quinta-feira, 18 de junho de 2015

Seguro-desemprego mais rigoroso

Geralda Doca - Colaboraram Cristiane Jungblut e Cássia Almeida – O Globo

• No 1 º pedido, só terá direito quem trabalhou por 12 meses. Medida faz parte do ajuste fiscal

BRASÍLIA e RIO- A presidente Dilma Rousseff sancionou ontem a lei que restringe o acesso ao seguro- desemprego e ao abono salarial ( PIS), uma das medidas do ajuste fiscal aprovadas no Congresso. Com as novas regras, que já estão em vigor, só terão direito ao benefício os demitidos que tiverem trabalhado pelo menos 12 meses com carteira assinada nos 18 meses anteriores. Quem solicitou o benefício entre 28 de fevereiro e 16 de junho, mas teve o pedido negado, deve ficar atento, pois ainda poderá receber o dinheiro. Isso porque, durante esse período, estava valendo a Medida Provisória 665, que impunha exigências ainda maiores para acesso ao seguro. Agora, o governo vai convocar esses trabalhadores para receber os valores que teriam direito se a nova lei estivesse valendo desde março.

Pela MP, era preciso ter 18 meses no emprego para o primeiro pedido do seguro e de 12 meses para o segundo. Como as regras que viraram lei são mais brandas, a exigência para o primeiro pedido é seis meses menor. Já o período exigido no emprego cai para nove meses, nos últimos 12 meses. Antes da MP, para requerer o benefício eram necessários apenas seis meses de carteira assinada nos últimos 36 meses anteriores, e não havia critérios vinculados ao número de solicitações do benefício. Agora, a partir da terceira solicitação, a carência de seis meses foi mantida.

Quem perdeu o direito e voltou a ter
Para evitar que os trabalhadores que perderam o emprego durante a vigência da medida provisória não sejam prejudicados, o Ministério do Trabalho vai editar uma regra de transição. Nesse caso, mesmo quem já conseguiu outra colocação terá direito a receber as parcelas do seguro relativas aos meses em que ficou desempregado. Ainda está sendo levantando o universo de trabalhadores que vão se enquadrar nessa regra de transição. O governo deve atuar em duas frentes: convocar quem já foi aos postos do Sine e teve o pedido negado e fazer uma campanha para alertar os trabalhadores que antes tinham perdido o direito e voltaram a ter.

O prazo para entrada no pedido do seguro varia entre sete e 120 dias, a partir da demissão. A intenção do ministério é que os sistemas estejam adaptados, a partir da próxima semana, para atender já pelas novas regras.

A economia projetada inicialmente pela equipe econômica com as mudanças nas regras do seguro- desemprego, de R$ 8,9 bilhões, caiu para R$ 6,4 bilhões com a lei sancionada ontem. O Ministério do Trabalho avalia que o número de beneficiados pelo seguro também vai cair. Em 2014 foram 8,5 milhões de trabalhadores que pediram o benefício. Com as novas regras, a expectativa é uma redução de 1,6 milhão de trabalhadores, ou seja, 19,08% do total. O número de parcelas do seguro- desemprego varia entre três e cinco, dependendo do período de permanência no emprego e o valor entre R$ 788,00 e R$ 1.385,91.

Para o economista Claudio Dedecca, da Unicamp, a restrição não ataca a principal causa do aumento dos gastos com o benefício, que já representa 0,9% do PIB, a alta rotatividade.

— A rotatividade no Brasil é elevadíssima. A medida não ataca isso. Os gastos vão diminuir agora, mas no próximo ano já começam a subir de novo. Em três anos, voltamos ao mesmo patamar de hoje. Há setores que movimentam toda a mão de obra em um ano. Isso é que precisa ser discutido, apesar de os problemas com o seguro já existirem desde 2008 e 2009, e o Ministério do Trabalho sabia disso. Foram empurrando com a barriga e não discutiram a causa estrutural dos gastos do seguro.

Na avaliação do Ministério da Fazenda, apesar das modificações no texto original da MP, as novas regras do seguro- desemprego ajudam no ajuste fiscal. A Fazenda também espera efeito positivo na produtividade dos trabalhadores ao inibir a rotatividade no mercado de trabalho.

O governo também está restr ingindo o acesso ao número de parcelas, que vão depender do tempo de serviço nos últimos 36 meses. De acordo com as novas regras, empregos considerados em pedidos anteriores do benefício não poderão ser computados em um próximo requerimento.

Para o especialista Rodolfo Torelly, do site ‘ Trabalho Hoje’, as regras são mais duras e vêm em um momento “inoportuno”, de alta no desemprego em decorrência da crise na economia.

— Ficou mais difícil para os trabalhadores — disse ele, acrescentando que o governo deveria atuar para corrigir as falhas do sistema, a fim de bloquear o pagamento do benefício a quem recusar o curso de qualificação ou uma vaga nos postos do Sine.

A nova legislação também altera as regras do abono salarial ( PIS), que paga um salário mínimo por ano para os trabalhadores que recebem até dois mínimos por mês. Na proposta original, o governo fixou pagamento em valor proporcional aos meses trabalhados e elevou o prazo de carência no emprego, de um mês para seis meses. No final, a exigência de carência foi derrubada, mas o valor proporcional ao tempo trabalhado prevaleceu. Assim, quem trabalhou um mês receberá um doze avos do salário mínimo.

As mudanças no abono valerão a partir de 2016. No entanto, ainda podem mudar, dependendo da interpretação do Judiciário. Pela Constituição, o abono é equivalente ao salário mínimo e, por isso, não poderia ser fracionado. Já há ações no Supremo Tribunal Federal ( STF) questionando o novo critério. A questão também foi colocada por parlamentares.

O senador Romero Jucá ( PMDB- RR) acredita que o pagamento proporcional do abono salarial terá que ser decidido pelo Supremo. Ele lembrou que há oito ações na Corte contestando aspectos das MPs 664 ( que trata das pensões por morte) e 665, cujo relator é o ministro Luiz Fux.

— Acho que haverá a judicialização disso. Está na Constituição que o benefício não pode ser inferior a um salário mínimo — disse Jucá.

O seguro- desemprego pago aos pescadores em períodos de defeso também é tratado na lei, mas sem grandes alterações em relação à norma que existia antes da MP. O governo queria fixar prazo de três anos de registro para o pescador requerer o auxílio, mas prevaleceu o período de um ano ou a comprovação de venda do pescado. O auxílio pago aos pescadores é foco de fraudes recorrentes, segundo o Ministério do Trabalho, mas houve forte pressão no Congresso para manter as regras do seguro.

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