segunda-feira, 24 de outubro de 2016

Nova fase, velha Fiesp – Editorial / Folha de S. Paulo

Que desfaçatez: num momento em que se discute um teto para a expansão dos gastos públicos, a Fiesp aproveita um encontro com a presidente do BNDES, Maria Silvia Bastos Marques, para pleitear que o banco, em vez de devolver ao Tesouro R$ 100 bilhões em empréstimos, use os recursos para ajudar o setor das indústrias.

A dívida do BNDES com a União monta a espantosos R$ 525 bilhões. Teve origem na tentativa dos governos petistas de estimular a economia com o uso de dinheiro público.

Na operação, o banco empresta ao setor privado com juros subsidiados e, para fechar as contas, recebe a diferença do Tesouro. Como este se financia pelas taxas de mercado, mais altas, sobra para o contribuinte um custo, estimado em R$ 27,4 bilhões apenas neste ano.

A devolução antecipada de parte dessa dívida foi solicitada em maio pelo governo de Michel Temer (PMDB). O BNDES não apresentou objeção; entende não haver prejuízo para sua capacidade de fazer empréstimos -hoje há sobra de recursos por falta de demanda.

Resta a aprovação do TCU (Tribunal de Contas da União), que avalia se a transferência não configuraria financiamento ilegal.

É desejável que os valores voltem ao Tesouro. Seria uma demonstração de que o governo se dispõe a economizar onde for possível.

Além disso, a essencial redução dos custos financeiros para as empresas será mais bem-sucedida se os juros caírem para todos, e não só para quem tem acesso ao BNDES.

Sabe-se o quanto é difícil a situação da economia, sobretudo do setor industrial. A combinação de recessão, queda de vendas e juros altos ameaça a sobrevivência de muitas empresas.

Recorrer a remendos individuais ou setoriais, contudo, está longe de ser a melhor opção de que o Brasil dispõe. Muito da atual crise econômica decorre do protecionismo e do intervencionismo exagerado adotados nos últimos anos -com o aplauso de diversos segmentos do setor privado que se viram beneficiados pelas boquinhas.

Talvez acostumada a deixar a conta do pato para os outros, a Fiesp parece ignorar que o país já não comporta demandas paroquiais. O esgotamento do Tesouro e o teto dos gastos impõem um pensamento novo, com soluções amplas e sistêmicas, abrangendo toda a sociedade.

Toda e qualquer política pública que importe em subsídios precisa estar alicerçada em análises de custo-benefício e em contrapartidas sólidas e mensuráveis.

No fundo, o problema é um só: o orçamento é finito e deve privilegiar aportes com impacto econômico e social mais abrangente, ou seja, deve chegar a quem precisa, de forma eficiente e com critérios claros para desembolso.

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