terça-feira, 20 de setembro de 2016

Anistia a caixa 2 enfrenta reação

Parlamentares denunciaram a tentativa de colegas de votar um projeto de lei que abre brecha para livrar acusados de caixa 2 de punição.

Parlamentares atacam manobra de colegas para anistiar caixa 2

• Após pressão, votação de projeto que pode livrar acusados de punição é adiada

Isabel Braga e Leticia Fernandes - O Globo

-BRASÍLIA- A possibilidade de votar um projeto que criminaliza o caixa 2 de campanhas eleitorais, que poderia abrir uma brecha para livrar da Justiça políticos que cometeram essas irregularidades no passado, provocou polêmica ontem no plenário da Câmara. A articulação para a votação estaria sendo feita por grandes partidos e tem como lastro uma das dez propostas de combate à corrupção apresentadas pelo Ministério Público, e que estão em debate numa comissão especial da Casa. A manobra foi revelada na coluna de Merval Pereira publicada domingo no GLOBO.

Líderes dos principais partidos se reuniram na Câmara, e o deputado Beto Mansur (PRBSP), que presidia a sessão, decidiu dar início à discussão do projeto em plenário. À noite, porém, diante da pressão para que a matéria fosse retirada de pauta ou para que a votação fosse nominal — o que permitiria identificar quem seria a favor —, Mansur desistiu da votação e encerrou a sessão.

À tarde, pegos de surpresa, deputados questionaram a inclusão na pauta de projeto de 2007 do ex-deputado Régis de Oliveira sobre pontos da reforma política, que seria a base para apresentação de uma emenda de criminalização do caixa 2. No entendimento de deputados, a emenda permitiria livrar os infratores.

Logo na abertura da sessão, diante do burburinho no plenário, o deputado Miro Teixeira (Rede-RJ) perguntou a Beto Mansur quais matérias que estavam na pauta. Mansur falou sobre as propostas principais, mas acabou admitindo que também havia o pedido para retomar o projeto de Oliveira.

— A Câmara ficará absolutamente exposta com esse tipo de coisa. Não podemos nos lançar num poço de suspeitas — pediu Miro Teixeira.

Líder do PSOL, Ivan Valente (SP) fez coro ao colega:

— Quem assume que pautou um projeto que vai ser execrado num momento que está para sair delação de OAS e Odebrecht? Vamos votar na calada da noite um projeto de anistia de caixa dois? Caixa dois é crime.

No plenário do Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP) leu trecho da coluna de Merval Pereira e também cobrou:

— Quero acreditar que o alerta de ontem, feito pelo jornalista Merval Pereira, não venha a se concretizar e não tenhamos a deformação da oitava das 10 Medidas Contra a Corrupção, propostas pelo Ministério Público.

Nos bastidores, líderes confirmavam a intenção de votar ainda ontem o projeto. A justificativa é de que se trata de proposta defendida pelo próprio Ministério Público, com o apoio de vários líderes. A intenção seria separar o que é caixa 2 e dinheiro doado a partidos fruto de propina. Embora publicamente os líderes neguem que isso signifique uma liberação pelos delitos passados, admitem que, se o caixa 2 não era considerado crime, a nova lei permitirá o entendimento de que só existe crime cometido a partir de sua vigência.

O presidente do PPS, Roberto Freire (SP), disse, no entanto, que a própria Justiça já está entendendo que é preciso separar o que é recebimento de recursos de propina de recursos doados por empresas, mas não contabilizados. Segundo ele, o próprio juiz Sérgio Moro tem dito que é preciso tomar cuidado e não misturar as duas coisas.

— É um grave equívoco discutir e votar isso agora. Melhor é aguardar o tempo da Lava-Jato. Não será bem entendida essa medida — afirmou Freire.

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