sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Nelson Motta: A arte do desencontro

- O Globo

Comecei no jornalismo em 1967, com 22 anos, sem diploma, como estagiário do "Jornal do Brasil", onde trabalhei por um ano como repórter de arte e cultura, até ser chamado por Samuel Wainer para assinar uma coluna diária sobre juventude na "Ultima Hora". Era muito poder para um jovem apaixonado por música, cinema e política, mas desde o início, por meu temperamento tolerante e contrariando o espírito jornalístico tradicional, decidi que nunca perderia um amigo para não perder uma notícia.

Deu certo, em quase 50 anos de jornalismo só fui ganhando amigos, e eles sempre me deram em primeira mão as melhores notícias& rsrs

Depois da redemocratização também decidi que jamais perderia um amigo por causa de política. Nem os que apoiaram Collor quando fiz campanha para Mário Covas. Acho que a vida é tecida por relações entre pessoas, indivíduos diferentes, e, como dizia Vinicius de Moraes, "é a arte do encontro - embora haja tanto desencontro pela vida".

As próximas semanas serão de sangue, suor e lágrimas entre os candidatos e seus partidos, num vale-tudo no rádio, televisão, jornais e internet, que pode ter consequências desastrosas para vencedores e vencidos, rachando o país. Com essa ameaça, é preciso ser muito burro para chegar a romper amizades por paixão política - a mais nefasta de todas as paixões, que faz heróis de ontem vilões de amanhã, e do "nós" de hoje o "eles" de ontem.

A menos que alguém esteja defendendo um candidato ou partido em causa própria, porque depende deles - quando qualquer discussão é inútil - todas as outras são possíveis, desde que não se atribua ao outro falhas de caráter, intenções malignas ou interesses escusos por defender seu candidato. Isso não é política, é estupidez.

Pode até parecer ingenuidade, mas é só o óbvio ululante: se o PT reconhecesse as conquistas econômicas dos governos FH, e o PSDB o resultado de programas sociais petistas, e seguissem adiante, já seria uma grande economia de tempo (e de lama ) para começar a discutir o que realmente interessa: como crescer e distribuir renda, com melhores serviços públicos e menos impostos.

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