segunda-feira, 23 de junho de 2014

Ricardo Noblat: O problema é o elenco, estúpido!

- O Globo

“Futebol é muito simples: quem tem a bola ataca; quem não tem defende” Neném Prancha

O que os políticos e a Seleção Brasileira têm em comum? Ambos se preocupam mais com a defesa.

Compreende-se que os políticos procedam assim. Afinal, inocentes ou culpados, antes de tudo são suspeitos de prometerem o que não fazem, de trambicagens inimagináveis e de traírem o voto que os elege.

Só há um motivo para que a Seleção aposte mais na defesa: o medo que seus dirigentes têm da derrota.

O medo deriva de outra coisa que aproxima políticos e Seleção: a carência de uma ideia nova. O Plano Real foi a ideia nova que marcou o período de oito anos do presidente Fernando Henrique Cardoso. E a inclusão social, a que marcou o período de oito anos do presidente Lula.


Agradecido, o povo quer mais. E por ora nada surgiu capaz de satisfazê-lo. Ocorre o mesmo com a Seleção. Que nova proposta sustenta o futebol que ela apresentou na Copa até aqui? Ou nos amistosos que a precederam?

O exercício da política entre nós só tem feito se deteriorar desde o fim da ditadura militar de 64.
Nos anos 80, por exemplo, quando se reclamava da qualidade do Congresso, o deputado Ulysses Guimarães, então presidente do PMDB, respondia: “Espere o próximo”. Quanto à Seleção...

A rigor o futebol servido por ela não surpreende o mundo desde o tri no México em 1970.

Esta tarde, em Brasília, não basta que a Seleção vença a dilacerada Seleção de Camarões. Nem mesmo que a goleie.

É preciso que exiba um futebol capaz de resgatar pelo menos parte da confiança da torcida abalada por seu desempenho mediano até aqui.

Contra a Croácia, demos graças ao Senhor. Ou melhor: ao juiz japonês que viu um pênalti onde não houve. Contra o México, o medo venceu a esperança.

Na maioria das vezes só ganha quem não tem medo de perder.

É verdade que fomos tetras na Copa de 1994 exibindo um futebol de segunda categoria. Ou de terceira. Fomos penta em 2002 quando o brilho de três ou quatro jogadores se impôs a um esquema burocrático de jogo.

Mas o que é pior: a melhor lembrança do futebol de 1958, 1962 e 1970 está, hoje, nos pés e na imaginação de alguns dos nossos adversários.

Salve a Alemanha do futebol compacto pontuado de estrelas que trocam de posição e que não se desesperam nem mesmo se estiverem em desvantagem no placar. Foi o que ocorreu no último sábado quando empatou com Gana. Sem falar do extravagante 4 x 0 aplicado em Portugal de Cristiano Ronaldo.

Salve a Holanda que ocupa todos os espaços do campo, sobe e desce em bloco e dispõe de um contra ataque mortal.

Salve o Uruguai que fez contra a Inglaterra um dos melhores jogos desta Copa. Exibiu a garra que falta à Seleção Brasileira desde a final da Copa das Confederações.

Salve a França que desencantou em cima da Suíça e que mais de uma vez já foi a nossa algoz.

Cuidado com a Itália e a Argentina. Estão um degrau a baixo das que merecem ser louvadas. Em todo o caso, A Argentina tem Messi. A Itália, o maestro Andrea Pirlo.

Que temos? Temos Neymar. Que como Messi pode decidir uma parada. Mesmo ele, porém, se apagou no jogo contra o México.

É tal seu apetite pela bola que com frequência não a compartilha. Tem quatro anos a mais do que tinha Pelé quando jogou uma Copa pela primeira vez. Está longe de lembrá-lo.

O que se espera dele está além do que tem para dar. Corre o risco de ser esmagado pela expectativa nacional.

Assim na política como no futebol, o problema está no elenco, estúpido! Infelizmente, a pobreza é geral.

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