domingo, 28 de junho de 2015

Vinicius Torres Freire - O caso de polícia da economia

- Folha de S. Paulo

• Prisões, medo e revolta de empresários, deserções políticas e a 'volta das ruas' turvam cenário

A nova fase da barafunda política e policial faz a discussão econômica parecer ingenuidade teórica. Como tratar de "consolidação fiscal" quando tanta gente se ocupa de escapar da cadeia, e o apoio político do governo se esboroa? "Cadeia" deveria ser mera metáfora para "problemas judiciais", mas não é bem mais o caso.

A encrenca econômica em si mesma nem ficou tão maior assim, apesar de inflação, juros e contas do governo piores. O tumulto pode, porém, provocar mais medo e paralisia na economia real e avariar a capacidade já escassa do governo de arranjar soluções mesmo para os problemas mais imediatos.

Mas o assunto mais grave é criar condições para, daqui a uns três anos, se entregar uma economia mais arrumada, pois não é possível fazer o ajuste mínimo necessário no curto prazo. Para tanto, seria preciso um programa amplo, um acordo, uma coalizão, e confiança para sustentá-lo.

Todas essas condições parecem se desmilinguir, embora a ruína ainda seja evitável.

Há fúrias nos partidos aliados e no empresariado. Dois terços do eleitorado detesta o governo. Para agosto, talvez o fundo do inverno econômico, a oposição de direita marcou manifestações contra o governo, mas muito mais gente pode ir atrás do trio elétrico ("fundo do inverno" no PIB: o massacre do salário vai longe em 2016).

A presidente terá de responder em julho à acusação do TCU de gestão ilegal do dinheiro público. A crise político-policial vai engrossar não apenas devido às acusações do empresário da UTC, que de resto fez ataques anagramáticos à cúpula do TCU, embaralhando mais o jogo. A Procuradoria-Geral da República vai apresentar mais denúncias contra políticos.

Parte do empresariado está possessa com o aumento de impostos e apavorada com o risco-cadeia. Causou impressão profunda o encarceramento da direção de Odebrecht e Andrade Gutierrez. Não se trata de mera reação corporativa ou só de medo fundado em culpas no cartório. Há paranoia.

Como dizia de modo pitoresco um alto executivo do setor de logística: "Você pode parar na delegacia porque conhece alguém que roubou, pode quebrar porque alguém com quem você faz negócio não recebeu do governo e deixou de te pagar. Nem precisa ter nada a ver com Brasília".

A direção do PT passou na semana passada à oposição oficial à política econômica de Dilma 2, depois de engolir o choro e evitar escândalo maior no Congresso do PT. Lula assoprou as mordidas que deu na presidente, mas as marcas ficaram evidentes. Fração minoritária do petismo, de senadores a prefeitos, vai mesmo debandar, ainda que a conversa de uma "frente de esquerda" pareça débil. Mas tudo isso é sintoma de reorganização política.

O PMDB mal se mexeu para negar o rumor de que pode desembarcar do governo. O risco de debandada aumenta com a aproximação de policiais e procuradores, à beira de pegar caciques. O Congresso, em especial a Câmara, é ora puro desvario.

"O inverno está chegando", como se diz de uma ameaça difusa e monstruosa em "Game of Thrones", a série de TV de caos político contínuo e degolas.

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