sábado, 31 de maio de 2014

Merval Pereira: Custos da fragmentação

- O Globo

Entre os cientistas políticos há um consenso: o Brasil é atualmente o país com o sistema partidário mais fragmentado do mundo, e isso é ruim para a democracia. Mesmo os que consideram que a alta fragmentação significa inclusão política, constituindo um mecanismo de controle do Executivo, muito forte no nosso sistema presidencial, admitem que essa característica representa mais custos para a máquina governamental e menor eficiência do governo.

O cientista político Sérgio Abranches, que cunhou a definição de “presidencialismo de coalizão” em um estudo de 1988, está trabalhando agora com o termo “partidos efetivos” para delimitar o tamanho da coalizão na realidade do Congresso. Estamos hoje com 10 a 12 “partidos efetivos” na coalizão presidencial, o maior já registrado.

Octavio Amorim Neto, da Fundação Getulio Vargas do Rio, que defende a representação proporcional e um sistema multipartidário para o Brasil, acha que a questão é saber qual o grau de fragmentação adequado ao país. Para ele, o atual sistema partidário brasileiro é muito mais fragmentado do que demanda a heterogeneidade social do país.

Concordando com Timothy Power, professor de Oxford e um dos grandes brasilianistas da atualidade, Octavio Amorim Neto considera que a alta fragmentação no Brasil responde mais às necessidades do sistema político do que às da sociedade.

O que há de problemático em tais governos, diz ele, é o fato de terem maiores dificuldades na implementação de ajustes ficais e responderem mais lentamente a desequilíbrios orçamentários do que os governos monopartidários ou com poucos partidos.

Carlos Pereira, professor de Políticas Públicas na Fundação Getulio Vargas no Rio, criou um “índice de eficiência da coalizão”. Dividindo o apoio legislativo por custos de gerência da coalizão, “podemos construir uma curva de eficiência que permite comparar custos vis-à-vis apoio”.

O estudo deixa claro que não existe relação entre maiores custos de gerência e maior apoio legislativo. “Na realidade, maiores custos não se traduziram em maior apoio dos parlamentares. O inverso também é verdadeiro”.

Em diversos momentos, mesmo com grande investimento, seja pela criação de ministérios, seja pela liberação de emendas, ou ainda pelo desembolso de maiores recursos dos ministérios, o governo teve pouco apoio às suas iniciativas, lembra.

O governo Dilma é o grande exemplo desse aparente paradoxo, diz Pereira, para quem é necessário “gerenciar bem a coalizão construindo coalizões com um menor número de partidos que compartilhem preferências de políticas e o presidente necessita dividir poder. Do contrário, os custos serão crescentes”.

Já Jairo Nicolau, da UFRJ, diz que o que diferencia o Brasil “não é o fato de termos 32 legendas registradas, mas não termos algumas legendas maiores que concentrem o poder partidário. Na maioria dos legislativos do mundo, alguns poucos partidos concentram muitas cadeiras e, mesmo quando existem muitos partidos, os menores tendem a ser muito pequenos”.

Nas três últimas eleições, nenhum partido ultrapassou as 100 cadeiras, pouco menos de 20% da Câmara, e para piorar as coisas a atual Câmara dos Deputados, além de ser a mais fragmentada de nossa história, diz Nicolau, nunca se registrou “número tão alto na história de nenhuma outra democracia”.

A criação de cinco legendas (PSD, PPL, PEN, PROS e Solidariedade) nesta legislatura foi responsável por essa explosão, quadro que gera enorme dificuldades para o chefe do Executivo nas negociações com as bancadas no Legislativo e na montagem do seu Ministério. “Sem contar que nesse cenário, pequenas legendas têm seu poder de barganha desproporcionalmente aumentados”. Um exemplo claro é o poder que elas adquiriram ao negociar seus segundos de televisão na montagem das coalizões eleitorais. ( Continua amanhã)

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