sábado, 21 de março de 2015

Pacote do MP propõe até extinção de partido

MPF propõe punição a partidos

• Entre as medidas sugeridas por janot também está transformar a corrupção em crime hediondo

Jailton de Carvalho – O Globo

BRASÍLIA e SÃO PAULO - Dois dias depois de a presidente Dilma Rousseff lançar um pacote de medidas anticorrupção, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, anunciou ontem um conjunto maior e mais rigoroso de propostas contra o desvio sistemático de dinheiro público. Entre as propostas de Janot está um projeto que estabelece multa, suspensão e até o fechamento de partidos políticos envolvidos em casos de corrupção. Outro projeto aumenta a pena máxima para os crimes de corrupção ativa e passiva de 12 para 25 anos de prisão. A corrupção de valores altos passaria a ser classificada como crime hediondo, que obriga o cumprimento de uma parte maior da pena em regime fechado.

As propostas do MPF serão enviadas ao Congresso na próxima semana e, a partir daí, dependerão da iniciativa de parlamentares para serem transformadas em projetos de lei. Janot espera que deputados ou senadores interessados no combate à corrupção encampem as propostas. Ele não tem atribuição de propor projetos de lei. As propostas foram elaboradas por procuradores da força-tarefa da Operação Lava-Jato e da Câmara de Combate à Corrupção da Procuradoria Geral.

- A corrupção rouba a comida, o remédio e a escola do brasileiro. Quem rouba milhões mata milhões - disse o procurador Deltan Dallagnol, um dos responsáveis pelas propostas.

Testes de integridade e redução de prazos
O pacote prevê ainda instituição de testes de integridade para servidores públicos, extinção de recursos protelatórios e redução de prazos de processos criminais. Também tipifica como crime o enriquecimento incompatível com a renda declarada, facilita o confisco de bens obtidos com dinheiro desviado dos cofres públicos e amplia o prazo de prescrição de alguns crimes.

As propostas já vinham sendo elaboradas por procuradores bem antes das manifestações do último domingo, quando milhares de pessoas saíram às ruas para pedir rigor contra a corrupção. São medidas com potencial de impacto maior até que o pacote anticorrupção lançado quarta-feira por Dilma. Para os procuradores, as propostas do MPF completam projetos de Executivo e Congresso.

Uma das grandes diferenças entre as propostas do governo e o pacote do MPF é a responsabilização objetiva dos partidos políticos e não apenas de políticos ou dirigentes partidários envolvidos em desvios de dinheiro público. Pela proposta, partidos denunciados por corrupção poderão sofrer multas proporcionais aos valores desviados. Nos casos mais graves, poderão ser punidos com suspensão do funcionamento de diretórios por até quatro anos. Em casos de repetição dos crimes, os partidos poderão ser punidos com a perda do registro de funcionamento.

O procurador Nicolau Dino, coordenador da Câmara de Combate à Corrupção, argumenta que a punição de partidos é importante para garantir o equilíbrio nas disputas eleitorais. Muitas vezes, o afastamento de um político ou de um dirigente não tem qualquer reflexo nas campanhas eleitorais, o que estimula o caixa dois.

- É preciso coibir o caixa dois e garantir a igualdade de condições na disputa - disse Dino.

O pacote de Janot também prevê um tratamento ainda mais rigoroso contra a corrupção, que passaria a ser punida com até 25 anos de prisão. As penas seriam estabelecidas de acordo com o valor do suborno. Em casos de desvios acima de até cem salários mínimos (R$ 78 mil), a corrupção seria enquadrada como crime hediondo. Outro projeto fixa a duração de processos por corrupção em no máximo 5 anos. Hoje, processos deste tipo tem tramitação média de dez anos.

O pacote cria testes de integridade para servidores públicos que, segundo Dallagnol, são recomendados pela ONU e por outras entidades internacionais. Servidores seriam submetidos, sem saber, a testes em que poderiam ou não colaborar com práticas criminosas. O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse apoiar o pacote de Janot.

- Embora eu ainda não tenha analisado minuciosamente todas as medidas, vejo que elas marcham na mesma linha das propostas lançadas pela presidenta há dois dias - disse Cardozo.

Autor de livros sobre corrupção, o professor Leonardo Avritzer, da UFMG, considera o estabelecimento de prazo máximo para o julgamento de crimes de corrupção a melhor sugestão do pacote. O especialista não gosta da proposta de cassação de partido político envolvido com corrupção. Ele lembra que a legenda representa "uma parcela da sociedade e da opinião pública".

- Por isso, para se cassar o seu registro, seria necessário provar que essa parcela, como um todo, apoiou a corrupção, o que é o caso - diz Avritzer.

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