terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Governo lança ofensiva contra o impeachment

Por Bruno Peres, Lucas Marchesini, Fernando Taquari e Cristiane Agostine - Valor Econômico

BRASÍLIA e SÃO PAULO - O governo deu início a uma ofensiva contra o avanço do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff. A estratégia passa pela convocação extraordinária dos parlamentares em dezembro e janeiro, com o objetivo de acelerar a tramitação do processo; por uma trégua do PT e dos movimentos sociais à política econômica; e por uma aproximação com o vice-presidente, Michel Temer, principal beneficiário de um possível afastamento da presidente.

Ontem, Dilma defendeu publicamente a suspensão do recesso parlamentar para tratar de "questões pendentes". Legalmente, ela pode convocar deputados e senadores, mas informou que discutirá essa possibilidade com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Na opinião da presidente, que recebeu ontem o apoio de 30 juristas contrários ao impeachment, o país não pode ficar "em compasso de espera".

O apoio de juristas de renome faz parte da estratégia de caracterizar o impeachment como tentativa de golpe. "O direito está sendo manipulado para fins políticos", disse Marcelo Labanca. "Para configurar situação que leve ao impedimento é preciso que esteja de maneira irretorquível que a presidente tenha praticado atentado à Constituição e não apenas medida que seja inconstitucional, até porque isso faz parte do processo de governar", opinou André Ramos Tavares.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez apelo aos movimentos sociais e às centrais sindicais para que deem uma trégua à política econômica do governo. Para Lula, a unidade neste momento é crucial. Crítico da política conduzida pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, o presidente do PT, Rui Falcão, também defendeu um armistício, sinalizando porém que, superado o impeachment, "a reivindicação por mudanças pode se afirmar numa nova relação".

Ontem, Dilma convidou Michel Temer para uma conversa em Brasília. O vice cancelou participação que teria em evento no Palácio dos Bandeirantes, onde seria homenageado por empresários na presença do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB). Antes, ele expôs, na sede da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, o documento "Uma ponte para o futuro", com propostas econômicas que vão na direção contrária do que defendem o PT e a presidente Dilma.

Dilma irá negociar convocação do Congresso no recesso
A presidente Dilma Rousseff defendeu ontem a convocação extraordinária do Congresso durante o recesso do fim do ano. Apesar de ter prerrogativas constitucionais para fazer essa convocação pessoalmente, Dilma disse que irá procurar o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que preside o Congresso, para avaliar a possibilidade da iniciativa de convocação ser parlamentar.

Dilma propôs a convocação em janeiro e dezembro "para a análise de todas as questões pendentes", o que inclui não apenas o pedido de abertura de impeachment como o processo no Conselho de Ética para cassar o mandato do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

"Tem que discutir o que vai ser a agenda da convocação, e eu acredito que tem que ser tudo que está pendente", disse a presidente Dilma. "Eu acho que tem de sentar, fazer um acordo, ver o quê vai ser colocado nessa convocação", acrescentou. Na avaliação da presidente Dilma, o país não pode ficar "em compasso de espera". Interessa ao governo fazer uma tramitação rápida do pedido de impeachment para evitar a possibilidade de articulação dos movimentos de rua e da oposição.

As declarações da presidente foram dadas depois de reunião com cerca de 30 juristas que se posicionaram contrariamente ao pedido de impeachment de Dilma acolhido pelo presidente da Câmara. Ao lado dos ministros da Justiça, José Eduardo Cardozo, e da Advocacia-Geral da União (AGU), Luís Inácio Adams, os especialistas em direito endossaram o discurso governista de que não há base legal para a abertura de um processo de impeachment.

Os juristas afirmaram não haver "coloração partidária" no manifesto e criticaram o que foi definido como "capricho" do presidente da Câmara. Adams e Cardozo também dirigiram críticas à iniciativa de Cunha e defenderam as chamadas "pedaladas", justificadas para garantir a continuidade de programas sociais. "Pensar que, fora da Constituição, vai se conseguir pacificar o país e encontrar saídas para crises é um erro grosseiro", disse Cardozo.

"Quer-se, de forma artificiosa, criminalizar a conduta da presidente Dilma", afirmou Adams, que encerrou a manifestação em série dos juristas, que se revezaram ao microfone do Planalto.

A própria presidente também se encarregou de apontar fragilidades na fundamentação do pedido de impeachment movido contra ela. "As minhas contas, tanto as de 2014 quanto as de 2015, ainda não foram julgadas. Elas só serão julgadas quando o Congresso Nacional externar sobre elas seu julgamento", disse. "Isso é uma questão constitucional, portanto, é importante destacar este fato, na medida em que essa questão das contas parece ser um dos fundamentos do pedido do processo do impeachment ao meu mandato".

Dilma também relatou ter externado aos juristas o desejo de que a análise do pedido de impeachment ocorra o mais rapidamente possível, com respeito à legalidade e ao contraditório.

A ofensiva do governo ganhou o reforço dos juristas. "Estamos a discutir um capricho de uma autoridade da República que, por ter sido contrariada, resolveu colocar todas as instituições submetidas a seus caprichos", disse Luiz Moreira Gomes Júnior.

Marcelo Labanca afirmou que crime de responsabilidade tem que ter intenção clara de fraude. "O direito está sendo manipulado para fins políticos", afirmou. Outro argumento defendido é que repasses de bancos públicos para quitar programas sociais eram necessários para a manutenção de programas essenciais.

"Para configurar situação que leve ao impedimento é preciso que esteja de maneira irretorquível que a presidente tenha praticado atentado à Constituição, e não apenas medida que seja inconstitucional, até porque isso faz parte do processo de governar", disse André Ramos Tavares. Entre outros juristas, estavam presentes Heleno Torres, Gilberto Bercovici, Flavio Croce Caetano, Misabel Derzi, Walfrido Warde e Pedro Estevam Pinto Serrano.

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