terça-feira, 13 de setembro de 2016

O Brasil não pode "ficar como está" - Yoshiaki Nakano

- Valor Econômico

• A reforma fiscal será a mãe das demais reformas. Os juros poderão cair e a taxa de câmbio se tornará mais competitiva

Parece que tudo está caminhando no Brasil para uma recuperação econômica. O "fundo do poço" já teria ficado para trás e alguns economistas chegam até a projetar um crescimento do PIB no próximo ano em 2%.

Depois da queda nos termos de troca, o crescimento da economia brasileira sofreu uma forte desaceleração já em 2013. A reação infantil do governo, ao diagnosticar a desaceleração como um problema simples de insuficiência de demanda agregada, e sua insistência numa política fiscal expansionista (combinada com uma mortal politica monetária de taxa de juros elevada) para promover o crescimento, gerou uma profunda crise de confiança, contração nos investimentos produtivos e do PIB, a partir de 2014.

A ascensão de Michel Temer à Presidência, com a nova equipe econômica prometendo promover reformas institucionais, trouxe uma recuperação da confiança e, neste primeiro semestre, a economia brasileira teria atingido seu pior nível.

Numa economia em condições normais, depois de dois anos de recessão, a recuperação cíclica deveria ser natural e forte. A previsão de 2% de crescimento do PIB seria uma previsão pessimista. Se fizermos um retrospecto histórico da economia brasileira desde 1900 esta previsão é ainda um desastre.

Contudo, nas atuais condições em que se encontra a economia brasileira, um crescimento de 2%, em 2017 é uma previsão bastante otimista. As promessas de reformas institucionais ainda não foram cumpridas. As decisões fiscais tomadas até agora, particularmente os reajustes salariais de segmentos do funcionalismo público, começam a minar a confiança conquistada. O fato é que não vimos ainda mudanças na política macroeconômica de curto prazo, nem no longo prazo.

A leitura que começa a ser feita é que o governo não tem sentido de urgência e nem a percepção da gravidade da situação fiscal que vivemos.

Alguns dados serão suficientes para percebermos a gravidade das condições econômicas em que vivemos. Tomemos aquilo que salta aos olhos: a aberrante taxa de juros que drena recursos tanto do setor privado como público e agrava a situação fiscal como uma bola de neve.

Primeiro fato notável é que a sociedade brasileira tem um dispêndio com pagamento de juros totalmente fora do padrão internacional. Uma pesquisa do professor Nelson Marconi, da FGV/EESP, utilizando os dados das contas nacionais, aponta que os pagamentos de juros do setor público e privado atingem a espetacular cifra de 40% do PIB, em 2011. Como pode crescer em uma economia sufocada pelo segmento financeiro, que apropria 40% do PIB? Não é por acaso que o custo médio do capital de empresas não-financeiras no Brasil seja mais de duas vezes o retorno do capital produtivo investido!

Estes gastos com juros, considerando apenas o setor público, na média de 1997 a 2014, atingiram 6,1% do PIB, comparado a uma média de países desenvolvidos de 1,98% do PIB e média dos emergentes, excluído o Brasil, de 2,44% do PIB, segundo dados apresentados pela DEPEC-Bradesco. Estes mesmos gastos em 2015 atingiram 8,5% do PIB.

Se as reformas institucionais prometidas pelo governo não forem implementadas, estes dados crescerão explosivamente. Segundo projeções do Departamento de Competitividade e Tecnologia da FIESP, se "tudo ficar como está", isto é, se mantivermos a dinâmica dos gastos públicos, sem mudanças nas vinculações e indexações e a mesma tendência de aumento na carga tributária, com sucessivos déficits públicos, a dívida pública chegará, em 2025, a 167,4% do PIB, com carga tributária de 44,5% do PIB.

É evidente que a taxa de investimento declinaria ainda mais e a economia brasileira não cresceria. Neste quadro, a taxa de desemprego cresceria para 17% e a situação social e política se tornará insustentável.

O mais alarmante neste quadro é que a elite que está no poder parece que não percebeu muito a gravidade da situação fiscal e a necessidade urgente de reformas. Por outro lado, a oposição a esta elite, a esquerda liderada pelo PT, continua numa fé religiosa de que a expansão dos gastos públicos é solução para a estagnação, incitando as massas a reivindicar mais e mais, como se fosse possível apropriar mais do que 100% do PIB.

O modelo atual de política macroeconômica, de taxa de juros elevada, taxa de câmbio apreciada e política fiscal expansionista se esgotou. A reforma fiscal será mãe das demais reformas necessárias. Feita esta reforma, a taxa de juros poderá cair no Brasil, equalizando-o com os demais países e a taxa de câmbio poderá ser mais estável e competitiva. Só aí teremos crescimento.
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Yoshiaki Nakano, com mestrado e doutorado na Cornell University, é professor e diretor da Escola de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/EESP)

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