segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

Maior ato público da França leva às ruas 3,7 milhões contra terrorismo

França reage a ataques com marcha histórica

• Protesto sem precedentes no país levou pelo menos 3,7 milhões às ruas da capital e de outras cidades francesas

• Quarenta chefes de Estado, incluindo o presidente francês François Hollande, puxaram a multidão

Diogo Bercito Graciliano Rocha – Folha de S. Paulo

PARIS - No primeiro domingo após o ataque ao semanário satírico "Charlie Hebdo", ao menos 3,7 milhões de pessoas foram às ruas de Paris e das principais cidades da França em uma manifestação sem precedentes na história do país em repúdio ao terrorismo.

De acordo com o Ministério do Interior francês, não há registro de ato de tal magnitude no país. Alguns analistas dizem que a última vez que houve tamanha comoção pública foi em 1944, quando Paris foi libertada dos nazistas.

Na capital, 40 líderes mundiais marcharam de braços dados à frente da multidão. Na primeira fila dos chefes de Estado, caminharam o presidente francês François Hollande, a chanceler alemã Angela Merkel, o primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, e o presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas.

"Paris hoje é a capital do mundo", disse Hollande no palácio do Eliseu, antes de seguir para o ato público.

Após lenta caminhada de 400 metros, Hollande saiu da aglomeração de chefes de Estado e caminhou até o centro da praça Léon Blum para cumprimentar os familiares dos 17 mortos nos ataques terroristas da semana passada.

O presidente deu longo abraço no médico e colaborador do "Charlie Hebdo" Patrick Pelloux, um dos primeiros a chegar à Redação após o massacre de 12 pessoas.

A cena foi observada por parentes de vítimas. Muitos choravam e se abraçavam.

O líder francês foi também, no fim do dia, à Grande Sinagoga de Paris, acompanhado pelo premiê israelense --que havia levado à capital francesa a mensagem de que Israel é um porto seguro para judeus. As vítimas do atentado ao mercado kosher serão sepultadas em Israel.

A segurança contou com mais de 5.000 policiais. Atiradores de elite foram posicionados nos telhados, policiais à paisana se infiltraram no meio da multidão e dez estações de metrô foram fechadas na cidade. Moradores de edifícios no boulevard Voltaire foram proibidos de sair às sacadas de seus apartamentos enquanto os líderes internacionais passavam por ali.

No domingo (11), metrôs e ônibus eram gratuitos em Paris. Na cidade, 1,5 milhão de pessoas foram às ruas.

Na praça da República, os manifestantes se espremiam balançando bandeiras da França, exibindo cartazes com capas do "Charlie Hebdo" ou lápis e canetas, simbolizando a liberdade de expressão. Muitas reproduções eram de desenhos da publicação considerados ofensivos ao islã e que foram citados como motivo ao ataque.

A Marselhesa era entoada espontaneamente, aos gritos, numa reapropriação em massa do hino do país, ultimamente executado em solenidades oficiais ou nos atos políticos da direita moderada e da Frente Nacional. Convidado, o partido de extrema direita não participou da marcha e só fez atos no interior.

Pela manhã, um manifestante escalou o monumento onde estão as estátuas que representam os lemas da Revolução Francesa e retirou uma mordaça que cobria a boca da Liberdade nesses últimos dias.

"Estamos aqui para reivindicar o direito de dizer o que bem entendermos e sermos impertinentes. Eles fizeram a República se levantar e dizer que o ódio é que deve ser proibido", disse a comediante Anne de Peufeilhoux.

O mote "Je Suis Charlie" ("Eu Sou Charlie", em francês) foi adaptado em "eu sou sírio", "eu sou judeu", "eu sou policial". O mais abrangente e mais no espírito da manifestação foi "eu sou francês". Variações em hebraico e em árabe eram frequentes.

Um grupo de poucas dezenas de curdos caminhava comparando o atentado a sua luta no norte da Síria contra o Estado Islâmico. "Ambos são a barbárie em nome da religião", diz à Folha Fidan Unlubayir, do Conselho Democrático Curdo na França.

Um homem carregando cartaz de "Charlie akbar" ("Charlie é maior", imitando a fórmula islâmica de "Deus é maior") causava controvérsia na praça da Nação. Um árabe lhe pediu que retirasse a mensagem. Outro, também árabe, lhe defendeu. Entre ânimos exaltados, a frase continuou na marcha.

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