terça-feira, 11 de outubro de 2016

Polarização ideológica saiu fortalecida da eleição, diz Marina

Por Daniela Chiaretti, Cristiane Agostine e César Felício - Valor Econômico

SÃO PAULO - "Voto a gente não transfere. Não existe transferência de voto. Não acredito nisto", comentou a ex-senadora acreana Marina Silva, em entrevista ao Valor em que faz o balanço da primeira participação eleitoral do Rede Sustentabilidade, partido que criou no ano passado. A sigla de Marina elegeu cinco prefeitos e 180 vereadores e disputa três prefeituras no segundo turno: Macapá (AP), Serra (ES) e Ponta Grossa (PR).

A candidata presidencial derrotada nas eleições de 2010 e 2014 reconhece o magro resultado, que impactou o Rede sobretudo no Rio de Janeiro, onde o deputado federal Alessandro Molon teve 1,4% dos votos e a sigla ficou sem os dois vereadores que tinha. "Não dá para julgar a Rede como se tivesse dez anos [a ex-senadora se refere à sua sigla no gênero feminino]. A nossa métrica é diferente. Enfrentamos as novas regras eleitorais e apresentamos políticos novos. Mas a Rede vai se debruçar sobre seus problemas. O novo para se firmar tem um custo. Quem não está no espectro tradicional é o tempo todo massacrado", disse.

Os candidatos do Rede foram, na maior parte, "lideranças novas, pessoas que estão participando da política de uma forma que está fora dos escaninhos da política tradicional", comentou a ex-senadora.

Ela citou o desempenho de Ursula Vidal, candidata à Prefeitura de Belém, que obteve quase 11% dos votos válidos. E das dificuldades estruturais de Carlos Gomes, no Acre, e Ricardo Young, em São Paulo. "Dificuldades que Ricardo Young teve que manejar, com resultado eleitoral que não é o que gostaríamos de ter, mas nas nossas circunstâncias sempre soubemos que não seria fácil ter resultado diferente."

Marina afirmou que "a polarização nunca esteve tão forte" entre o que chamou de "guarda-chuva-azul e o guarda-chuva vermelho", em referência à esquerda e direita. "Os partidos hegemônicos buscam criar um campo gravitacional", disse.

A ex-senadora rechaçou a hipótese de participar de uma frente de esquerda em 2018. "A polarização nos levou ao precipício e não é adensando-a que vamos resolvê-la", afirmou. A consequência desta oposição binária, em seu entendimento, "é uma política estéril. A polarização tem feito um mal muito grande ao Brasil."

Marina voltou a dizer que não sabe se irá se candidatar às eleições presidenciais de 2018. Foi contundente, contudo, quanto a participar em uma chapa como vice do PSDB.

"Quem falou isso é alguém que está mentindo. Essa fonte ou é mentirosa ou é de má fé. Não sei se serei candidata. Já contribui para o Brasil em dois momentos", disse. Esta especulação surgiu em blogs de colunistas, citando como fontes dissidentes do Rede.

Marina Silva sinaliza que é preciso seguir na construção do Rede. "Um partido que tenha alguma densidade não se forma da noite para o dia", disse.

Marina defendeu a necessidade de uma reforma da Previdência, mas afirmou que Temer não tem credibilidade e nem legitimidade para propô-la, "porque mais de 60% da população deseja uma nova eleição", disse.

"Que há necessidade de uma reforma da Previdência, isso é inconteste", afirmou Marina. "A população brasileira está envelhecendo e temos pouco mais de 20 anos para resolver esse problema. Em breve teremos mais pessoas recebendo benefícios do que pessoas trabalhando para dar suporte a ele. Não tem como continuar do jeito que está."

Segundo Marina, as questões do ajuste fiscal "são tratadas no calor da crise". E, para a ex-senadora, "essa crise tem autor, chama-se PT e PMDB, que estiveram no governo juntos até ontem."

A ex-ministra do Meio Ambiente mostrou ressalvas em relação à PEC 241, que cria um teto de gastos públicos por um prazo de até 20 anos e irá condicionar o mandato dos próximos quatro presidentes. "Não há dúvida de que é necessário um ajuste, um equilíbrio nas contas públicas" registra. "Agora, o governo Temer, em vez de reduzir o gasto público, aumentou para R$ 170 bilhões. Boa parte dos problemas que terão que ser enfrentados, estão sendo projetados para o futuro, para 2018", criticou.

O Rede enfrentou nos dias seguintes da eleição uma crise, com a saída de diversos dissidentes, entre eles o ex-secretário nacional de Segurança Luiz Eduardo Soares. O grupo, em um manifesto, acusou Marina de ser centralizadora e de não ter posição clara sobre diversos pontos da agenda do governo Temer. Marina rebateu as críticas, afirmando que o texto é incoerente. "Há uma evidente contradição. Em um parágrafo se diz que a Rede e eu não temos posição, no outro, diz que a Rede se curva às minhas posições", disse.

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