terça-feira, 30 de dezembro de 2014

O tamanho do desastre fiscal - O Estado de S. Paulo / Editorial

As contas públicas registraram em novembro um recorde que simboliza a política fiscal do primeiro governo de Dilma Rousseff, e da qual não há motivos para se orgulhar. O Tesouro Nacional teve déficit primário de R$ 6,7 bilhões, o pior resultado para o mês de novembro, e, no acumulado dos 11 primeiros meses de 2014, de R$ 18,3 bilhões. O resultado do período janeiro-novembro é R$ 80,8 bilhões pior do que o período correspondente de 2013. Esse valor dá a dimensão financeira da deterioração da política de gestão do dinheiro público no ano em que a presidente Dilma Rousseff, como havia anunciado antecipadamente, poderia "fazer o diabo" para assegurar sua reeleição. Não há dúvidas de que, na área fiscal, fez.

Como consequência do péssimo desempenho financeiro do governo federal, as contas de todo o setor público consolidado - que incluem os resultados dos Estados, dos municípios e das estatais e são calculadas pelo Banco Central por metodologia diferente da utilizada pelo Tesouro - igualmente registraram o pior desempenho para novembro desde o início da série histórica, em dezembro de 2001.

No resultado consolidado, o setor público registrou em novembro déficit primário de R$ 8,1 bilhões, dos quais o governo central foi responsável por 83%. Nos 11 primeiros meses do ano, o setor público acumulou déficit primário de R$ 19,6 bilhões. Nesse caso, a deterioração entre 2013 e 2014 é de R$ 100,5 bilhões, pois nos primeiros 11 meses do terceiro ano da gestão de Dilma o setor público acumulou superávit primário de R$ 80,9 bilhões.

O governo Dilma conseguiu destroçar o conceito de superávit primário, transformando-o numa ficção contábil. Esse superávit dimensiona o esforço financeiro das autoridades para honrar os compromissos gerados pela dívida pública. Para dar credibilidade à política fiscal e transmitir aos agentes econômicos a confiança necessária para fazer planejamento de longo prazo, o governo federal vinha se comprometendo a alcançar determinado superávit.

Desde 2012, no entanto, as metas prometidas pelo governo federal antes do início de cada exercício não vêm sendo cumpridas. Em 2014, o desrespeito foi completo. A meta era de um superávit primário de R$ 99 bilhões, ou 1,9% do Produto Interno Bruto (PIB).

Já há algum tempo o governo Dilma tem utilizado brechas legais para não cumprir a meta - descontando das contas, entre outros gastos, parte dos investimentos no Programa de Aceleração de Crescimento (PAC). Valeu-se também, e com grande constância, de manobras contábeis que, embora não ilegais, distorceram os demonstrativos financeiros, como a antecipação de receitas não tributárias (dividendos de estatais, pagamento de concessões) e adiamento do registro de determinadas despesas.

Nem assim, porém, conseguiu melhorar suas demonstrações financeiras. Os resultados acumulados até novembro, tanto no relatório do Tesouro como nas contas do Banco Central, mostram que só com um superávit muito grande em dezembro o resultado primário de 2014 será positivo - ainda assim, muito inferior ao prometido. Não haverá nenhuma punição, pois o governo conseguiu aprovar no Congresso, depois de muita pressão, mudanças na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) que, na prática, extinguem a exigência de cumprimento de metas fiscais.

O conceito de resultado primário ganhou importância no Brasil porque, tradicionalmente, o setor público registra um déficit nominal elevado. O que o governo Dilma conseguiu, porém, foi tornar ainda pior um resultado já ruim. Nos 11 primeiros meses de 2014, o setor público acumulou um déficit nominal de R$ 283,8 bilhões (97% maior do que o do período janeiro-novembro de 2013) e, nos 12 meses até novembro, de R$% 297,4 bilhões, o que corresponde a 5,82% do PIB.

O governo até pode alegar que é resultado comparável ao previsto para os Estados Unidos, mas o déficit americano vem sendo reduzido de maneira sistemática há anos. Além disso, o déficit brasileiro é mais do dobro do previsto para os países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), de 2,5%.

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