quinta-feira, 21 de maio de 2015

Míriam Leitão - Volta um problema

- O Globo

O fim do ganho com a importação de gasolina cria mais um dilema para o governo. Se aumentar os preços do combustível, alimentará mais ainda a inflação, que está em 8,17% em 12 meses; se mantiver os preços sendo vendidos com defasagem pela Petrobras, vai piorar a situação da empresa. A única solução seria o petróleo cair de novo, e o dólar não subir, variáveis que o governo não controla.

Quando o preço do petróleo despencou, a Petrobras ganhou bastante dinheiro comprando mais barato do que revendia aqui dentro. Pelos cálculos de Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), de novembro do ano passado a março deste ano, a empresa ganhou US$ 7 bilhões com essa diferença de preço na gasolina e no diesel. Mas, depois disso, o barril voltou a subir. Ele havia chegado a US$ 50 e voltou a ficar entre US$ 63 e US$ 65. Felizmente, o dólar, que havia subido muito, cedeu um pouco. Mesmo assim, o CBIE calcula que a gasolina voltou a ter defasagem, em 4,5%. A Tendências calculou, no dia 7 de maio, que estaria em 5%, e Fábio Silveira, da Go Associados estima 3%. O diesel, no entanto, continua acima dos preços externos em 9%.

- Os números mostram que ainda há ganhos com o diesel, mas já há uma mudança com a gasolina. Ela lucrou até abril, mas em maio já começou a ter perdas, embora ainda pequenas - afirmou Fábio Silveira.

O grande erro foi ter deixado a defasagem minar a saúde financeira da Petrobras tanto tempo. Foram perdas de R$ 55 bilhões durante o primeiro governo Dilma, entre janeiro de 2011 e dezembro de 2014, pela conta feita por Adriano Pires, que segue o conceito do custo de oportunidade, ou seja, a diferença entre os preços praticados no mercado interno e as cotações internacionais. Isso, calculado em relação a tudo o que ela vende, seja produzido aqui, seja importado.

Essa diferença ficou enorme quando os preços dispararam no mercado internacional. Felizmente, o câmbio ficou mais baixo naquele período, reduzindo parte das perdas. Depois, o petróleo despencou lá fora e assim os preços passaram a remunerar a Petrobras, que exibiu isso, em parte, no balanço do primeiro trimestre deste ano.

- O dólar subiu muito e foi até R$ 3,20, o que reduziu um pouco o ganho. Depois, o câmbio caiu, mas o petróleo teve uma recuperação de preços lá fora. Agora, só resta torcer para que o petróleo não continue a subir nem o câmbio. Mas o governo já deveria começar a se preocupar com esta defasagem e aumentar o preço da gasolina - disse Pires.

Fábio Silveira explica que parte dos investidores está adiando suas apostas de alta nos juros americanos. Isso foi reforçado com a ata do Fed divulgada ontem. Com isso, há volta de investimentos para os mercados de petróleo, pressionando a cotação.

- O preocupante é a tendência. O preço do barril voltou a subir. Isso complica a situação da Petrobras, que vai precisa de uma alta na tabela para acompanhar a defasagem. Vamos ver se conseguirá um reajuste nos seus preços - explicou Silveira.

Elevação de preços numa hora dessas pode ser difícil. O país, em recessão, com o IPCA na casa dos 8% ao ano, e, depois do maior tarifaço de energia já dado na história, será complicado politicamente. Mas o fato é que, por fatores externos, a gasolina começa a se afastar novamente do realismo tarifário.

A Petrobras tem a caminhada dela a fazer para se recuperar da situação de politraumatizada pela corrupção, má gestão e interferência política. Deve anunciar em breve o seu plano de negócios em que informará como pretende reduzir a alavancagem. Venderá ativos e diminuirá investimentos, pela expectativa do mercado. O problema é que terá que vender ativos que façam caixa e algumas das participações da empresa estão com cotação muito baixa. Não poderá cortar muito os investimentos, do contrário, não crescerá a produção.

- O mercado está mais vendedor do que comprador. Por isso, na venda de ativos, a empresa terá que saber que movimentos fará. Além disso, espera-se uma queda de 25% no plano de investimento de 2015 a 2019, mas qualquer empresa muito alavancada tem que aumentar produção e receitas - disse Pires.

Neste momento, tudo o que não deveria acontecer é voltar a defasagem dos preços da gasolina, e é exatamente o que começa a ocorrer, para aumentar as agruras da nossa maior empresa e da conjuntura econômica.

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