quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Maria Cristina Fernandes: A improvável convergência

• Já se vão 11 anos desde que Fazenda era rudimentar

- Valor Econômico

O melhor da mensagem presidencial é aquilo que não está lá. Um áulico sugeriu e a presidente vetou a ideia de associar a aprovação da CPMF à força-tarefa contra o vírus zika. O segundo melhor momento da presidente de fala travada veio de um improviso. Ao ouvir a deputada Mara Gabrilli (PSDB-SP), que é portadora de deficiência e frequenta a Câmara em uma cadeira de rodas, gritar, durante o discurso, contra a política do governo para a microcefalia, a presidente interrompeu a leitura e convidou-a, sem o vocativo 'minha filha', a propor ideias para o combate à doença.

O veto e o improviso sugerem que a presidente Dilma Rousseff está disposta a dar início a sua gestão. Ao se opor à vinculação entre o combate ao Aedes aegypti e a CPMF, Dilma evitou um vexame no plenário da Câmara e na saúde nacional. A propaganda prevê que no primeiro sábado depois do Carnaval 60% do efetivo das Forças Armadas batam às portas de 3 milhões de casas em 365 municípios de maior incidência de microcefalia. Se, além de volume, a operação tiver resultados, pode mostrar que há governo. Associada a Estados e municípios, a ação contra o Aedes aegypti também pode vir a fornecer pauta positiva para que prefeitos e governadores sem caixa em ano eleitoral mostrem alguma iniciativa.

Eleições que pressionam por atitudes contra a calamidade da zika, são também um muro de arrimo contra o capítulo econômico da mensagem presidencial. Idade mínima para aposentadoria, regras iguais para homens e mulheres e unificação de regras para os setores público e privado, é dessas reformas que já varreram o mundo e da qual o Brasil não terá como escapar. Arrocho e Lava-Jato, no entanto, indispõem o eleitor contra perdas de direitos. As eleições - a deste ano e, principalmente, a de 2018 - correm o risco de potencializar essa indisposição.

Mobilizada contra a reforma, a consultoria sindical Diap conta com a mudança das regras eleitorais para isso. A proibição do financiamento empresarial levaria a campanhas com menos benesses e mais convencimento do eleitor. Para conseguir voto no gogó, candidato que votar pela reforma da Previdência sairia em desvantagem. Se o candidato se empenhar e a reforma for aprovada, a gratidão de antigos financiadores será de pouca serventia para enfrentar a hostilidade do eleitor.

A reforma da Previdência tem o apoio do combalido ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que apenas se opôs a que o Conselhão tenha se antecipado ao fórum da Previdência, com maior peso sindical, na discussão do tema. A proposta de reforma pode sair do fórum com concessões a sindicatos, como o fim da isenção de exportadores agrícolas para o custeio das aposentadorias, mas é no Congresso que o texto ameaça ser depenado.

Se a mudança da regra eleitoral tiver o impacto esperado pelo Diap, não apenas a Previdência mas outras propostas embutidas na mensagem presidencial ao Congresso, como o gatilho para o limite de despesas do governo, por exemplo, correm risco. É uma ideia que só prospera se houver desvinculação de gastos de educação e saúde, iniciativa que teria que alcançar quórum constitucional.

A carta de intenções do Planalto mostra a prevalência das teses do ministro da Fazenda. Com atenuantes para o caso de as receitas se frustrarem, Nelson Barbosa levou Dilma a convergir com a limitação de gastos, proposta que há 11 anos fez a então chefe da Casa Civil a classificar de 'rudimentar' a ideia surgida no gabinete do ex-ministro Antonio Palocci.

A afinação entre Dilma e Nelson Barbosa que, em janeiro, contribuiu para o Copom estancar a alta de juros é favorecida por uma conjuntura pródiga em indicadores que pressionam pela inflexão da curva, como o peso da inadimplência sobre o balanço dos bancos. A recessão esticou a corda a ponto de surgirem veios de convergência entre o mercado financeiro e o ministro da Fazenda que, à época de sua nomeação, pareciam improváveis.

Os presidentes do Bradesco e do Itaú não poderiam ter sido mais claros, nas duas últimas ocasiões em que se pronunciaram, sobre o apoio às medidas defendidas por Barbosa - para a Previdência e para os gastos do governo - e que acabariam endossadas pela mensagem presidencial ao Congresso. A convergência é completada com adoção, pelo governo, de propostas que reduzem o risco do crédito, como aquela que se vale do FGTS para o consignado.

Esta confluência foi produzida por uma recessão que bateu no teto e pelo fogo morto do impeachment. Foi costurada sob a temperatura amena do recesso parlamentar. Para produzir resultados, ainda depende de um Congresso que, na soma de eleições e Lava-Jato, estará ocupado com sua sobrevivência política.

Dirceu e Lula
Seis meses depois de voltar a ser preso, ex-ministro José Dirceu pediu vênia ao juiz Sergio Moro antes de expor um libelo em sua própria defesa. Reconheceu erro em ter se valido dos préstimos de dois operadores confessos de propina da Petrobras, para reformar sua casa e se deslocar de jatinho, mas atacou as delações - "são imprestáveis" - e pediu para responder em liberdade à segunda acusação de chefiar quadrilha. "Quero reiterar que não posso aceitar a criminalização do PT e a tentativa de envolver o presidente Lula". Moro o interrompeu. "Este não é o objeto desta ação".

Em busca de reforçar sua defesa, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu apoio de um ex-companheiro que, diante de um juiz, atribuiu a um irmão e a uma filha condutas que lhe haviam sido imputadas. Confrontado com um contrato de compra de uma casa em sua cidade natal, diz não se recordar da assinatura que reconhece ser sua - "assinei em confiança a meu irmão". Indagado sobre o repasse indevido de R$ 500 mil do lobista Milton Pascowitch para uma de suas filhas, disse: "Achei que ela tinha devolvido tudo, mas depois soube que não devolveu".

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