sábado, 17 de setembro de 2016

Acusações a Lula são anexadas à denúncia

• Delatores ouvidos pela Lava-Jato relataram envolvimento de ex-presidente, que aponta falta de provas

O Ministério Público anexou à denúncia contra o ex-presidente Lula depoimentos de delatores que acusam o petista de ter atuado no loteamento de cargos na Petrobras, destinado a levantar verbas para o PT e partidos aliados. Os procuradores sustentam que Lula é o “comandante máximo” do esquema. O ex-presidente diz que não há provas e que a Lava-Jato atua politicamente. No depoimento, o ex-senador Delcídio Amaral afirmou que Lula acomodou o PMDB na estatal para escapar do impeachment no mensalão. O ex-deputado Pedro Corrêa disse que o petista interferiu na nomeação de Paulo Roberto Costa na diretoria da estatal, que, segundo ele, atendeu “aos interesses do PP na arrecadação de propina”.

Estratégia de poder

• Em depoimentos anexados à denúncia de Lula, delatores dizem que petista fatiou Petrobras

Cleide Carvalho e Dimitrius Dantas - O Globo

CURITIBA E SÃO PAULO - Em meio à polêmica das acusações contra o ex-presidente Lula, o Ministério Público Federal anexou à denúncia vídeos de dois novos depoimentos de delatores, colhidos há menos de um mês em Curitiba, que acusam o petista de ter fatiado a diretoria da Petrobras para levantar verbas para o PT e partidos aliados. No dia 31 de agosto, o ex-senador Delcídio Amaral afirmou que Lula abriu espaço para o PMDB na Petrobras para escapar de um possível pedido de impeachment no mensalão e para poupar seu filho, Fábio Luís, de um indiciamento proposto pela CPI dos Correios. Ao depor um dia depois, o ex-deputado Pedro Côrrea, cuja delação não foi homologada pelo Supremo Tribunal Federal, apontou Lula como o mentor do loteamento de cargos na estatal, para angariar dinheiro para os partidos da base aliada.

Segundo Delcídio, depois do mensalão, Lula precisou estruturar uma base aliada mais consistente, com a presença do PMDB, em função do desgaste gerado pela investigação da CPI dos Correios, em 2006, presidida pelo ex-senador.

— Quando veio o mensalão, ele (Lula) percebeu, ou ele se arruma ou poderia ser impichado — afirmou Delcídio.

O ex-senador contou que Renan Calheiros (PMDB-AL) teria comandado o acordo que levou o PMDB do Senado a “tomar conta” do diretor da área internacional da Petrobras, Nestor Cerveró. O partido também passou a dominar o setor elétrico, antes feudo do PFL.

Se antes do mensalão, a arrecadação de propina era discreta, disse Delcídio, depois ficou “mais escrachada”:

— Aí as coisas escancararam mesmo, porque aí era uma máquina operando para atender partidos importantes da base, para garantir a dita governabilidade.

Ainda segundo Delcídio, para aprovar a CPMF, o PMDB da Câmara também exigiu o cargo de Cerveró, numa negociação feita pelo deputado Fernando Diniz, já falecido, mas com aval do “núcleo pensante” do partido.

— Quando vem a votação da CPMF, o PMDB da Câmara diz assim: “Ou vamos ter espaço na diretoria da Petrobras, na diretoria internacional, ou então não passa a CPMF aqui”. Aí, foi negociada a substituição do Nestor. Foi negociada com o deputado Fernando Diniz, já falecido, com as bençãos de Eduardo Cunha; (Michel) Temer, na época presidente da Câmara; Geddel (Vieira Lima secretário de governo de Temer) — contou Delcídio.

O ex-senador disse que Lula acompanhava pessoalmente as indicações na Petrobras.

— Se o diretor não desempenhasse, a reclamação era direto no Palácio do Planalto — afirmou.

Delcídio relatou que a Petrobras chegou a ter R$ 140 bilhões de orçamento para investir em cinco anos, o que a tornou a grande arrecadadora para os partidos. O PT, acrescentou, também arrecadava propina nos fundos de pensão das estatais e no BNDES.

Para exemplificar que Lula conversava com certa frequência com os diretores da Petrobras, Delcídio citou uma reunião do então presidente com Paulo Roberto Costa, indicado pelo PP, para discutir investimentos em refinarias.

Em seu depoimento, Pedro Côrrea afirmou que Lula chegou a dizer que o PP não deveria cobrar mais dinheiro, pois sabia, por meio de “Paulinho” (como se referia a Paulo Roberto Costa), que o partido já estava “bem abastecido”.

O GLOBO teve acesso à integra da transcrição do depoimento de Delcídio. Ele disse também que Lula sabia do empréstimo feito pelo PT em nome de José Carlos Bumlai, no Banco Schahin, que levou o pecuarista a ser condenado a 9 anos e 10 meses de prisão. Afirmou que Bumlai não faria a operação sem aval de Lula, seu amigo pessoal e “consiglieri da família”. Para o ex-senador, o contrato de US$ 1,6 bilhão do Grupo Schahin com a Petrobras, que quitou o empréstimo de R$ 12 milhões do PT, gerou propina de 1% do valor e não teria servido só à dívida de Bumlai.

A defesa de Lula afirmou, em nota, que as delações de Delcídio e Pedro Côrrea “não têm qualquer valor jurídico” e não alteram o fato de que o MPF apresentou denúncia contra Lula “sem qualquer prova”. Ressaltou que a delação de Corrêa não foi homologada pelo STF e que a delação de Delcídio não foi voluntária.

O presidente Michel Temer, por meio de assessoria, informou que nada tem a comentar. O ex-ministro Edison Lobão negou que tenha ocorrido fatiamento do setor de energia e que, quando ocupou o Ministério de Minas e Energia, nenhum partido exerceu hegemonia. O advogado de Delcídio, Antonio Figueiredo Basto, afirmou que a colaboração do ex-senador foi “voluntária e espontânea”.

O Conselho Nacional do Ministério Público rejeitou ontem pedido de liminar da defesa de Lula para que procuradores envolvidos na LavaJato fossem impedidos de se manifestar sobre o caso. Mas o conselheiro Valter Schuenquener deu prazo de 15 dias para que os investigadores prestem informações.

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