sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Planalto ganha uma batalha, mas não meios para governar – Editorial / Valor Econômico

A configuração das forças políticas mudou em pouco tempo, de forma objetivamente favorável ao governo, diminuindo a probabilidade do impeachment da presidente Dilma Rousseff. A eleição, com o empenho desesperado do Planalto, de Leonardo Picciani (PMDB-RJ) como líder do PMDB na Câmara, evita o mal maior - a vitória do candidato do presidente da Câmara, Eduardo Cunha -, e solidifica a defesa governista contra o impedimento no Congresso. De maneira geral, a presidente tem mais confiança agora de que poderá encerrar seu mandato, mas não a certeza de apoio seguro para a formação das necessárias maiorias no parlamento. E a caixa de surpresas da Lava-Jato continua aberta.

Na conjugação da crise política e econômica, a situação do PMDB é diferente daquela do fim de 2015, quando o vice-presidente Michel Temer (PMDB-SP), além de patrocinar um programa econômico alternativo, flertava como substituto a Dilma capaz de unir os partidos e os empresários a seu redor. No clima rarefeito de Brasília, o que nunca foi sólido se desmancha ainda com maior rapidez.

O imponderável da Lava-Jato e da Justiça determinou novo giro da roda da fortuna de alguns dos principais protagonistas no teatro do impeachment. Temer se convenceu que não conseguiria se desvencilhar de Dilma nos processos que correm no Tribunal eleitoral e no Tribunal de Contas da União e a perspectiva de ajudar a afundar o barco do governo sem poder sair dele ativou seu instinto de sobrevivência.

Seu aliado Eduardo Cunha exerceu o quanto pode - e tenta ainda - seu papel de algoz do governo, mas com a enxurrada de suspeitas que o persegue perde aos poucos poder e sustentação de seus pares. O embate com um de seus ex-pupilos, Leonardo Picciani, mostra que Cunha, ainda que tenha sido derrotado por pouco, está cada vez mais vulnerável.

Decisiva em vários sentidos foi a ação do STF ao estabelecer um rito para o impeachment que jogou no lixo a conspiração de Cunha na Câmara e lançou nos braços de outra ala do PMDB, menos belicosa, o poder legal de decidir o destino da presidente. Ao definir que o Senado pode admitir ou não o processo de impeachment, mesmo depois de aprovado pela Câmara, uma das decisões mais importantes da República ficou com o senador Renan Calheiros, também alvo da Lava-Jato, que com isso aumentou seu cacife no PMDB e tornou o Planalto ainda mais dependente de seus humores.

Assim, o Congresso do PMDB, que no passado poderia decidir o rompimento com o governo em março, não guarda mais a lembrança dessa intenção. Transformou-se em um palco em que Temer, o presidente do partido, luta para não ser destronado pela oposição do "PMDB do Senado".

Enquanto a movimentação para desembarque do governo do principal partido da base foi contida, o governo passou a assistir outro importante afastamento, o do próprio PT e de seu líder, Lula, agora formalmente investigado pela Lava-Jato. A saída de Joaquim Levy da Fazenda parecia ter completado o trabalho iniciado com a ascensão de Jaques Wagner à Casa Civil e de Renato Berzoini às Relações Institucionais, sedimentando o avanço de lulistas no coração político e econômico do governo Dilma.

Frequentador do Instituto Lula, o ministro Nelson Barbosa, considerado "aliado" do PT, parece não ter correspondido às expectativas, ainda que nada tenha feito para isso. O sistema de bandas fiscais que ele desenha pode agradar ao partido porque amortece o aperto fiscal - que Dilma crê ter chegado a seu limite. O PT, porém, ansiava por uma agenda que deixasse para trás o ajuste e surgiu em seu lugar outra, também indigesta, a das reformas - primeiro, da Previdência e depois a trabalhista (que já saiu de cogitação). Sem bandeiras "positivas" do governo que possa carregar, o PT resolveu ameaçar o Planalto e o país com um programa econômico paralelo.

Por isso, Dilma rompeu um tipo de imobilismo, a de virtual vítima do impeachment, mas não ganhou muita liberdade de movimento. Se o PT não aprovar a reforma previdenciária, a oposição também não o fará, avisou o PSDB, e as mudanças não ocorrerão. O resultado das votações de projetos de interesse do governo continua incerto e sujeito à instabilidade da base governista, ainda despedaçada e seguindo o rumo de seus diversificados interesses, enquanto que o governo ainda não encontrou um norte para a economia. Com a recessão se aprofundando, a solução para a crise permanece distante.

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