quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Carga política – Editorial / Folha de S. Paulo

A greve arruaceira de motoristas de caminhão que bloqueou estradas em pelo menos uma dezena de Estados nesta semana oferece exemplo gritante de irresponsabilidade. Convocada à revelia dos sindicatos da categoria, parece veicular mais uma carga pesada de ressentimento político do que reivindicações classistas razoáveis.

Mal se conhece a pauta propriamente corporativa da paralisação.

Piquetes já haviam prejudicado a vida de milhares de pessoas em março e abril passados. Alguns pedidos tinham sido atendidos pelo governo federal, mas não o de uma tabela com valores mínimos de frete –item que volta à tona agora, de carona com uma não menos descabida exigência de redução do preço do diesel.

Paradoxalmente, representantes do movimento deixam claro que se recusam a negociar com o Planalto. Mais que frete e diesel, o que trombeteiam nas rodovias interditadas são palavras de ordem contra a presidente Dilma Rousseff (PT) e a favor do impeachment.

Tanto o direito de greve quanto o de livre manifestação contam com inequívoco amparo constitucional. Isso não autoriza ninguém, contudo, a tomar o público como refém, com vistas a obter repercussão para objetivos sectários, mais que corporativistas.

Não é a única categoria a valer-se do expediente autoritário, lamentavelmente. Outras classes de motoristas e até professores cultivam o mau hábito de promover manifestações com o intuito explícito de parar o trânsito e chamar a atenção.

Pouco importa a eles que dezenas de milhares de trabalhadores se atrasem para chegar ao emprego ou percam horas de descanso merecido. Menos ainda que seus bloqueios resultem em colapso do abastecimento à população, proporcionando prejuízos de monta.

Acusam-se o Comando Nacional do Transporte –uma entidade cuja existência parece reduzir-se às redes sociais– e seu líder, Ivar Luiz Schmidt, de compor uma linha auxiliar e barulhenta do aglomerado de movimentos pró-impeachment.

Em uma democracia, não se pode proibir ninguém de ter preferências políticas, por certo. Mas a questão não é de conteúdo na manifestação, e sim de forma: regras mínimas de convivência em sociedade foram desacatadas por um grupo minoritário.

Se não se mostrarem de todo incapazes de aprender, como já sugere a sucessão de iniciativas paralisantes, um dia talvez percebam que por essa via terminarão atolados no repúdio da população à sua causa. Na ânsia de fustigar o poder central, e no delírio de derrubar com buzinadas um governo constituído, arriscam-se a perder o rumo e chegar a lugar nenhum.

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