sábado, 3 de janeiro de 2015

Merval Pereira - Mal na fita

- O Globo

O Brasil começa 2015 em situação descendente, em que pese a enganosa euforia da presidente Dilma em seu discurso de posse no segundo mandato. A despeito de sermos a sétima economia do mundo, tudo indica que perderemos esse posto para a Índia este ano, segundo a consultoria britânica Economist Intelligence Unit, ligada à revista "The Economist".

O baixo crescimento do PIB nos últimos 4 anos — média anual abaixo de 2% — fez com que a economia brasileira perdesse o sexto lugar para a Inglaterra em 2012, depois de tê-la ultrapassado. Este ano, com a previsão de crescimento de 6,5% da Índia contra menos de 1% do Brasil, devemos cair para o oitavo lugar, ainda na frente da Itália, que também será superada pela Índia.

A decadência econômica vem acompanhada da desimportância política internacional, reforçada pela política externa do governo Dilma, mais voltada para questões regionais e ideologicamente ligada aos parceiros do Mercosul, em detrimento das relações com Estados Unidos e Europa.

O Brasil continua entre os países que importam na política internacional, não apenas por estar entre as dez maiores economias, mas, especialmente, por fazer parte do Brics, conjunto de países com potencial para liderar o mundo multipolar nos próximos anos.

A tarefa do novo ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, ex-embaixador do Brasil em Washington, será interromper a crescente desimportância brasileira, constatada em recente pesquisa do Ash Center para Governança Democrática e Inovação, da Harvard Kennedy School, que perguntou a cidadãos de 30 países suas opiniões sobre dez influentes líderes nacionais que têm impacto global.

As notas médias mais altas de conhecimento são para o presidente Barack Obama, dos EUA (93,9%); para o presidente Vladimir Putin, da Rússia (79,3%); e para o presidente Xi Jinping, da China (59,12%). Os líderes nacionais menos conhecidos são o presidente da África do Sul, Jacob Zuma (27,8%), e Dilma (25,4%).

O diretor do Ash Center, Tony Saich, diz que dois pontos se destacam na pesquisa. O primeiro é que as respostas são influenciadas por questões geopolíticas, com disputas entre nações e líderes nacionais refletidas claramente nas atitudes dos cidadãos. Por exemplo, as tensões entre China e Japão resultam em avaliações pobres da China e seu líder por japoneses, e vice-versa.

Em segundo lugar, fica clara a correlação das respostas entre a natureza do sistema político e as opiniões dos cidadãos sobre seus líderes. De modo geral, diz Saich, em sistemas multipartidários ou bipartidários genuínos, como na Europa ou nos EUA, os cidadãos são mais críticos sobre as políticas e seus líderes do que em nações onde a política é menos polêmica.

Obama, devido ao papel dos EUA na política global, é o mais conhecido entre os pesquisados, sendo que recebeu a maior percentagem em 23 dos 30 países (90,4% no Brasil). Com exceção de 3 países — Tanzânia, Índia e Paquistão —, o nível de conhecimento de Obama passou dos 90%.

Para os outros líderes, o conhecimento é regional. A chanceler Angela Merkel, por exemplo, é bem conhecida na Europa e na Rússia, mas menos na África, na Australásia e na Ásia. O presidente Xi Jinping é bem conhecido na Ásia, mas apenas 48,8% dos russos pesquisados e 59,8% dos vietnamitas o conhecem. Apesar, frisa o professor Tony Saich, das tentativas de construir uma relação próxima entre China e Rússia, e das tensões entre a China e o Vietnã.

Em países em que a mídia é controlada pelos governos, não é surpresa, diz Saich, que seus cidadãos aleguem prestar mais atenção a seus líderes. Assim, 93,9% dos chineses responderam que prestam atenção no presidente Xi Jinping, e 92,5% dos cidadãos sul-africanos e russos, em Zuma e Putin, respectivamente. Nessa medida de democracia, apenas 74,4% dos americanos pesquisados responderam que prestam atenção em Obama, enquanto as percentagens para países da Europa Ocidental são menores ainda.

No Brasil, onde a mídia não é controlada pelo governo, mas o Executivo tem grande influência no dia a dia dos cidadãos, nada menos que 82,3% das pessoas se referiram a Dilma. Porém, ao se ver o grau de democracia dos países, os que têm maiores restrições à discussão política classificam seus líderes com maiores notas.

Numa escala de 1 a 10, o presidente da China recebeu 9, Putin, 8,7, e Obama, 6,2, enquanto Dilma recebeu 6,3. (Continua amanhã)

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