domingo, 15 de fevereiro de 2015

Isolado e em minoria, partido adota tática de oposição

• Petistas passam a obstruir sessões; mesmo assim, colecionam derrotas

Fernanda Krakovics e Isabel Braga – O Globo

BRASÍLIA - O PT vive uma situação paradoxal na Câmara. Apesar de ser a maior bancada, o partido ficou em minoria porque parte de seus aliados endossou as iniciativas do novo presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Assim, os petistas voltaram a atuar como nos tempos em que eram oposição. Além de atônitos, eles se mostraram destreinados para a tarefa. Nestas primeiras duas semanas, obstruíram votações, pediram respeito às minorias e levantaram a voz ao discursar na tribuna. Mesmo assim, sofreram uma série de derrotas.

Um dos momentos mais simbólicos da dificuldade do partido foi o discurso do deputado Alessandro Molon (PT-RJ), com argumentos típicos da oposição, durante obstrução do PT:

- Há que se respeitar a obstrução. Quem tem maioria coloca a maioria e vota, senhor presidente. Toda maioria é eventual. Quem se aproveita do fato de hoje ser maioria para esmagar a minoria amanhã será vítima dessa medida.

No governo Fernando Henrique (PSDB), deputados do PT como José Genoino (SP) dominavam o regimento da Câmara. Apesar da desvantagem numérica, faziam manobras para impedir ou postergar votações, dando trabalho para a maioria. Agora, com uma bancada forjada com o vento a favor, o cenário é bem diferente.

Estratégia é buscar movimentos sociais
Na sessão de 4 de fevereiro, o deputado Paulo Teixeira (PT-SP) não conseguiu apresentar uma questão de ordem em plenário porque, questionado pelo presidente da Câmara, não sabia citar o artigo do regimento interno para embasá-la. Depois de arriscar dois artigos, apelou:

- Traga-me o regimento, por favor, assessoria. Só um minuto, pedi questão de ordem baseada... - disse Teixeira, sem completar a frase.

Cunha perdeu a paciência:

- Deputado, quando Vossa Excelência estiver pronto para a questão de ordem, Vossa Excelência requisite a questão de ordem.

Ainda sem estratégia de ação, o PT joga nas mãos do governo a responsabilidade de recompor a relação com a base aliada na Câmara. Para Henrique Fontana (PT-RS), ex-líder do governo Dilma, o quadro adverso para o PT é passageiro:

- É muito cedo. Ficamos em minoria, mas o Parlamento vai passar por uns 30 dias de arrumação. Ele (Cunha) venceu (a votação sobre a reforma política), mas isso é como um campeonato bem longo, com umas 40 partidas, e ele ganhou a primeira - afirmou Fontana.

O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) disse que os ministros de siglas aliadas precisam enquadrar suas bancadas. O PCdoB, que tem o Ministério da Ciência e Tecnologia, atua com o PT na Câmara:

- Não dá para ter ministros que representam partidos e sejam nulos do ponto de vista político. Não pode ser Pôncio Pilatos, lavar as mãos - disse Silva, em referência ao comportamento de PP, PRB e PTB, que, mesmo com ministros no governo, apoiaram a eleição de Cunha.

O deputado Miro Teixeira (PROS-RJ), em seu 11º mandato, disse que nesta crise o PT lembra a forma como agia em sua origem:

- Acho que os petistas, da resistência democrática, que não se deixaram levar pelas tentações do poder e pela corrupção, estão encontrando espaço para reagir - disse ele.

Em desvantagem, o PT pretende recorrer à sociedade civil e movimentos sociais para tentar fazer valer algumas de suas posições no Congresso. No caso da reforma política, uniu-se à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e a outras entidades para recolher 1,5 milhão de assinaturas e apresentar um projeto de inciativa popular, como foi o caso da Ficha Limpa.

O deputado Afonso Florence (PT-BA) disse que a bancada precisa ter uma estratégia de ação:

- O PT não irá para a oposição, mas terá que disputar posições no mérito das leis. Agora, se o deputado Eduardo Cunha quiser ter interlocução como presidente da Casa, tem que desencarnar de ser líder (do PMDB).

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