terça-feira, 21 de julho de 2015

Dirigentes de empreiteira são condenados a 15 anos

• Justiça pune três primeiros ex-empreiteiros na Lava-Jato; "ninguém é intocável", diz procurador

Cleide Carvalho, Germano Oliveira e Tiago Dantas

Escândalos em série

SÃO PAULO - O juiz federal Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal do Paraná, condenou ontem por corrupção ativa, lavagem de dinheiro e organização criminosa três executivos da construtora Camargo Corrêa envolvidos no esquema de corrupção na Petrobras investigado pela Operação Lava-Jato. Foi a primeira condenação de integrantes do primeiro escalão de empreiteiras pelo pagamento de propinas e formação de cartel para fraudar licitações e contratos da estatal. A Lava-Jato se tornou a maior ação de combate à corrupção no país, não apenas pela descoberta de desvios bilionários dos cofres da Petrobras, mas por investir ao mesmo tempo contra corruptos, corruptores e operadores do esquema. A sentença de ontem, referente à 7ª fase da Lava-Jato (novembro de 2014), foi a primeira a atingir empreiteiros. Aguardam no banco dos réus outros 21 dirigentes e executivos de cinco das maiores empreiteiras do país: OAS, Galvão Engenharia, Mendes Junior, Engevix e UTC.

Dalton Avancini, ex-presidente da Camargo Corrêa, e Eduardo Leite, ex-vice-presidente da empreiteira, foram condenados a 15 anos e 10 meses de reclusão, mas serão beneficiados com a redução da pena por terem colaborado com as investigações. O ex-presidente do Conselho de Administração da construtora João Ricardo Auler foi condenado a 9 anos e 6 meses de prisão por corrupção ativa e organização criminosa, e deverá voltar à prisão. Ele estava em liberdade com tornozeleira eletrônica. Como não fez acordo de colaboração, deverá cumprir a pena em regime fechado, além de pagar multa de R$ 627,1 mil. Os três têm direito a recorrer em instâncias superiores.

Ao GLOBO, Deltan Dallagnol, um dos procuradores da força-tarefa da Lava-Jato, definiu as condenações e a continuidade das investigações como marcos no combate a crimes de colarinho branco:

- A lição que fica é a de que não há ilícito que não possa ser apurado dentro dos limites legais e constitucionais, nem ninguém que seja intocável em nossa República.

Empreiteira terá de devolver R$ 50 milhões
Os executivos da Camargo Corrêa foram considerados culpados no processo que apurou fraude em licitações e contratos de obras nas refinarias Abreu e Lima (Rnest), em Pernambuco, e Getulio Vargas (Repar), no Paraná. O juiz Sérgio Moro estabeleceu que a construtora deve devolver à Petrobras R$ 50,035 milhões a título de ressarcimento. Foi o valor mínimo necessário considerado pelo magistrado apenas em função das propinas pagas à diretoria de Abastecimento da estatal. Ainda não foram computadas propinas à diretoria de Serviços, que, segundo as apurações, ficava com dois terços da propina.

O ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa e o doleiro Alberto Yousssef, intermediário das propinas, também foram considerados culpados nesse processo. Eles foram condenados a 12 e 8 anos, respectivamente. Sérgio Moro mencionou na sentença que políticos investigados no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF) se beneficiaram dos desvios nos contratos da Camargo Corrêa. Costa repassava parte da propina a políticos do PMDB e do PP, que o indicaram para o cargo.

Também foi condenado o policial federal Jayme Alves de Oliveira Filho, o Careca, que fazia a entrega das propinas a mando de Youssef. A pena dele é de 11 anos e 10 meses de prisão por lavagem de dinheiro e associação criminosa, e multa de R$ 284 mil. Ele também perde o cargo na Polícia Federal. Ainda nessa ação, foram absolvidos Márcio Bonilho, da Sanko Sider, fornecedora da Camargo Corrêa; Adarico Negromonte, irmão do ex-ministro Mario Negromonte acusado de fazer entrega de propinas; e Waldomiro de Oliveira, acusado de fornecer de notas frias para o esquema.

Moro sugeriu na sentença que a Camargo Corrêa busque regularizar sua situação com a Controladoria-Geral da União (CGU), o Conselho Administrativo de Defesa da Concorrência (Cade) e o Ministério Público Federal, além da Petrobras: "Considerando as provas do envolvimento da empresa na prática de crimes, incluindo a confissão de seu ex-presidente, recomendo à empresa que busque acertar sua situação junto aos órgãos competentes." Em outro trecho o juiz disse que "este juízo nunca se manifestou contra acordos de leniência, e talvez sejam eles a melhor solução para as empresas".

Em nota, a Camargo Corrêa frisou que os condenados são ex-dirigentes da construtora e que tem se colocado à disposição das autoridades desde que tomou conhecimento das investigações, além de ter "empreendido esforços para identificar e sanar irregularidades, reforçando sua governança corporativa e sistemas de controle."

Beneficiados pela delação, Avancini e Leite cumprirão de dois a seis anos de regime semiaberto, contados a partir de março de 2016. O uso da tornozeleira eletrônica poderá ser dispensado. Depois de março de 2018, se tiverem pena a cumprir, valerá o correspondente ao regime aberto. Em relação às indenizações acordadas, Avancini pagará R$ 2,5 milhões, e Leite, R$ 5,5 milhões. Os dois poderão ser alvo de novas condenações, em novas ações judiciais. Moro afirmou que as penas serão unificadas, caso sejam condenados.

Réu em todos os processos envolvendo a diretoria de Abastecimento, Costa será condenado a até 20 anos de prisão na soma de sentenças, mas cumprirá no máximo dois anos no regime semiaberto domiciliar. Youssef, que também é réu em várias ações, ficará só três anos na cadeia em regime fechado. O restante será cumprido em regime aberto por até 30 anos.

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