quarta-feira, 30 de março de 2016

Os donos da festa – Editorial / Folha de S. Paulo

Com a ausência do vice-presidente Michel Temer, a reunião nacional do PMDB, realizada nesta terça-feira (29) em Brasília, formalizou em clima festivo, e em poucos minutos, a ruptura do partido com o Palácio do Planalto.

A decisão, inegavelmente insólita no histórico de fisiologia da legenda, representa sério baque para as esperanças governistas de barrar o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT).

Ainda que existam alguns pontos de dissenso dentro da agremiação –caso dos ministros Celso Pansera (Ciência e Tecnologia), Marcelo Castro (Saúde) e Kátia Abreu (Agricultura)–, eles parecem insuficientes para reequilibrar a balança no Congresso, cada vez mais favorável aos anseios oposicionistas.

Se Temer haverá de ser o principal beneficiário de eventual afastamento de Dilma, ele não foi o único dono dessa, passe o trocadilho, reunião a jato promovida pelo PMDB. A festa também pertencia ao presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, que há vários meses manifesta diuturna hostilidade contra o Planalto.

O paradoxo e a complexidade desta crise política se expressam nessa circunstância. O PMDB apenas cumpre, com a proverbial astúcia de seus membros, o roteiro imposto pela sobrevivência política.

Embora a sigla se associe ao repúdio da expressiva maioria da população, é incontornável a constatação de que, a começar de Cunha, a rebeldia da legenda não a isenta das mais sérias desconfianças.

Os peemedebistas que agora rompem a sociedade mantida durante toda a administração petista intentam uma proeza. Saem do governo como se dele não houvessem participado, fingindo trazer a solução para um problema que não ajudaram a criar. Nada mais falso.

Ademais, enquanto o processo de impeachment corre com celeridade, é natural que a mesma população que quer o afastamento de Dilma se pergunte como o presidente da Câmara se mantém no cargo.

Cunha tem sido o regente de toda a investida oposicionista. Não só articulou diretamente a nomeação do presidente e do relator da comissão especial do impeachment como também atenta para detalhes como a garantia de seu quorum.

Paralelamente, noticia-se que Eduardo Cunha, valendo-se de seu notório conhecimento regimental e de sua influência sobre dezenas de deputados, pavimenta caminhos para escapar ileso do processo que enfrenta no Conselho de Ética.

A cisão entre o mundo político e a opinião pública, concentrada no impeachment, também se manifesta no que tange a Cunha e ao PMDB. Dessa perspectiva, a cerimônia desta terça-feira em nada altera o quadro geral.

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