo o que está chamando de "autonomia legal" para o BC, com mandato. "Estou trabalhando internamente para colocar no programa a autonomia legal. Acho um sinal importante para a retomada. Estamos tendo tantos problemas no Brasil que é preciso colocar uma carta forte na mesa. Eu acho que essa é uma carta forte importante", afirmou, ontem, em entrevista por telefone, enquanto se dirigia ao voo que o levaria de Florianópolis a Chapecó, em Santa Catarina.

O ex-governador de Pernambuco e candidato do PSB a presidente começou a fazer ontem, com a candidata a vice em sua chapa, a ex-senadora Marina Silva (Rede), viagens de apresentação às principais cidades de cada Estado, com o objetivo de tornar-se mais conhecido. Por sinal, embalado por análise de pesquisa Datafolha que o aponta como beneficiário de uma constatação: entre os 17% dos eleitores que conhecem os três principais candidatos, há um empate técnico, com Eduardo em primeiro lugar. O que dá razão aos analistas que defendem a impropriedade de comparações de intenção de voto entre candidatos conhecidos e desconhecidos.

Enquanto se apresenta ao eleitorado, Eduardo vai tratando de dar forma ao programa de governo em discussão por sua equipe. Haverá um seminário no dia 30 e vários outros até a convenção de junho, quando divulgará o conjunto do seu projeto. O próximo tratará de economia e energia.

"Qual a minha argumentação interna? Todas as agências têm mandato, por que o Banco Central não deve ter?" Acredita que essa seja uma ideia que sinaliza concretamente seu rumo. "Eu assumir isso passa uma visão, cria uma relação de confiança com os agentes econômicos. A autonomia informal já está. Eu estou nesse momento evoluindo na discussão interna para a autonomia legal".

Um instrumento de financiamento muito controvertido ultimamente também está na agenda de debates: o BNDES. Para Eduardo Campos, o BNDES tem que voltar ao "seu leito normal", de onde saiu em 2009, por razões que define como conjunturais.

"Voltar ao leito de normalidade, inclusive diversificar e pulverizar seus investimentos, chegar à micro e pequena empresa". O ex-governador não é nada taxativo com relação a suas ideias, tudo o que diz é o que está levando ao debate interno do seu grupo, e sempre usando o plural, "nós"...

Além dos já sabidos economistas André Lara Resende e Eduardo Giannetti, estão também no grupo de formuladores alguns economistas mais jovens, outros considerados mais regionais, uma turma diversificada. Os seminários e discussões têm tido a contribuição de pessoas como Tânia Bacelar, Leonardo Guimarães, Tiago Cavalcanti, os dois últimos ligados a Cambridge que vieram envolver-se nos debates.

Há um consenso de que o mal maior da economia brasileira é a falta de credibilidade da equipe e das decisões. Como resgatá-la? "Inaugurando uma nova governança", afirma Eduardo Campos.
Essa nova governança inclui expressar a decisão de que romperá "o pacto político que está aí nesse presidencialismo de coalizão". Isso, segundo disse, vai lhe permitir montar uma equipe que tenha o respeito da sociedade e que possa cumprir metas. "Como você vai baixar a carga tributária, melhorar a qualidade do serviço público preenchendo as funções públicas na forma de um velho balcão da chantagem política?"

Para Eduardo Campos, quem teve a capacidade de tirar os generais, fazer a transição democrática, romper um ciclo de hiperinflação, viver um tempo de inclusão, por que não pode melhorar a qualidade da governança do país e colocar na oposição "essa tropa que sequestra todos os governos?"

O ex-governador de Pernambuco acredita também em um Congresso diferente, uma nova maioria que, parte dela, a sociedade vai ajudar a eleger. "Vai haver uma surpresa, virá aí um voto de mudança muito grande no Congresso". A outra parte se produz com o exemplo do partido que lidera.

"Todos querem um ministério para chamar de seu, todos querem uma estatal para chamar de sua, todos querem um fundo de pensão para chamar de seu. Isso aí está esgotado como política", determina. Segundo sua opinião, a chapa é a força política a se apresentar e dizer: "Nós somos o caminho que vai garantir a ruptura desse padrão". Não é negar a política, alerta, é remeter a política a um outro padrão.

Os seminários internos discutem também o recrudescimento da inflação. "Precisamos retomar o compromisso com a meta, e não é com o teto, é com o centro da meta. E como se faz isso? As políticas têm que estar articuladas. Não pode a política monetária ir para um lado e a fiscal para o outro. Agora nós temos a bomba relógio, uma série de preços administrados que estão represados. Precisamos jogar isso com o tempo para não ter efeitos que sabemos quais são." O candidato acha que o governo atual só está esperando passar as eleições para recompor os preços, senão não chega ao fim do ano.

Explicando o que seria o novo desenvolvimentismo, expressão com que alguns economistas estão definindo seu programa econômico, Eduardo Campos afirma querer buscar o crescimento econômico com qualidade, "uma visão de que é possível fazer o desenvolvimento não às custas de largar a inflação, bagunçar as contas públicas e ter ciclos curtos de crescimento. Vamos ter uma visão de longo prazo, de responsabilidade fiscal, de sinalização consistente para o mercado".

O candidato reafirma seus compromissos com uma agenda de reformas com prioridade para algumas: "Fazer uma reforma tributária, temos também ajustes na Previdência, coisas pontuais mas importantes de serem feitas". O salário mínimo com poder de compra recomposto é questão "fundamental no Brasil". E responde ao pedido para avaliar como pode haver gestão em um governo loteado, um aparelhamento partidário como nunca visto no Executivo, Legislativo e até Judiciário, com uma palavra: critério. Critério para formação de listas, critério para escolha, critério para nomeação. A ruptura do velho padrão, a construção do novo.

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