terça-feira, 29 de novembro de 2016

Nova queda do PIB - Míriam Leitão

- O Globo

O Banco Central vai decidir amanhã a nova taxa de juros no mesmo dia em que o IBGE divulgará a sétima queda consecutiva do PIB. Hoje, o governo enfrentará o desafio de aprovar a PEC do teto de gastos no Senado no meio do agravamento da crise política. As projeções para o crescimento de 2017 voltaram a cair, e a alta do dólar freou a queda das estimativas da inflação. Há mais dúvidas sobre a recuperação.

A agenda da semana está carregada de eventos importantes para a economia. As apostas para o corte de juros na reunião do Copom já foram de meio ponto percentual, mas agora virou praticamente consenso que a dose será menor, de 0,25. Ainda há dúvidas sobre a aprovação do ajuste fiscal pelo governo Temer, e a eleição de Donald Trump, nos EUA, deixou o cenário mais difícil para as economias que passam por dificuldades, como é o caso do Brasil.

Essa cautela em relação à queda dos juros está tendo impacto direto nas projeções do PIB do ano que vem. A estimativa do mercado medida pelo Boletim Focus chegou a 1,36% há algumas semanas, mas voltou a cair e ontem foi para 0,98%. O economista Raul Velloso avalia que a crise se agravou nos últimos tempos.

— Criou-se a expectativa de que a economia já teria batido no fundo do poço, mas agora se sabe que o buraco é mais profundo. Hoje, ninguém mais tem noção sobre qual será exatamente o trimestre em que o PIB voltará a crescer. Quem disser que sabe está mentindo — disse.

Velloso explica que a troca de governo reduziu as taxas de risco do Brasil, o que favorece os investimentos. O problema é que a Selic não caiu na velocidade desejada. O consumo continua fraco, por causa do desemprego e do endividamento, e a crise fiscal dos estados está se aprofundando.

É difícil saber por onde será retomado o crescimento. Como não é possível produzir uma nova onda de consumo, por todas as óbvias razões, o aumento do nível de atividade teria que ser decorrência de aumento de investimento. No setor privado, o investimento aconteceria se houvesse aumento da confiança na recuperação. No setor público, falta capacidade de investir e há insegurança em relação às regras.

— A forma mais rápida de crescer seria via investimentos em infraestrutura, em projetos que já estão concedidos. Mas o governo não está conseguindo renovar essas concessões, porque tem um receio muito grande do TCU. Somente a ampliação da Dutra poderia gerar R$ 3 bilhões em investimentos. Há vários outros casos que poderiam ajudar neste momento de dificuldade — disse Velloso.

Uma rara notícia boa foi o resultado das contas públicas em outubro. A receita da repatriação de ativos elevou o superávit primário para R$ 39,6 bilhões, recorde histórico. A questão é que, segundo o Itaú Unibanco, se essas receitas estivessem fora do conta o setor público consolidado teria tido um novo déficit, de R$ 5,4 bilhões. O problema é estrutural e as receitas atípicas apenas amenizaram o tamanho do buraco.

O Departamento de Estudos Econômicos do Bradesco estima que o PIB do terceiro trimestre, que o IBGE divulgará amanhã, terá uma retração de 0,9%. Se acontecer, será uma aprofundamento da queda, que foi de 0,4% no primeiro trimestre e 0,6%, no segundo. A indústria e os investimentos devem voltar a cair.

Em um momento como este, em que a inflação está em queda, e, portanto, a taxa de juros real está subindo, e em que a recessão não dá sinais de terminar, o Banco Central deveria reduzir mais fortemente as taxas de juros, mas ele não fará isso porque o país está dominado pela incerteza.

A crise do ex-ministro Geddel Vieira Lima aumentou a instabilidade do governo. A reação do presidente Temer no fim de semana, garantindo que o governo não patrocinará, nem ele sancionaria, a anistia ao caixa 2 eleitoral, é parte do esforço de afastar o clima de crise que ficou após o movimento na Câmara para a aprovação da anistia e da denúncia do ex-ministro Marcelo Calero.

Temer disse na entrevista de domingo que a economia não pode ter uma virada de uma hora para outra. É verdade. Mas a política pode azedar o ambiente rapidamente. Foi o que aconteceu desde que Calero acusou o governo, inclusive o presidente, de ter se mobilizado na defesa de interesses privados. É nesse clima difícil que o país viverá esta semana.

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