sábado, 1 de novembro de 2014

Merval Pereira - Golpismos

- O Globo

Acho que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) agiu corretamente ao recusar o pedido de auditoria do sistema eleitoral feito pelo setor jurídico do PSDB, pois não há nenhum motivo realmente grave para que se duvide do resultado das urnas.

Mesmo afirmando que não contestavam a legitimidade da eleição da presidente Dilma, os tucanos fizeram um gesto político sem maiores conseqüências. Daí a chamar de golpismo vai uma diferença muito grande, que também se deve levar na conta de uma resposta política do PT. Chumbo trocado.

A diferença é que o PT passa a experimentar agora uma oposição atuando no mesmo diapasão que ele sempre usou, cometendo até mesmo exageros semelhantes aos que o PT já cometeu, embora sem o aval da direção nacional do partido.

O candidato derrotado Aécio Neves, presidente nacional do PSDB, foi o primeiro a reconhecer a vitória de Dilma, e teve a gentileza de lhe telefonar desejando sorte na difícil tarefa de unir o país, no que não foi seguido pela presidente reeleita, que não se lembrou de citá-lo em sua fala da vitória.

Mas há movimentos sendo marcados pelo país pedindo o impeachment de Dilma, o que mostra uma militância tucana disposta a não dar trégua ao futuro governo, repetindo o mesmo erro já cometido pelo PT. Até o momento não há motivo para um pedido de impeachment de Dilma, apenas a indicação, a ser comprovada, pelo doleiro Yousseff de sua participação e do ex-presidente Lula nos escândalos da Petrobras.

Quando escrevi, analisando as denúncias reveladas pela revista Veja e depois reafirmadas pelos jornais Folha de S. Paulo e Estado de S. Paulo, que, caso fossem comprovadas, elas gerariam uma crise institucional grave podendo ensejar o pedido de impeachment da presidente, o candidato derrotado ao governo do Rio Grande do Sul Tarso Genro citou minha coluna como exemplo do “golpismo” contra a presidente Dilma que ele detectava na campanha eleitoral.

Logo ele, que no dia 19 de janeiro de 1999 escreveu um artigo na Folha de S. Paulo cobrando a renúncia de Fernando Henrique Cardoso, que assumira há 19 dias o seu segundo mandato. Tarso, em nome do PT, exigiu a saída de FHC do poder e a convocação de uma Constituinte, falando em lucros exagerados dos bancos graças a “informações privilegiadas” que teriam sido vazadas pelo governo.

O PT lançou o grito de guerra “Fora, FHC”, patrocinando manifestações na Esplanada dos Ministérios. Mais tarde, já em 2001 Genro voltou a exigir a renúncia do presidente “se tivesse dignidade”, “em face da falta de legitimidade de um mandato construído por estelionato eleitoral”.

Na campanha presidencial de 2010, governador eleito do Rio Grande do Sul, Tarso Genro afirmava estar havendo "uma campanha de golpismo político só semelhante aos eventos que ocorreram em 1964 para preparar as ofensivas" contra o governo estabelecido. Como sempre culpava a imprensa pelo “golpismo” que denunciava.

Segundo ele, referindo-se ao candidato do PSDB José Serra, que se aproximava de Dilma nas pesquisas, a situação poderia "redundar em uma eleição ilegítima", na qual um candidato quer se eleger "com base na mentira, na inverdade, na calúnia e na difamação". Qualquer semelhança com a campanha de 2014 do PT é mera coincidência.

Como se vê, “golpismo” é uma palavra fácil na boca de líderes petistas, e serve para todas as ocasiões em que o partido está sendo confrontado. O ex-presidente Lula saiu-se com essa quando se falou em impeachment da presidente Dilma caso as denúncias do doleiro Yousseff sejam comprovadas: “Quem se elege, governa”.

Nem sempre, se depender do PT, como se viu nos exemplos anteriores. E não foi diferente em 1989, quando Fernando Collor, hoje aliado, derrotou-o nas urnas. O PT passou a comandar a oposição ao novo governo a partir do primeiro dia, e a campanha culminou no impeachment de Collor.

Naquela ocasião, por acaso, o PT estava do lado certo e se utilizou do que hoje chama de “mídia golpista” para divulgar seguidas informações contra o governo eleito nas urnas. Quem ganhou não governou muito tempo, destituído pelo Congresso num processo político comandado pelo PT. Que continuou na oposição no governo de união nacional de Itamar Franco.

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