quarta-feira, 29 de julho de 2015

TCU já tem munição para devassa no setor elétrico

Daniel Rittner e Murillo Camarotto – Valor Econômico

BRASÍLIA - A investida da Operação Lava-Jato sobre o setor elétrico encontra farta munição no Tribunal de Contas da União (TCU). Em auditorias recentes, o órgão de controle identificou irregularidades em vários contratos firmados entre a Eletrobras e empreiteiras investigadas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público. Um dos casos suspeitos é a construção da usina termelétrica Mauá 3, em Manaus (AM), onde o tribunal de contas apontou problemas como indício de sobrepreço de até 311 vezes em serviços executados.

Contratada em 2012 pela Amazonas Energia, uma subsidiária da Eletrobras, a construtora Andrade Gutierrez é acusada pelo TCU de ter praticado "jogo de cronograma" na execução do projeto. Isso significa, segundo palavras usadas nas próprias auditorias, uma "alocação desproporcional de valores" nas etapas iniciais do contrato. Antes mesmo do começo efetivo das obras, enquanto havia apenas canteiros abertos, o tribunal identificou pagamentos de R$ 181 milhões à construtora. "Resta evidente que o cronograma financeiro se encontrava muito discrepante do cronograma físico", disse o TCU.

Logo no início dos trabalhos, um dos problemas levantados pela equipe de auditores estava na sondagem de reconhecimento do subsolo. Os preços de referência usados pela Secretaria de Infraestrutura do Amazonas para esse tipo de serviço indicavam custo unitário de R$ 70,45 por metro de furo realizado. Como foram feitos 26 furos, com profundidade de 25 metros cada, a conta deveria ter ficado em R$ 57 mil. Documentos citados pelo tribunal, no entanto, mostram que o valor previsto pela empreiteira para essa atividade foi de R$ 17,9 milhões - 311 vezes mais.

A obra está parada por insuficiência de orçamento. Em sua defesa no processo, a Andrade Gutierrez refutou a existência do "jogo de cronograma". De acordo com a empreiteira, as regras do edital de licitação não permitiam esse tipo de prática. Além disso, o valor do contrato era global (pela obra como um todo) e estabelecia a remuneração por marcos contratuais, não por serviços específicos. A empresa também rejeita a tese de que, depois de recebidos os valores iniciais, não teria mais interesse em concluir a obra da termelétrica - hipótese aventada pelo tribunal.

Com 570 megawatts (MW) de capacidade, Mauá 3 tinha data de entrada em operação prevista para 30 de abril de 2014. Os investimentos estimados no projeto ficavam perto de R$ 1 bilhão.

A Eletrobras informou ao TCU ter repassado R$ 413 milhões em recursos à Amazonas Energia para essas obras. Atualmente, a Andrade Gutierrez pede reequilíbrio econômico-financeiro do contrato para retomar os trabalhos.

O TCU vem apertando o cerco ao setor elétrico nos últimos meses. Em junho, os ministros aprovaram uma extensa auditoria nas obras da hidrelétrica de Belo Monte, maior obra em andamento no país. Além de ter a Eletrobras como sócia, a usina está sendo construída por sete empreiteiras investigadas na Lava-Jato. Segundo apurou oValor, técnicos do tribunal também acompanham com lupa o funcionamento de um suposto cartel no fornecimento de turbinas para Belo Monte e de aerogeradores para maiores parques eólicos do país.

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