terça-feira, 1 de setembro de 2015

Ministros em descompasso

• Ao falarem sobre o Orçamento, Levy e Barbosa revelam suas diferenças: o primeiro diz que governo tem desafio de cortar gastos, o segundo afirma que reduções adicionais cabem ao Congresso

Simone Iglesias, Fernanda Krakovics e Martha Beck - O Globo

BRASÍLIA - Com o país em recessão, o ministro Joaquim Levy ( Fazenda) disse que o governo tem de ser firme ao cortar gastos, mas Nelson Barbosa ( Planejamento) alegou que agora cabe ao Congresso decidir sobre eventuais cortes. Aentrevista para divulgar a proposta orçamentária de 2016 foi o retrato da falta de sintonia na equipe econômica. Os ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e do Planejamento, Nelson Barbosa, já chegaram para o encontro com os jornalistas com cara de poucos amigos e demonstrando claro desconforto entre eles.

A falta de entendimento também ficou clara no discurso proferido por cada um. Para falar sobre a necessidade de cortar ainda mais os gastos públicos, tese que defendeu até o último minuto no debate sobre o Orçamento de 2016, Levy destacou que há riscos em ter um discurso ambíguo e que é preciso ter cuidado para não se promover um relaxamento fiscal.

— Eu acredito firmemente na necessidade da sustentabilidade fiscal e que se deva encontrar os meios para tanto. Eu acho que se houver ambiguidade em relação a isso fica mais difícil a gente garantir o crescimento. Se a gente não quer mero corte de despesas, tem que ser acompanhado com um programa sério de aumento de eficiência do gasto. É um trabalho bastante forte que tem que ser feito. É desafio do governo. Desafio da sociedade.

Já Barbosa fez questão de ressaltar várias vezes que corte de gastos mais significativo não está nas mãos apenas do governo, mas do Congresso:

— Sim, é possível diminuir gastos públicos. Nós estamos empenhados nisso. Nós estamos com gastos nominais inferiores aos de dois anos atrás. Se nós levarmos em conta a inflação, esse gasto de R$ 250 bilhões propostos para 2016, ele é inferior ao verificado em 2012. Isso dá uma dimensão do esforço de contenção de gastos discricionários que o governo está fazendo. Reduções adicionais dependem de mudanças de lei.

De fiador do 2 º mandato de Dilma, Levy se transformou num mal ainda necessário. Com a credibilidade arranhada no Congresso, no mercado e no governo, ele segue no comando porque pior agora seria substitui- lo. Integrantes do governo relataram ao GLOBO que, internamente, há decepção com o desempenho de Levy. Esperava- se que o ministro conseguisse “blindar” o governo da avaliação ruim das agências de risco e emplacar medidas austeras com mais habilidade.

Levy iria a São Paulo ontem. Pela manhã, durante a reunião da coordenação política, foi decidido que deveria ficar em Brasília. Mas a entrevista foi dada num local “neutro”, o Planalto, e não no Planejamento, como de costume.

— Levy e Barbosa juntos é a fotografia que interessa ao governo — disse um auxiliar presidencial.

Depois de sua terceira derrota, aliados afirmam que Levy precisa “reconhecer a realidade” e levar em conta as variáveis políticas, e não só as econômicas.

— Levy não está perdendo a queda de braço, ele está precisando é reconhecer a realidade. O Orçamento tem que ser verdadeiro, a situação é de aperto, senão ninguém se engaja na solução — disse o senador Romero Jucá ( PMDB- RR).

Além da previsão de déficit no Orçamento de 2016, Levy já havia sido derrotado na redução da meta fiscal e no tamanho dos cortes no Orçamento deste ano, que foram menores do que defendia. Levy preferia cortes mais profundos no Orçamento de 2016, em vez da previsão de déficit.

— Ele ia fazer o quê? Acabar o Bolsa Família? Não pagar aposentado? — questionou um aliado.

Integrantes do governo minimizam a insatisfação de Levy. Dizem que, na previsão de déficit no Orçamento, ele marca posição contrária para não ser responsabilizado em caso de perda do grau de investimento. Parlamentares reclamam que Levy é “mais realista do que o rei” e não compreende que o governo vive crise de governabilidade.

— Daqui a pouco, ele está que nem o ( Guido) Mantega ( ex- ministro da Fazenda), que falava e ninguém acreditava — disse um parlamentar.

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