quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Opositores mostram convergência em economia

Denise Neumann, César Felício e Raymundo Costa – Valor Econômico

SÃO PAULO e BRASÍLIA - Em suas mais recentes apresentações públicas, Armínio Fraga, coordenador do programa econômico do PSDB, e Eduardo Giannetti da Fonseca, conselheiro econômico da candidata do PSB, Marina Silva, mostraram muita convergência em termos de política econômica. Além do consenso quanto à necessidade de restabelecer o tripé econômico, ambos defenderam que é preciso uma política de ajuste no início do próximo governo - que passa pelo realinhamento das tarifas públicas. Esse ajuste, concordam, terá um custo em termos de crescimento e talvez de emprego, mas eles estão convencidos de que a resposta do país às medidas de ajuste será rápida e o Brasil poderá voltar a crescer mais cedo do que se imagina.

Ontem, Marina e o deputado Beto Albuquerque (RS) foram oficializados candidatos, em uma reunião na sede do PSB, em Brasília, marcada por disputas internas em torno da coordenação e da estratégia de campanha. O grupo de Marina ficou com a coordenação financeira.

Conselheiros de Aécio e Marina convergem em política econômica

Nas duas mais recentes apresentações públicas, Armínio Fraga, coordenador do programa econômico do candidato do PSDB à Presidência, Aécio Neves, e Eduardo Giannetti da Fonseca, conselheiro econômico da candidata do PSB, Marina Silva, mostraram muita convergência em termos de política econômica. Como esperado, ambos foram enfáticos na defesa da volta do tripé como fio condutor da política econômica no caso da vitória da oposição nas eleições presidenciais de outubro.

Além da convergência quanto à necessidade de restabelecer o tripé, Armínio e Giannetti defenderam que é preciso uma política de ajuste no início do novo governo que passe pelo realinhamento das tarifas. Esse ajuste, disseram, terá um custo em termos de crescimento e talvez de emprego, mas ele será menor para a sociedade e para a economia do que o custo de não fazê-lo. E mais: os dois estão convencidos de que a resposta às medidas de ajuste será rápida e o país poderá voltar a crescer mais cedo do que se imagina. Giannetti foi ainda mais incisivo e deu data para a volta do crescimento. "A capacidade de reação do país é muito forte e podemos terminar 2015 com a economia em aceleração", disse, ontem, em palestra na Câmara de Comércio Árabe Brasileira. Armínio falou na semana passada em Fórum da revista "Exame".

Armínio e Giannetti usaram o passado para justificar a avaliação de forte (e positiva) reação do Brasil às medidas de ajuste. Ambos lembraram a crise de 1998/99 - quando Armínio assumiu a presidência do Banco Central no início do segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso e, junto com a adoção do sistema de metas de inflação, elevou os juros - e o posterior crescimento de 2000 como um exemplo desses momentos em que o ajuste traz um custo inicial forte e a benesse da recuperação vem rapidamente.

Giannetti acrescentou outro momento como exemplo dessa capacidade: a reação da economia às primeiras medidas do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Em 2002 o câmbio chegou a R$ 4, uma aceleração provocada pela preocupação com um governo petista. "Nos dois momentos, em dois a três trimestres, voltamos a crescer", disse Giannetti. "Em 2000 crescemos a uma taxa de 4% ao ano por seis trimestres após os primeiros meses do ajuste", lembrou Armínio.

Além da necessidade de um ajuste forte no começo do novo governo, Armínio e Giannetti (que fez questão de deixar claro que, por enquanto, fala por ele e não pela candidatura do PSB, cujo programa econômico está sendo discutido) criticaram a política de contenção artificial da inflação, tanto pelo controle dos preços de combustíveis e da energia elétrica, como pelo controle do câmbio em função da política de intervenção do Banco Central, e o desajuste fiscal. Na questão fiscal ambos enfatizaram questões diferentes mas não divergentes.

Aproveitando que está próximo de uma candidatura que nunca foi governo, Giannetti situou a origem do desequilíbrio fiscal na Constituição de 1988 e foi enfático ao dizer que o gasto público cresceu em todos os governos desde então, o que inclui os dois mandatos de FHC como presidente e sua gestão como ministro da Fazenda no governo de Itamar Franco. "A carga tributária aumentou de 24% para 36% do PIB", disse Giannetti, ponderando que os gastos (e os tributos) subiram em todas as esferas de governo, embora tenha havido uma "sanha" maior no governo, o que aparece na importância adquirida pelas contribuições no montante da arrecadação, pois elas não precisam ser repartidas com Estados e municípios. Ele acrescentou que houve piora fiscal especialmente na gestão Dilma Rousseff que foi acompanhada de medidas de "contabilidade criativa", que minaram a credibilidade das contas públicas.

Armínio concentrou suas críticas nesse último ponto e avançou na avaliação de que o "conserto" fiscal vai demorar um pouco mais (dois anos, ele imagina) e que o país está pronto para discutir e adotar uma reforma tributária que passa pela simplificação dos impostos. Giannetti não entrou nesse ponto, o que não quer dizer que não concorde com ele.


Armínio e Giannetti também parecem partilhar da avaliação de que a atual meta de inflação é muito alta. Armínio foi explícito sobre esse ponto. Ele defendeu que em um primeiro momento é preciso perseguir a convergência para a meta de 4,5% (deixando a atual administração da política monetária que flerta com o teto da meta) e deixou claro que ele, pessoalmente, acha que o país deveria, depois, buscar uma meta menor.

Giannetti não falou em percentuais, mas criticou a gestão do BC que "disse" para o mercado que ficava confortável com a inflação no teto "e com essa barbeiragem perdeu a batalha das expectativas". A percepção de que ele considera possível uma meta menor aparece quando ele classifica o regime de brasileiro de metas de inflação como um dos mais "condescendentes". "A nossa meta é a mais alta", e a banda uma das mais amplas, "e ainda assim ela volta e meia é ultrapassada", ponderou Giannetti.

Há ainda outros pontos de convergência entre os dois economistas, como a forte crítica à postura do governo de colocar a culpa pelo baixo crescimento na crise externa, a avaliação de que o país já está em quadro recessivo, a necessidade de revisar os programas de benefícios fiscais que seguiram o modelo de "escolher campeões", a crítica ao forte intervencionismo do governo e a necessidade de recuperar o princípio de câmbio flutuante, para recompor o tripé.

Giannetti foi mais detalhista ao criticar o que ele chamou de "microgerenciamento" em troca das políticas anteriores, tanto do governo FHC como no de Lula, de políticas horizontais, sem escolhas prévias dos "vencedores". Ele citou dados para mostrar o absurdo que foi a política do Tesouro emitir títulos indexados à taxa Selic para emprestar a juros subsidiados para o BNDES repassar para empresas "escolhidas", criando uma "bolsa BNDES" cujo custo do subsídio foi superior ao do Bolsa Família, disse Giannetti, dando o crédito da conta ao economista Mansueto Almeida, que participa das discussões do programa de governo da candidatura do PSDB.

Quando Giannetti chamou essa política de "bolsa-BNDES", os empresários presentes se manifestaram e preferiram preservar a instituição. "Bolsa-elite", gritaram dois deles. Fraga também criticou as medidas, mas deixou claro que um dos grandes problemas é a falta de transparência e de avaliação sobre seu real benefício.

Giannetti mesmo deixou claro, antes de terminar sua palestra, que vê muita convergência na política econômica das duas principais candidaturas de oposição. "Mas estou falando de convergência nessa área específica", disse ele.

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