quarta-feira, 5 de agosto de 2015

Executiva do PT evita se solidarizar com Dirceu

Por Raphael Di Cunto e Andrea Jubé – Valor Econômico

BRASÍLIA - Em postura diferente da adotada durante o mensalão, a Executiva nacional do PT evitou ontem sair em apoio ao ex-ministro José Dirceu (PT), preso na segunda-feira por suspeita de envolvimento em desvios na Petrobras, e preferiu defender em nota apenas que o princípio da presunção da inocência seja respeitado, sem fazer referência ao ex-dirigente, presidente da sigla entre 1995 e 2002.

No documento, o PT diz que prossegue a escalada de ataques ao partido e lista como o "fato mais grave" na atual ofensiva o "covarde atentado" contra o Instituto Lula. A referência à necessidade de que os acusados tenham o direito de se defender - menção mais próxima à prisão do ex-ministro - aparece apenas no 10º parágrafo dos 12 que tem o texto, depois até de uma "saudação" à iniciativa do governo de convocar conferências sobre políticas públicas.

A estratégia do PT é afastar do partido as novas acusações contra um de seus principais líderes e atribuir as denúncias a uma questão profissional e pessoal do ex-ministro. "O caminho da defesa dele é argumentar que os serviços de consultoria foram realmente prestados, que o dinheiro é legal. É diferente [do mensalão], não tem relação com o partido nem com o governo", afirmou o secretário de Comunicação do PT, José Américo.

Essa postura gerou debates na reunião da Executiva. Integrantes da corrente Articulação de Esquerda queriam que a nota fosse mais forte e pela manhã divulgaram texto em que cobravam a direção do partido a tomar providências. "A Operação Lava-Jato não é mais uma investigação judicial. É uma operação política, cujo alvo principal é o PT", acusou documento publicado no blog de um dos coordenadores do grupo, Valter Pomar.

Dirceu, que cumpria pena de prisão domiciliar por envolvimento no mensalão, foi preso novamente na segunda-feira na Operação Lava-Jato, acusado pela Polícia Federal e Ministério Público de participar do esquema de desvio de dinheiro na Petrobras com base em delações premiadas que dizem que ele recebia propina em pagamentos mensais. Os advogados de Dirceu negaram as acusações e dizem que o dinheiro é fruto de consultorias prestadas.

Para a corrente petista, o juiz Sergio Moro, responsável pelas decisões de primeira instância da Lava-Jato, agiu por motivações políticas ao mandar prender Dirceu, que já estava "submetido a severas restrições", dias antes do programa do partido na TV - que vai ao ar na quinta-feira - e dos protestos de rua convocados para pedir o impeachment da presidente Dilma Roussef.

"A decisão do juiz Moro, de mandar prender José Dirceu, está relacionada a motivações políticas", afirma o documento, que acusa a mídia deixa de não dar atenção a denúncias contra políticos do PSDB. "O objetivo principal [da prisão] é outro: trata-se de um passo a mais no sentido de tentar criminalizar o ex-presidente Lula", diz o texto.

Não houve votação, contudo, e a versão final da nota, posteriormente divulgada à imprensa, foi consensual. Venceu a tese de afastar da imagem do PT as novas acusações contra o ex-homem forte do governo Lula e que é saudado nos eventos do partido como "guerreiro do povo brasileiro". Um dos dirigentes petistas ouvidos peloValor avalia que uma minoria dos 14 presentes na reunião, que defendia Dirceu, não quis formalizar um texto para ser incluído na nota final porque percebeu que acabaria derrotada na votação.

Pesou na decisão, segundo outro petista, a pressão de filiados sobre o teor das novas denúncias. O dinheiro desviado seria para enriquecimento ilícito, diferentemente do que ocorreu no mensalão, em que Dirceu era acusado de montar esquema para permitir apoio ao PT no Congresso. Causou desconforto nos petistas saber que o ex-ministro ganhava milhões enquanto eles faziam "vaquinha" para pagar as multas do mensalão.

Em entrevista após a reunião da Executiva, o presidente do PT, Rui Falcão, frisou que a nova acusação é de "caráter pessoal". "Continuo a dizer a vocês todos que, assim como em outras ocasiões, o ônus da prova é de quem acusa. E é preciso que o companheiro José Dirceu possa fazer o contraditório às acusações feitas contra ele em caráter pessoal", disse.

Questionado se considerava o correligionário inocente, Falcão evitou responder diretamente. "Ele é inocente até provem o contrário. Ele e todos que são acusados antes que provem o contrário", afirmou o petista - que, quando perguntado sobre o motivo da mudança de postura em relação à defesa do ex-ministro adotada no mensalão, respondeu que tudo que o partido tinha a dizer sobre o novo caso estava na nota da Executiva.

O texto divulgado pela direção do partido defende investigar casos de corrupção na esfera pública e privada, mas diz que não é admissível violações ao Estado de Direito. "Se o princípio de presunção de inocência é violado, se o espetáculo jurídico-político-midiático se sobrepõe à necessária produção de provas para inculpar previamente réus e indiciados sem direito de defesa [...] não é a corrupção que está sendo extirpada. É um estado de exceção sendo gestado", diz a nota.

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