quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Cientistas políticos se dividem sobre segundo turno

• No entanto, concordam que Marina é alternativa para o PSB, que não tem outro nome como o de Campos

Carolina Benevides e Renata Leal – O Globo

A morte de Eduardo Campos, candidato do PSB à Presidência, divide cientistas políticos e historiadores ouvidos pelo GLOBO sobre a corrida eleitoral deste ano. Há quem aposte que a eleição será levada para o segundo turno se Marina Silva, até então vice de Campos, for confirmada como a candidata dos socialistas. Com ela, o quadro político, que já conta com Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB) nos primeiros lugares da pesquisa, sofreria "mudança significativa". A presença da ex-senadora como cabeça de chapa, no entanto, poderia, para outros especialistas, fazer com que a eleição fosse decidida mesmo em 5 de outubro.

Todos concordam, porém, que o PSB não tem em seus quadros um nome nacional como o de Campos, o que faz com que Marina se torne a alternativa. Dizem ainda que o partido terá dificuldade para encontrar um nome para ser o vice, e que a candidatura de Marina, que se filiou por não conseguir fundar a Rede, seria "de certa maneira uma derrota para o PSB".

Marly da Silva Motta
"Vejo alguns cenários: a Marina pode ser candidata à Presidência. Pode ser ainda que o partido decida lançar um nome próprio. Os socialistas têm bons nomes, como Beto Albuquerque (deputado federal), Márcio França (vice na chapa de Geraldo Alckmin) e Renato Casagrande (governador do ES), mas não vejo nenhum com estatura para o cenário nacional.

O partido não tem também nomes nacionais para ser o vice. Por outro lado, deixar que o vice seja também da Rede (grupo de Marina) seria decretar a falência do PSB. Por conta disso, podem até cogitar apostar na Renata (Campos), mulher de Campos, para ser vice de Marina. Ela tem tradição na militância. Mas, numa eleição presidencial, duvido que assumir o legado do marido cause impacto no eleitorado. Além dessas opções, o partido pode ainda decidir retirar a candidatura, o que faria a eleição ser plebiscitária. Essa possibilidade é a mais distante.

Em relação ao eleitorado, acredito que o de Pernambuco migre para Dilma, assim como o do Nordeste. O das outras regiões, em menor grau, acho que migra para o Aécio. Isso porque os perfis regional e ideológico de Campos são mais voltados para a esquerda. Para o Pastor Everaldo, não vejo migração. Com esse quadro, ganha força a eleição sendo decidida no primeiro turno. Mas, nesse primeiro momento, vai ter muita gente desamparada."

David FLeischer
"Marina se tornar candidata à Presidência é de certa maneira uma derrota para o PSB, mas tem outra saída? Se o partido a confirmar, a eleição tende a ir para o segundo turno. Marina é mais conhecida que Campos. Disputou a Presidência em 2010 e foi ministra do Lula. Já nas próximas pesquisas talvez tenha mais intenção de votos do que ele. No entanto, se a eleição for para o segundo turno, com Dilma e Aécio, pode ser que ela repita 2010 e não apoie ninguém. Nesse cenário, acredito que o Aécio tente conquistar o apoio dela, que não simpatiza com Dilma, com quem teve embates quando eram ministras.

Se Marina for a candidata, ela vai trazer o meio ambiente para a pauta, e Dilma e Aécio terão que incluir o tema e a sustentabilidade nas suas campanhas. Além disso, pode ser que o número de indecisos caia um pouco com essa candidatura, ainda que por enquanto a gente não saiba qual será a rejeição de Marina.

Por outro lado, a morte de Campos pode fazer com que o eleitor dele migre para Aécio e para Dilma. E a chegada de Marina pode fazer com que alguns "dilmistas" e "aecistas" migrem para ela. Como Marina é da Assembleia de Deus, assim como o Pastor Everaldo, pode ser ainda que ele perca alguns votos.

No mais, Marina pode impactar as candidaturas estaduais. Ela provoca emoções fortes. Sendo cabeça de chapa, pode não aceitar determinadas alianças."

Daniel Aarão Reis
"Se a candidata for a Marina, o quadro político sofre mudança significativa. Campos, quando com ela, registrou um crescimento. Se o partido a escolher, terá chances interessantes. Inclusive porque a tragédia pode ser compensada através do voto, pode suscitar numa transformação. Marina apareceria como a candidata que viria lutar pelos ideias de Campos. (Sobre) os votos em branco e nulos, que chegam a um terço do eleitorado, essas pessoas têm mais chances de optar por ela do que teriam de optar por Eduardo. Ele representava uma terceira via, mas ela preenche melhor esse espaço.

Não vejo nos quadros do partido ninguém que tenha a estatura que Campos tinha. Acho que pode acontecer uma coligação, mas o mais provável é que a Marina assuma a candidatura, por mais que isso signifique algum risco. Ela tem uma personalidade muito própria, e o PSB pode perder um certo controle."

Sérgio Abranches
"A decisão de quem será o candidato tem que ser tomada em dez dias, segundo a lei, mas a campanha na TV e no rádio começa antes. O PSB terá que decidir se mantém o acordo, com Marina de vice. Mas o partido não tem liderança com a mesma expressão do Campos. Então, se ela se torna a candidata, pode ficar no mesmo patamar de Aécio, o que configuraria levar a eleição para o segundo turno.

Agora, se for candidata, ela terá que se acomodar nas alianças feitas com o PSB. O Campos aceitava mais do que ela o que chamam de velha política. Ela tem mais restrições. Só que o dono legal da chapa é o PSB. A Rede não é partido ainda."

Christiane Jalles
"É imensa a dificuldade de se fazer qualquer previsão. Como o PSB vai se articular internamente para apoiar Marina ou qualquer outro nome? O Campos vinha construindo a candidatura há tempos. O partido tem grandes lideranças regionais e estaduais, mas há outro nome para substitui-lo? O PSB pode até ter dificuldade em escolher a Marina, mas ela é conhecida nacionalmente e acaba sendo uma alternativa.

(Uma das questões é que) o PSB era o cabeça de chapa e pode não ser mais. Ainda que ela esteja no partido, sabemos que tem outras pretensões. É mais difícil que Marina se torne uma grande liderança no PSB."

Roberto Romano
"Será difícil encontrar um candidato para o partido e para a coligação que o apoiava. E essa morte vai fazer o Brasil voltar ao estágio anterior, no qual de um lado estavam os tucanos e do outro, os petistas. A presença de Campos quebrava esse circuito.

Não sei se o PSB vai apresentar Marina. Se isso acontecer, ela tende a recolher votos. Em relação ao eleitorado, uma parcela considerável fica com ela. Mas uma parte mais conservadora deve seguir para o Aécio. Poucas seriam as chances de os eleitores de esquerda ou mais conservadores votarem na Dilma."

Antonio C. Mazzeo
"Se o PSB mantiver a lógica, Marina é a candidata. Se for assim, o partido pode dar um salto, já que ela tem mais penetração nacional e pode ter um aporte maior nas intenções de voto. No entanto, Marina pode disputar votos com Aécio, e os indecisos podem olhar para outros candidatos mais à esquerda. A candidatura dela poderia, então, diminuir a chance de um segundo turno.

Mas se não é Marina a candidata, quem é?"

Luiz J. Werneck Vianna
"O Campos representava, ao menos no Nordeste, uma atração sobre o voto, porque, do jeito que as coisas estão indo, os votos em branco e nulos serão muito fortes. Sem ele, as coisas no Nordeste ficam mais complicadas.

Quem conseguia se comunicar bem com a Marina era o Campos. É uma ferida muito funda no PSB. Além do mais, ele era o presidente do partido. Não sei como eles vão se erguer desse baque. Vão procurar, mas não há soluções claras à vista.

Vai haver migração para dentro e para fora. Muitos virão para a Marina (se ela for a candidata) e outros sairão por causa dela."

Marcelo Simas 
"O PSB sabe que essa aliança com Marina tem certo grau de artificialismo, não é uma aliança histórica. Ela foi para o PSB por conta da dificuldade de fundar a Rede. Depois das eleições, imaginamos que iria fundar seu partido, já que tem proposta programática muito definida. (Nesse quadro) é difícil prever se o PSB vai anunciar a candidatura dela à Presidência. Mas, dentro do partido, eu não vejo um candidato para esta eleição".

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