domingo, 5 de junho de 2016

Turbulência, raios e trovões - Eliane Cantanhêde

- O Estado de S. Paulo

A Aeronáutica vive o milagre da multiplicação de jatos e jatinhos e tornou-se um exemplo da barafunda e mais um ótimo motivo para o Senado resolver logo o impeachment. Se é para Dilma Rousseff voltar, que volte logo. Se é para Michel Temer assumir de fato e de direito, que seja logo também. O que não pode é esticar essa indefinição, essa insegurança, essa bola dividida.

A presidente afastada não pode sair voando em avião militar para fazer comício sobre um golpe que não há, mas tem direito a avião para sua casa em Porto Alegre. O interino pode ir a São Paulo e para onde bem entender, já que está “em exercício” e cumpre agenda oficial. Além dos dois, a FAB carrega dois fardos da Câmara, o presidente interino Waldir Maranhão e o afastado Eduardo Cunha. Só para a São Luís de, e do, Maranhão, são 2 horas e meia na ida e na volta todo fim de semana.


Sem falar que o advogado-geral da União, Fábio Osório, exigiu um avião para ir a um evento em Curitiba e, como não tinha, ligou às 15h diretamente para o comandante da Aeronáutica, brigadeiro Nivaldo Rossato, dizendo que precisava decolar às 16h. Não havia Legacy disponível no GTE (Grupo de Transporte Especial, que serve a autoridades) e Rossato teve de recorrer a um Learjet do 6.º ETA (Esquadrão de Transporte Aéreo), que tem menos status, mas era mais do que suficiente.

Parecem detalhes, mas mostram o quanto o País está de pernas para o ar, enquanto as turmas de Dilma e de Temer berram na Comissão do impeachment em torno de prazos e da inclusão ou não de novas provas e gravações no processo. O fator tempo é fundamental, o outro dá um bom (e irônico) debate.

Os neogovernistas querem antecipar o desfecho em 20 dias: em vez de 15 dias para defesa e acusação, bastariam cinco para cada, como prevê o Código do Processo Penal. Mas o PT, o PC do B e o PDT não têm pressa nenhuma. O porquê de cada lado: os aliados de Temer dizem que é melhor para o Brasil ter um só presidente no início da Olimpíada e que a incerteza sobre quem manda empaca as medidas econômicas e a recuperação de confiança no País. Já os aliados de Dilma sabem que, se a votação for já, ela perde. Logo, preferem ganhar tempo e torcer para que a Lava Jato corroa a cúpula do PMDB e, por tabela, as condições de Temer.

Detalhe: é melhor para o atual Planalto que o presidente do Senado durante a fase final do impeachment seja Renan Calheiros, mesmo que Ricardo Lewandowski presida as sessões. Se, por essas vicissitudes da vida, Renan vier a seguir os passos de Eduardo Cunha, virar réu e ser afastado, quem assume é o vice, Jorge Viana. Renan vive às turras com Temer, mas é do PMDB. Viana não é dilmista, mas é do PT.

Quanto à insistência da defesa de Dilma de incluir no processo a gravação em que Romero Jucá diz ao delator Sérgio Machado que é melhor trocar o governo, fazer um acordão e “estancar a sangria” da Lava Jato: pode ser um tiro no pé. Se puder incluir essa, poderá incluir também outras gravações e provas, como o áudio de Dilma articulando a posse de Lula na Casa Civil para fugir do juiz Sérgio Moro, a delação do ex-líder do governo Delcídio Amaral dizendo que Dilma manobrou para livrar empreiteiros da Lava Jato, a da Odebrecht falando que Dilma exigia caixa 2 e os e-mails citando contas pessoais dela. E as delações dizendo que ela sabia de todas as tratativas do desastre bilionário de Pasadena?

O fato é que o País está paralisado e o primeiro passo é o Senado julgar definitivamente se fica Temer ou volta Dilma. Não apenas porque a FAB é uma só e o combustível de aviação anda pela hora da morte, mas porque é preciso ter direção e segurança. Um mínimo de previsibilidade é fundamental em meio a tanta turbulência, nuvens carregadas e uma Lava Jato jorrando raios e trovões apavorantes.

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