terça-feira, 16 de agosto de 2016

CPI do Carf termina sem chegar a uma conclusão – Editorial / Valor Econômico

Terminou melancolicamente na semana passada, sem conclusões nem relatório, a CPI do Carf, que investigava na Câmara denúncias de favorecimento a empresas em julgamentos no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), órgão relacionado à Receita Federal e subordinado ao Ministério da Fazenda que é a última instância para recursos contra cobranças tributárias. A CPI surgiu na esteira da Operações Zelotes, deflagrada pela Polícia Federal para apurar esquema de venda de sentenças para empresas que estariam fugindo da tributação e que provocou o prejuízo estimado em R$ 20 bilhões aos cofres públicos. As empresas pagavam propina a conselheiros e ex-conselheiros do Carf para reverter multas milionárias.

A Zelotes teve seu foco ampliado para investigar também a venda de medidas provisórias (MPs) de interesse de empresas, tema que a comissão também tentou abarcar.


O resultado infrutífero da CPI não chegou a surpreender quem acompanhou seus cerca de seis meses de vida, pontuados por acusações de achaques a empresários para evitar que fossem convocados e acusações de blindagem de suspeitos. Parlamentar participante da comissão dá uma justificativa óbvia para o fato de as investigações não terem avançado: as empresas acusadas de participar do esquema teriam doado R$ 12,7 milhões para as campanhas dos integrantes da CPI em 2014. Mas não é caso único. A CPI da Petrobras teve final semelhante e foi alvo de suspeitas de achaques e ameaças feitas por representantes do grupo do ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), assim como a CPI do DPVAT.

A CPI do Carf também nasceu sob as bênçãos de Cunha, em fevereiro, e tem entre os seus membros deputados que eram considerados seus aliados, o relator João Carlos Bacelar (PR-BA) e Altineu Côrtes (PMDB-RJ). Nos primeiros meses, aprovou várias convocações, especialmente de conselheiros e ex-conselheiros do Carf e advogados que atuaram junto ao órgão. As investigações da Polícia Federal levaram ao indiciamento de executivos da Gerdau e do Bradesco, entre outros.

O clima esquentou mesmo quando o vice-presidente da CPI, Hildo Rocha (PMDB-MA), contou a "O Globo" que um empresário estaria sendo achacado por um membro da comissão para não ser convocado. Rocha não revelou o nome do empresário nem do deputado, colocando todos sob suspeita e levando o PSDB a pedir que a procuradoria-geral da República investigasse o caso.

Os tucanos, por sua vez, foram acusados de atuar para evitar a convocação dos grandes empresários; e o PT, de blindar o filho de Lula e ex-ministros de governos petistas. Em meio a manobras regimentais de obstrução de propostas ou esvaziamento de quórum, os trabalhos capengaram.

A ampliação do prazo de validade da CPI por 60 dias, aprovada por seus membros, chegou a ser sancionada quando Waldir Maranhão (PP-MA) era presidente interino da Câmara. Três dias depois, porém, Rodrigo Maia (DEM-RJ), já com o comando da Câmara nas mãos, revogou a prorrogação dos trabalhos. Maia reconheceu à "Folha de S. Paulo" que determinou o encerramento para cumprir um acordo firmado às vésperas de sua eleição para o cargo. O acerto havia sido fechado por Maranhão com integrantes de partidos como o DEM, o PSDB e o PSB, na presença de Maia. Maranhão depois recuou, dando um prazo extra de 60 dias à CPI.

Após ser eleito, Maia decidiu manter o acordo e determinou que os últimos 26 dias de trabalho da CPI fossem dedicados apenas à votação do relatório. Bacelar ainda tentou uma manobra para ganhar tempo, mas foi em vão. Maia chegou a ser acusado de ter encerrado a disputa no mesmo dia em que almoçou com o presidente da Gerdau, André Gerdau, e com o presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, além do presidente interino Michel Temer e do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e um total de 12 empresários, em evento organizado pelo Instituto Talento Brasil.

A vida curta e infrutífera da CPI do Carf mostra as dificuldades de avanço de uma investigação séria no Congresso em meio à diversidade de posicionamentos e pluralidade de interesses, em que muitos dos encarregados de questionar estão envolvidos e em que os interesses do povo e da República são as últimas coisas levadas em conta.

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