terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

Prisão de marqueteiro de Lula e Dilma alarma Planalto

• Santana recebeu US$ 7,5 milhões no exterior

• Para Moro, dinheiro está vinculado a campanhas do PT

• Acusado reage: país vive clima de perseguição

Publicitário das duas campanhas de Dilma Rousseff à Presidência e da de reeleição do ex-presidente Lula, João Santana e sua mulher, Mônica Moura, tiveram a prisão decretada ontem pela Operação Acarajé, 23 ª fase da Lava- Jato. Santana é suspeito de receber US$ 7,5 milhões ilegalmente no exterior, parte enviada pela Odebrecht. No Planalto, ministros próximos à presidente classificaram a situação como “grave e muito ruim” para o governo. O PSDB vai pedir ao TSE que anexe a investigação ao processo contra a campanha de 2014 de Dilma. Para o juiz Sérgio Moro, Santana e a mulher sabiam que os recursos recebidos no exterior, atribuídos por ele a serviços prestados ao PT, tinham origem espúria. O marqueteiro, que estava a trabalho na República Dominicana, disse que as acusações são infundadas e lamentou “clima de perseguição”.

A vez do marqueteiro

• Decretação da prisão de João Santana assusta Planalto; oposição quer incluir provas em ação no TSE

Simone Iglesias, Maria Lima, Isabel Braga Leticia Fernandes - O Globo

- BRASÍLIA- A decretação da prisão do marqueteiro João Santana deixou o Palácio do Planalto muito preocupado ontem. Santana é o alvo principal da 23 ª fase da Operação Lava- Jato, que apura pagamentos irregulares no exterior ao marqueteiro por empreiteiros que mantinham contratos com a Petrobras, como a Odebrecht. Ele só não foi preso ainda porque está na República Dominicana a trabalho, mas avisou que voltará ao Brasil para se entregar à Polícia Federal.

A situação foi descrita por ministros e assessores próximos da presidente Dilma Rousseff como “grave e muito ruim” para o governo. Além de marqueteiro das duas campanhas da presidente, Santana é uma das pouquíssimas pessoas em quem Dilma confia plenamente, e única que ela ouve antes de qualquer exposição pública relevante, como anúncio de medidas e pronunciamentos de TV. Por isso, a simbologia da possível prisão do marqueteiro e de sua mulher e sócia, Mônica Moura, é considerada péssima para o governo.

— Ele é a pessoa que mais cuida da imagem de Dilma. E essa prisão, com ou sem motivo, afeta diretamente essa imagem. É péssima — resumiu um assessor do Planalto próximo à petista.

Moro ressalta vinculação
Além da preocupação com a imagem de Dilma e do governo, a avaliação é de que a decretação da prisão, com direito a alerta vermelho da Interpol, poderá ser mais um combustível no pedido de impeachment de Dilma, que já parecia assunto superado para o Planalto, além de influenciar o julgamento das ações do PSDB contra a presidente que tramitam no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Os partidos de oposição anunciaram que hoje vão pedir ao TSE a inclusão do assunto na investigação contra Dilma.

O PSDB enviará uma petição à ministra Maria Thereza, relatora da ação de impugnação do mandato da chapa Dilma/ Michel Temer no TSE, para que as provas da Operação Acarajé, como a PF batizou a 23 ª fase da Lava- Jato, sejam anexadas ao processo. O PSDB vai pedir também que seja colhido o depoimento do operador Zwi Skornicki, suspeito de repassar a Santana US$ 4,5 milhões em contas no exterior entre 2012 e 2014, de recursos desviados da Petrobras.

Para o juiz Sérgio Moro, “é extremamente improvável que a destinação de recursos espúrios e provenientes da corrupção na Petrobras” a Santana e sua mulher, no exterior, esteja “desvinculada dos serviços que prestaram à aludida agremiação política”. Segundo o juiz, “por mais que tenha declarado ao Fisco” os valores, o casal “tinha conhecimento da origem espúria dos recursos” e ocultou valores no exterior “mediante expedientes notoriamente fraudulentos”.

Apesar do temor que se abateu sobre os governistas, em sua defesa o Planalto vai alegar que não há prova alguma de que exista vínculo do dinheiro dado pela Odebrecht a Santana no exterior com a campanha à reeleição de Dilma.

— Precisa ter vínculo e, até agora, não há vínculo das contas dele com a campanha dela — afirmou um ministro.

O presidente do PT, Rui Falcão, disse que as denúncias não afetam o PT e que a legenda “não tem marqueteiro”, apenas contrata pessoas para produzir seus programas partidários.

— Não diz nada com relação ao PT. Quem acusa tem que provar, continuo defendendo que as pessoas são inocentes até que se prove o contrário — disse Falcão. — O PT não tem marqueteiro, contrata as pessoas para fazerem programas.

Falcão comparou com a situação do PSDB, dizendo que as doações de campanha feitas à legenda foram legais e apresentadas à Justiça Eleitoral, e que as transações foram “muito semelhantes” às realizadas pelos tucanos.

Segundo relatos, apesar da nova crise, Dilma está “tranquila” porque pagou legalmente ao marqueteiro por seus serviços durante a campanha de 2014. Dos R$ 318 milhões gastos para reelegê- la, R$ 89 milhões foram pagos a Santana. O auxiliar diz que não houve pagamentos por meio de caixa dois.

A última participação de Santana aconteceu no pronunciamento de Dilma sobre o vírus zika, este mês. O pronunciamento foi gravado pela equipe de Santana. O texto teve o dedo do marqueteiro. Na abertura do ano Legislativo, Santana colaborou no discurso e no convencimento da presidente de que seria importante ir ao Congresso.

— Ficou muito claro que a campanha da presidente Dilma veio para dentro da Lava- Jato com a prisão de seu marqueteiro João Santana — disse o coordenador jurídico do PSDB, Carlos Sampaio, que decidiu pedir ao TSE a juntada das novas provas, em conjunto com o presidente do partido, Aécio Neves.

Aécio: "Mudança de patamar"
Aécio disse que a apresentação do conjunto de provas documentais na Operação Acarajé irá “mudar de patamar” o julgamento da ação no TSE.

— Houve muita picaretagem na campanha, mas para mim essa Operação Acarajé é o que de mais grave ocorreu até aqui em níveis de contaminação da presidente Dilma e sua campanha. A operação é a comprovação de que houve dinheiro desviado da Petrobras através do operador Zwi Skornicki — disse Aécio.

Segundo o tucano, durante a disputa eleitoral ele percebia “que tinha dinheiro demais” circulando na campanha da adversária, a começar pelos valores pagos a João Santana, cerca de R$ 90 milhões.

O líder do PT na Câmara, Afonso Florence ( BA), disse que agentes públicos estão agindo de forma parcial para tentar encontrar provas que incriminem Dilma e o ex- presidente Lula:

— Certamente instituições de Estado devem investigar, mas tem gente vestindo a camisa do PSDB quando passou em um concurso para agir em nome do Estado e está agindo em nome de interesses políticos específicos.

Segundo o advogado da campanha de Dilma, Flávio Caetano, foi pago ao marqueteiro dinheiro legal e contabilizado:

“Este valor, por si só, demonstra que o pagamento feito ao publicitário se deu de forma legal e absolutamente transparente”, escreveu Caetano, em nota. (Colaborou Catarina Alencastro)


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