terça-feira, 24 de maio de 2016

Saída de Jucá estabelece norma positiva no governo – Editorial / O Globo

• Temer sinaliza comprometimento com a Lava-Jato e o combate à corrupção em geral, mas fica a lição do risco dessas nomeações

Nas duas frentes em que o presidente interino, Michel Temer, precisa atuar na crise, a política e a econômica, nesta, apesar das enormes e conhecidas dificuldades, ele parece contar com melhores condições para enfrentar a situação do que no jogo político, sua especialidade.

Para começar, ele tem conseguido montar uma equipe competente, sob o comando do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e cujo diagnóstico é indiscutível — gastos descontrolados, prevenção contra o setor privado, descuido com a inflação etc.

Mas é certo que, por melhor que seja a equipe, se o governo não conseguir o necessário apoio no Congresso para aprovar medidas essenciais à superação da crise — inclusive, emendas constitucionais —, o Brasil será mantido na pasmaceira. Na melhor hipótese, passará uma longa estagnação.


É explícita a preocupação de Temer com esta questão, ao escolher nomes para postos de primeiro escalão que facilitem o trânsito das medidas de ajuste no Congresso. Ficou, inclusive, identificada a influência desabonadora do deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) em certas escolhas.

A de André Moura (PSC-SE) para líder do governo na Câmara, por exemplo, traz digitais de Cunha. Não bastasse ser o deputado dono de preocupante folha corrida: além de casos de corrupção, há até ameaça de homicídio.

Michel Temer também se descuidou em nomear alvos de investigação. O caso mais evidente e temerário foi o do senador Romero Jucá (PMDB-RR), ungido ministro do Planejamento. Jucá é investigado pela Operação Lava-Jato, e não será surpresa se vier a ser denunciado.

O ministro não resistiu à publicação, ontem, pela “Folha de S.Paulo”, de diálogos entre ele e o ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado, gravados por este, em que tramam contra a Lava-Jato. Na qual os dois estão enredados.

Romero Jucá ainda tentou, em entrevista coletiva, sair-se com a clássica explicação de que foram pinçadas frases fora do contexto. Mas teve de pedir licença do cargo, do qual foi exonerado.

Não era mesmo possível mantê-lo, pois significaria dar força à tese lulopetista de que o impeachment de Dilma seria uma conspiração para substituí-la por Temer, a fim de que se pudesse conter a Lava-Jato. Algo delirante, porque precisaria que o Judiciário e o Ministério Público não fossem independentes. E a imprensa profissional não continuasse a fazer o seu trabalho.

A saída de Jucá do ministério — sob pretexto da espera de uma manifestação do MP sobre a gravação — é um sinal importante do presidente Temer do seu comprometimento com a LavaJato, conforme dissera ao tomar posse, e todo combate à corrupção. Passa a ser um referencial para a avaliação de casos semelhantes na equipe do governo.

O melhor teria sido não nomear Jucá, já com inquéritos em andamento no Supremo, e que acaba de ter os sigilos quebrados na Corte, acusado de apresentar emendas para beneficiar de forma ilegal um município de seu estado. Fica a lição: o ideal é vetar investigados no governo.

Compreende-se a necessidade de base parlamentar para se vencer a crise. Mas nada justifica leniência com a corrupção. Será repetir os governos do PT.

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