domingo, 8 de maio de 2016

Mulher honrada - Merval Pereira

- O Globo

A honestidade da presidente Dilma é o argumento mais usado contra o impeachment, e tornou-se comum a imagem de uma mulher honesta sendo sacrificada por um bando de políticos corruptos, a começar por Eduardo Cunha. Essa tese equivocada é apenas aparentemente correta, pois o impeachment não é um instrumento para punir apenas quem roubou dinheiro público em benefício próprio, mas uma penalidade administrativa para o dirigente que descumpriu a lei brasileira, no caso de Dilma a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Considerar “pedaladas” e decretos emitidos sem aprovação do Congresso que causaram rombo nas contas públicas crimes desimportantes, a não merecerem a aplicação da pena máxima da cassação do mandato, apenas evidencia a desimportância que os petistas e seus aliados dão ao equilíbrio fiscal, como se fosse tecnicalidade dispensável, ou simples pretexto para tirar Dilma do poder, uma mulher “que não roubou nem mesmo um grampeador”.

Mas a fama de “mulher honrada” que Dilma continua ostentando, avalizada até pelo principal líder oposicionista do país, o ex-presidente Fernando Henrique, precisa ser analisada com mais profundidade.

Pelas relações pessoais de Dilma, e sua participação direta ou indireta em fatos controversos, nos quais tinha poder de mando, fica difícil manter a afirmação com tanta segurança. Além das “pedaladas” e a burla à LRF que a estão levando ao impeachment, há denúncias de diversas fontes na Lava-Jato de que seus principais assessores, como Giles Azevedo e Edinho Silva, achacavam empreiteiras para financiar as campanhas de 2010 e 2014 com dinheiro desviado da Petrobras.

Seu marqueteiro João Santana, preso, recebeu milhões de dólares em esquemas paralelos, segundo delação de sua mulher Monica Moura. Acusados na Lava-Jato de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) e o marido, Paulo Bernardo, ambos ex-ministros de Dilma, foram denunciados ontem ao Supremo pela Procuradoria-Geral da República, acusados de corrupção na Lava-Jato.

Dias antes, a Procuradoria-Geral da República denunciara ao Superior Tribunal de Justiça o governador petista de MG, Fernando Pimentel, pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, na Operação Acrônimo, que apura fatos sobre benefícios concedidos a empresas quando Pimentel era ministro no 1º governo Dilma.

Pimentel é ligado a Dilma desde os tempos em que participavam da luta armada contra a ditadura, na mesma organização. Outra amiga íntima de Dilma, Erenice Guerra, que a substituiu na Casa Civil quando se candidatou a presidente em 2010, teve de deixar o ministério para não atrapalhar a campanha de Dilma, acusada na ocasião de tráfico de influência com dois filhos.

Hoje, está novamente acusada de envolvimento na Zelotes, que apura venda de MPs para favorecer empresas, no caso a Caoa, representante da Hyunday. No dia da posse de Dilma, Erenice estava entre as primeiras da fila de cumprimentos, e nunca deixou de estar ligada à presidente.

O senador Delcídio do Amaral, líder do governo Dilma no Senado, em sua delação premiada, acusou a presidente de ter tramado a soltura dos donos das empreiteiras Odebrecht e Andrade Gutierrez, nomeando para isso o ministro Marcelo Navarro para o STJ.

Essa denúncia, mais a nomeação do ex-presidente Lula para a Casa Civil, estão sendo investigadas num processo sobre obstrução da Justiça de que Dilma foi acusada pelo procurador-geral. Delcídio disse também que Dilma, à época presidente do Conselho de Administração da Petrobras, estava a par da compra da refinaria de Pasadena, nos EUA, operação superfaturada que deu enormes prejuízos à estatal, mas essa denúncia não será apurada no momento porque o fato aconteceu antes de Dilma assumir a Presidência.

Por fim, “O Estado de S. Paulo” informa que o ex-senador Gim Argello, preso, de estreita relação com Dilma a ponto de passearem juntos com cachorros pelas cercanias do Alvorada, tentou convencer o químico Gilberto Chierice a montar sociedade para fabricar a chamada “pílula do câncer”. Apesar do protesto da comunidade científica, pois a pílula não é aprovada cientificamente, Dilma sancionou sem vetos a produção.

A frase atribuída ao imperador romano Julio Cesar vem a calhar: “À mulher de Cesar não basta ser honesta, tem que parecer honesta”.

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