sexta-feira, 19 de junho de 2015

Nardes: 'império da lei' tem que valer para todos os governantes

Cristiane Jungblut e Simone Iglesias – O Globo

• TCU entrega a Renan cópia da decisão sobre contas de Dilma de 2014

BRASÍLIA- O presidente do Tribunal de Contas da União, ministro Aroldo Cedraz, e o relator das contas do governo em 2014, ministro Augusto Nardes, entregaram ontem ao Senado uma cópia da decisão de anteontem em que o TCU cobrou explicações da presidente Dilma pelas irregularidades na contabilidade do governo do ano passado. No encontro com o presidente do Senado, Renan Calheiros ( PMDB- AL), Nardes defendeu que “o império da lei” tem que valer para todos os governantes.

— Espero que a inauguração do novo momento do TCU, que pela primeira vez estabelece não aprovar mais com ressalvas ( as contas), sirva como exemplo positivo de transparência e de fortalecimento das nossas instituições, e que o império da lei seja para o prefeito, para o governador e também no escalão maior, a presidente da República — disse Nardes.

O ministro do TCU também pediu a Renan a retomada das votações sobre as contas presidenciais, que costumam ficar paradas na Comissão Mista de Orçamento. Desde 2002, o Congresso não vota os pareceres do TCU sobre as contas.

— Senti excelente boa vontade do presidente Renan em conversa que já tivemos. Ele disse que priorizaria isso. É um avanço para a sociedade brasileira e também para os congressistas, porque a principal função do Congresso é fiscalizar as contas da República. E nós damos um parecer técnico. Já há declarações do presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), e também já senti do presidente Renan, que isso possa acontecer — disse Nardes.

Para ele, o Congresso precisa retomar as votações e, assim, ser “fortalecido”:

— Temos que mudar esse procedimento, porque hoje vivemos num mundo extremamente competitivo e onde às vezes não há a entrega de forma transparente dos produtos para a sociedade.

Ele também usou o termo “pedaladas” ao se referir aos problemas encontrados pelo TCU nas contas de 2014. Os 13 itens mais relevantes foram objeto de questionamento a Dilma. No total, o relatório apontou 31 indícios de irregularidades.

Renan elogia o Tribunal de Contas
Após o encontro, Renan Calheiros elogiou a decisão do TCU:

— A respeito da visita do TCU, quero mais uma vez dizer que considero consequente a decisão do tribunal, porque garante o contraditório e, sobretudo, abre espaço para que se esclareça tudo, absolutamente tudo.

Publicamente, para evitar um confronto com o TCU, o governo adotou a estratégia de dizer que se beneficia com o prazo de 30 dias para explicar as irregularidades nas contas de 2014. Internamente, no entanto, o discurso é bem diferente. A decisão do TCU desagradou ao Planalto, que esperava ter convencido os ministros a aprovar as contas de Dilma com ressalvas.

A avaliação do governo é a de que só a rejeição nas contas teria sido pior que o adiamento com o pedido de explicações. A rejeição ainda pode acontecer, lembrou um ministro do Palácio ao GLOBO, e pedir que Dilma se explique foi uma forma de politizar uma decisão técnica, o que é muito ruim para o governo. Em conversas reservadas, auxiliares do governo cobravam ontem um critério do TCU em suas decisões, já que há anos as “pedaladas fiscais” acontecem, e o tribunal nunca as considerou um problema.

— Esperava- se um grande puxão de orelhas, além de real compromisso do governo em não fazer isso novamente. No entanto, o TCU agiu como um pai que vê o filho fazendo coisa errada há anos e fecha os olhos, mas, de uma hora para a outra, decide dar punição exemplar — disse uma fonte do governo.

A politização das contas do governo vai além do pedido de explicações a Dilma. No Palácio, diz- se que Nardes deslocou o eixo do poder para si, num momento em que o governo está fragilizado, e outros dois atores — Cunha e Renan — atuam com protagonismo e independentes do Executivo no Congresso.

Nos últimos dias, o governo atuou fortemente no TCU para impedir a derrota. Uma blitz governista formada pelos ministros do TCU José Múcio, Benjamin Zymler e Walton Rodrigues foi montada para convencer os demais. O prazo de 30 dias foi estipulado, segundo um ministro do TCU, como estratégia jurídica, e não por um acerto político. Sem esse prazo, se houver a rejeição das contas, o governo irá ao Supremo pedir a suspensão do julgamento, alegando não ter tido direito de defesa.

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