terça-feira, 7 de abril de 2015

Pedagogia e demagogia - Editorial / Folha de S. Paulo

Foi demagógica, além de imprudente, a enésima vinculação feita por Dilma Rousseff (PT) entre melhora do ensino público e recursos do pré-sal. O discurso da presidente na posse do novo ministro da Educação, Renato Janine Ribeiro, indica que ela não assimilou o principal nessa matéria.

Há imprudência, por certo, em contar com o maná combustível no momento em que a Petrobras se afunda num escândalo que prejudicará por vários anos sua capacidade de investimento. Há demagogia porque a carência de recursos já não é mais o principal problema no âmbito da educação.

Como mostrou esta Folha no sábado (4), o gasto público no setor alcançou 6,6% do PIB em 2013. É mais que a média dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, 5,6% (dado de 2011, o mais recente).

Quase todas as nações da OCDE são mais ricas que o Brasil e contam com proporção menor de jovens na população, o que multiplica o dispêndio anual por aluno. Nos EUA, ele era da ordem de US$ 12.600 (R$ 39.300) em 2013, mais que o sêxtuplo dos R$ 6.200 daqui.

A despesa brasileira por estudante já foi muito menor, contudo. Uma década antes, era de meros R$ 2.200 (em valores corrigidos para 2013); aumentou 180% desde então. O avanço é claro.

Menos evidente é o progresso educacional propiciado pelo crescimento das verbas. O Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) do ensino médio subiu de 3,4 (2005) para somente 3,7 (2013); nas primeiras séries do ensino fundamental, colheu-se resultado um pouco melhor (de 3,8 para 5,2).

Levantamento do Instituto Alfa e Beto citado no jornal "O Globo" indica que Estados que gastam mais nem sempre obtêm as melhores avaliações. O Distrito Federal despende 116% mais que São Paulo, mas a rede estadual paulista tem a melhor nota no Enem, enquanto o DF fica em terceiro lugar.

A Fundação Getulio Vargas, por seu lado, investigou a relação entre royalties do petróleo e ensino em 60 municípios de 15 Estados beneficiados desde os anos 1990. Comparando cidades semelhantes com e sem royalties, demonstrou que não houve diferença significativa na evolução de indicadores como anos de estudo.

Melhorar o ensino público no Brasil é um objetivo incontornável, mas há muitos obstáculos pela frente. Fixar-se no aumento dos gastos para chegar a 10% do PIB sem cuidar da eficiência no dispêndio é o mesmo que pensar apenas no combustível, sem ter ideia nem mapa de onde se quer chegar.

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