terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

Míriam Leitão: O Plano Barbosa

- O Globo

No Plano Barbosa, o aumento do déficit é imediato, e o limite para a despesa é uma possibilidade futura. A reforma da Previdência é só uma lista do que será discutido no Fórum e na qual não há a idade mínima. O sistema de limitar os gastos será anunciado depois, e a ameaça mais dura, a de não dar aumento real para o salário mínimo, é factoide, porque já não haverá aumento real do mínimo até 2019.

O ministro Nelson Barbosa quis dar ao seu plano um ar de reforma estrutural, mas é o mais escancarado projeto de aumentar o desequilíbrio fiscal do país. Na prática, o Ministério da Fazenda joga a toalha e empurra com a barriga.

O que ele chama de “reforma fiscal” é uma coleção de ideias preliminares de projetos ainda não formulados. Mas o que ele chama de “espaço fiscal” é o eufemismo para déficit, que vai se tornar realidade já, em 2016. Quem achou alto o rombo de 1% do PIB deve ler o “Valor Econômico” de ontem, em que o ministro mostra que há mais déficit por aí. Quando os jornalistas Ribamar Oliveira e Leandra Peres perguntaram se o impacto da renegociação da dívida dos estados e municípios está incluído nos R$ 84 bilhões de gastos excedentes às receitas que o governo anunciou na sexta- feira, ele respondeu: “seria preciso fazer o recálculo e adicionar isso aos R$ 84 bilhões”. E “isso" é um custo de R$ 36 bilhões.

Quanto à reforma fiscal, ela funcionará assim: será formulado um projeto de lei para incluir na Lei de Responsabilidade Fiscal um limite plurianual de gastos federais que fique abaixo dos atuais 19% do PIB. Quando estiver aprovado, o Plano Plurianual será alterado para incluir esse limite. A Lei de Diretrizes Orçamentárias estabelecerá, então, um valor nominal de teto de despesas, que será seguido no Orçamento dos anos vindouros.

E se o limite estiver sob ameaça de não ser cumprido será disparado um gatilho que imporá uma série de restrições em três estágios. Parece bom, mas vejamos as restrições. Elas começam impedindo ampliação das desonerações, aumento dos gastos de custeio, aumento de despesas discricionárias. No segundo estágio, tem, entre outras coisas, o “impedimento de aumento de subsídios”. Convenhamos, tudo isso tinha que estar cortado desde já, este é o terceiro ano de déficit primário. O último ponto do terceiro estágio — ou seja, a pior das ameaças —é a “suspensão do aumento real do salário mínimo”.

Mas o fato é que o salário mínimo já não terá aumento real até 2019 porque a fórmula estabelece que ele sobe de acordo com a inflação do ano anterior e o crescimento de dois anos antes. Como se sabe, o país teve recessão no ano passado, terá este ano e deve ficar em zero em 2017. Aplicando- se a fórmula, só há possibilidade de aumento real, ou seja, acima da inflação, em 2020, e se o país crescer em 2018. Resta apenas uma dúvida: o governo anunciou isso porque pensa que somos todos bobos?

Sobre a reforma da Previdência, o que houve até agora é o seguinte: foi criado o Fórum há tempos. Falou- se muito dele, mas ele só fez uma reunião, a da semana passada. E tudo o que aconteceu é que foram listados itens de discussão. Nestas conversas preliminares já houve um desfalque importante: sumiu a proposta do ministro Nelson Barbosa de que seja incluída a idade mínima de aposentadoria, como existe na maioria absoluta dos países. Ele já entrou perdendo a discussão.

O governo promete para até o final de abril uma proposta de reforma da Previdência, mas o ministro disse que ela só terá impacto fiscal positivo daqui a 10 anos. O problema é que o déficit está explosivo. Nos últimos dois anos deu um salto ornamental. Só o déficit do INSS foi de R$ 56,6 bilhões em 2014, pulou para R$ 85,8 bilhões no ano passado e a projeção deste ano é de R$ 120 bilhões. O ministro Nelson Barbosa disse que o gasto com a Previdência e com os benefícios de longo prazo ( Loas) consomem 44% do Orçamento. Os benefícios para servidores civis e militares consomem outros 10%. E ele ainda acha que temos 10 anos para resolver isso.

Barbosa promete que através do seu plano o país conseguirá “conter a pressão pelo aumento de carga (tributária)”. Como se diz hoje em dia: é brincadeira.

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