quarta-feira, 13 de maio de 2015

FH é homenageado em Nova York e critica governo

• Discurso foi feito na entrega do prêmio Pessoa do Ano, dividido com o ex-presidente americano Bill Clinton

Isabel de Luca – O Globo

NOVA YORK - Durante um jantar de gala para 1,2 mil pessoas no hotel Waldorf Astoria, em Nova York, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso recebeu o título de Pessoa do Ano, na noite desta terça-feira, com um discurso de forte teor político. Ao falar diante de empresários, banqueiros, diplomatas e da cúpula do PSDB no evento promovido pela Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos, FH citou as manifestações de 2013 e usou a crise econômica mundial de 2008 para atacar tanto o governo quanto o PT — sem, no entanto, citar nominalmente o partido. Sobre o que chamou de “práticas não republicanas”, o ex-presidente afirmou que “o castelo de cartas desfez-se ao sopro da realidade”.

– Talvez houvesse sido certo dizer que, para nós, a crise foi uma “marolinha”. Mas não. O governo interpretou o que era política de conjuntura como um sinal para fazer marcha à ré. Paulatinamente fomos voltando à expansão sem freios do setor estatal, ao descaso com as contas públicas, aos projetos megalômanos que já haviam caracterizado e inviabilizado o êxito de alguns governos do passado — afirmou FH. — Isso, sem me referir a práticas que a melhor eufemismo são ditas no Brasil como “não republicanas”, sobre as quais, no exterior, prefiro calar. O castelo de cartas desfez-se ao sopro da realidade.

Em sua fala, que começou em inglês – enquanto alguns presentes gritavam “Volta, presidente!” na plateia – e depois, quando focou no Brasil, passou para o português, Fernando Henrique considerou o “desvio das boas práticas” tão grave quanto “a pretensão de sustentar o poder a partir de políticas de hegemonia partidária pregada e posta em ação por grupos que se autodenominam como de vanguarda”. O ex-presidente disse que perdeu “em vários momentos a popularidade; nunca, contudo, a credibilidade”. E se declarou otimista:

– Por mais astuciosos que sejam os truques para mostrar que está certo o que está errado, eles têm vida curta.

Mais de 12 anos depois de deixar a presidência, FH foi eleito a Pessoa do Ano de 2015 junto com o ex-presidente dos Estados Unidos Bill Clinton. Desde 1970, o prêmio é concedido anualmente a dois líderes — um brasileiro e um americano — que tenham se destacado no fortalecimento dos elos entre Brasil e EUA. Clinton só chegou ao final do jantar, sem Hillary. Ao se juntar a FH e aos integrantes da câmara, que passaram o tempo todo no palco, adornado com bandeiras dos dois países, o americano foi aplaudido de pé enquanto se ouvia uma música do Fleetwood Mac.

Ao agradecer o prêmio, Clinton elogiou o ex-presidente brasileiro, considerado por ele “um dos quatro ou cinco maiores líderes” que já conheceu:

— Poder é difícil de obter e é difícil de exercer. O que define parceria é dividir sonhos, projetos. Fernando Henrique foi para mim esse parceiro.

Foram servidos “wrap” de salmão, cherne com camarões e aspargos e vinhos como o tinto francês premier cru Beaune. Os ingressos para a cerimônia custavam a partir de US$ 1 mil por pessoa.

A festa reuniu os principais caciques do PSDB – Aécio Neves, José Serra, Tasso Jereissati –, além dos governadores Geraldo Alckmin (PSDB-SP), Marcone Perillo (PSDB-GO) e Pedro Taques (PDT-MT). Também estavam presentes o ex-senador José Sarney (PMDB); os presidentes dos bancos Itaú, Roberto Setubal, BTG Pactual, André Esteves, e Credit Suisse no Brasil, José Olympio; o presidente do Conselho do Itaú, Pedro Moreira Salles; a embaixadora Ana Lucy Cabral Petersen, cônsul do Brasil em Nova York; o representante permanente do Brasil na ONU, Antonio Patriota; o empresário Nizan Guanaes, que fez um discurso em que se disse saudoso de FH; e o artista plástico Vik Muniz.

Na entrada, Aécio ressaltou que a homenagem é “um reconhecimento ao homem que permitiu ao Brasil olhar com maior maturidade para o mundo, o homem que permitiu que o Brasil fosse uma nação estável do ponto de vista dos investimentos e em condição de diminuir as suas ainda enormes diferenças sociais”.

– FH não é mais um homem do PSDB, é um homem do Brasil, um homem público na dimensão maior que essa expressão possa trazer – afirmou, admitindo que o reconhecimento da contribuição do ex-presidente para o Brasil tardou a acontecer. – Não tivesse havido o governo do Fernando Henrique, com a estabilidade da moeda, com a modernização da economia, com o início dos programas de transferência de renda, não teriam havido os governos que o sucederam com os resultados que tiveram. O próprio governo do presidente Lula. Nada melhor do que a história, a história e o tempo fazem justiça que os primeiros anos pós-FH não fizeram.

Também na chegada ao Waldorf Astoria, Alckmin frisou que “o real mudou o Brasil de patamar”, e não se furtou a comentar a crise política atual:

– O Brasil é maior que a crise, a crise é passageira, ela é conjuntural, ela é fruto de escolhas erradas. O país é forte, tem uma economia importante, um espírito empreendedor, então acho que essa é a primeira mensagem. A outra é destacar valores: tanto o FHC quanto o Bill Clinton representam valores, o apreço pela democracia, o compromisso com o desenvolvimento, o compromisso com valores do país.

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