sábado, 27 de agosto de 2016

Radicalismo e solidão - João Domingos

- O Estado de S. Paulo

Ninguém pode desconhecer que o processo de impeachment de Dilma Rousseff – tenha o desfecho que tiver – causou profundas feridas na sociedade brasileira. São feridas que tendem a durar por muito tempo. Farão o PT sangrar mais do que outros.

Diferentemente do que ocorreu durante o afastamento de Fernando Collor, em que todo mundo o queria fora do governo e ele não tinha a quem pedir socorro, desta vez há um partido grande, forte e influente, o PT, que fez da resistência ao impeachment a principal bandeira da sua luta política, embora saiba que só um milagre o devolverá ao poder.

A renitência petista, por razões óbvias estampada nos discursos do ex-presidente Lula e nas ações de combate de alguns senadores do partido nas sessões do impeachment, aliados a uma solitária soldada do PC do B, terá reflexos nocivos.


Não se pode tirar do PT e de seus aliados o direito de lutar. Afinal, o poder é o objetivo final de qualquer partido que se dê ao respeito. Mas os petistas optaram por uma linha de defesa tão radicalizada, que é golpista qualquer um que não se declarar contrário ao impeachment. Não se aceita um meio termo. Sem humildade, eles omitem ainda as referências ao envolvimento de petistas em pesados esquemas de corrupção. Preferem dizer que outros é que se ligam a malfeitos. Em vez de unir, esse tipo de discurso desune. Em consequência, a tendência de potenciais aliados é se afastar.

Pela reação que se nota entre partidos que trafegam pelo campo político da centro-esquerda, como o PSB, antigo parceiro, não é exagerado dizer que os petistas terão muitas dificuldades para montar palanques para a eleição presidencial de 2018 com legendas de centro-esquerda e de centro. Sem estas últimas não se vence uma eleição.

Lula, por exemplo, só se elegeu presidente da República depois que o então presidente do PT, José Dirceu, costurou em 2002 um acordo com o PL de Valdemar Costa Neto, e este emprestou o senador-empresário José Alencar para a vice. Dirceu e Costa Neto seriam depois processados, julgados e condenados pelo mensalão.

Os problemas para o futuro próximo do PT vão além da montagem dos palanques. O candidato que cem entre cem petistas dão como certo de que vai disputar a eleição é Lula. Mas o ex-presidente tem vários obstáculos pela frente. Além da idade, pois estará com 72 anos em 2018, ele passa por um processo de desgaste demolidor. Hoje está com 65% de rejeição, de acordo com pesquisas recentes do Ibope, embora ainda conte com 23% a 25% da preferência dos eleitores numa eventual candidatura à Presidência. Também foi indiciado em dois processos, um na Lava Jato, outro por obstrução aos trabalhos da Justiça.

Caso Lula não tenha condição de se candidatar, o PT não teria um nome competitivo para disputar a sucessão presidencial. A grande esperança do partido e de Lula, assim que Fernando Haddad foi eleito, era fazer da Prefeitura de São Paulo uma administração que servisse de modelo para apresentar ao eleitor em 2018. Mas Haddad ficou longe do sucesso imaginado. Terá dificuldades para se reeleger.

O governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel, anunciado por Lula como um dos nomes do partido para a sucessão presidencial, está todo enrolado com a Operação Acrônimo, da Polícia Federal. É certo que não terá a mínima condição de se candidatar.

Some-se a tudo isso decisões como a do candidato petista à Prefeitura de Porto Alegre, Raul Pont, que abandonou a estrela do partido e preferiu omitir de seu material de campanha os nomes de Lula e de Dilma. Ele pode até vir a mudar por pressões à frente, mas só a reação inicial já dá mostras de como alguns candidatos tentam se desvincular de símbolos e nomes tradicionais do partido num momento de crise.

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