terça-feira, 19 de abril de 2016

Agora é preciso um programa que tire o Brasil da recessão – Editorial / Valor Econômico

Terminado o embate político que marcou a vida brasileira nos últimos meses, é preciso agora definir um programa econômico que possa dar esperança aos trabalhadores e aos empresários e permita tirar o Brasil da recessão em que está mergulhado. Talvez seja ingênuo acreditar em pacificação do país neste momento, mesmo porque grandes multidões foram às ruas defender seus pontos de vista e as disputas políticas, como ocorre nas eleições, ainda estão vivas.

O vice presidente Michel Temer, que assumirá o poder, e as lideranças políticas responsáveis precisam, no entanto, fazer um esforço coletivo para que se chegue a um consenso mínimo sobre o que fazer daqui para frente, pois o povo brasileiro não pode continuar sofrendo indefinidamente os efeitos da crise política. Milhares de trabalhadores estão sendo demitidos diariamente, centenas de empresas estão fechando suas portas e numerosos investimentos estão sendo adiados à espera de clareza sobre os rumos da economia. É hora de mudar esse cenário.

Uma das características principais da crise econômica brasileira é a dramática situação das finanças públicas, nas três esferas da federação. Este será o terceiro ano em que a União registrará déficit primário em suas contas e não há perspectiva de que essa realidade possa mudar tão cedo.

A primeira medida, portanto, é a divulgação para a sociedade de dados sobre esse desastroso quadro, com toda a transparência. A população precisa tomar conhecimento da realidade fiscal para que possa entender e aceitar eventuais medidas impopulares que o governo seja obrigado a adotar no futuro. É necessário que os dados mostrem quais os gastos que mais aumentam, as razões deles estarem em ritmo tão acelerado e quais serão as consequências se continuarem na mesma trajetória.

Junto com o diagnóstico da situação, o governo deve apresentar um programa de ajuste das contas crível, pois não adiantará nada trilhar um caminho voluntarista que resulte em frustrações e em desconfianças. Os agentes econômicos precisam acreditar na proposta do governo, pois, se isto acontecer, as expectativas se tornarão mais favoráveis. Há um aspecto desta questão que é fundamental. O programa de ajuste dependerá, no entanto, da credibilidade do ministro escolhido para executá-lo. As pessoas precisam acreditar que ele está comprometido com o alcance das metas estabelecidas, mesmo que elas sejam de longo prazo. O ministro terá que anunciar as medidas e as reformas que proporá para tornar possível o ajuste das contas.

Não se pode perder de vista que a parte mais dolorosa do ajuste da economia brasileira já foi realizada. A correção dos preços administrados e monitorados (combustíveis, transportes e energia elétrica) foi concluída e o estrago nos preços provocado pela desvalorização do real já aconteceu. Por força de uma cruel recessão, que produziu uma drástica redução da demanda interna, a inflação começa a arrefecer e não está descartada a possibilidade de que ela possa convergir para a meta de 4,5% já em 2017. Ao mesmo tempo, a desvalorização do real registrada nos últimos meses promoveu uma rápida redução do déficit em transações correntes. Essa trajetória benigna será reforçada com uma decisão do governo de recuperar a política econômica que deu certo na década passada, do tripé econômico, representado pela política de metas de inflação, do câmbio flutuante e do superávit primário.

Se o impedimento da presidente Dilma Rousseff for aprovado pelo Senado, Michel Temer terá problemas de sobra e tempo de menos para começar a consertar a situação econômica desastrosa. Tem a vantagem das expectativas reduzidas, pois ninguém espera que ela faça tudo o que precisa ser feito em dois anos. Por outro lado, a nomeação de uma equipe tecnicamente competente, especialmente nos ministérios mais importantes, é vital para ganhar confiança, mas isto não basta. É crucial que o governo como um todo dê mostras de convicção e determinação de perseguir políticas determinadas para enfrentar o déficit fiscal. Demonstrações de austeridade podem funcionar na mesma direção.

Sobre o PMDB pesa o legado histórico de pouco apreço pelo equilíbrio fiscal e fisiologismo, perfil claramente inadequado para as tarefas do presente. Essa talvez seja uma das mais difíceis e importantes mudanças que Temer terá de encarar, se quiser ser bem-sucedido.

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