sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

Salvou-se – Editorial/Folha de S. Paulo

Causa fundo desalento na opinião pública o desfecho encontrado pela maioria do Supremo Tribunal Federal, nesta quarta-feira (7), para o impasse opondo o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), ao ministro do STF Marco Aurélio Mello, que em medida liminar e monocrática decidira por afastá-lo do cargo.

Colocado pelo próprio tribunal, há poucos dias, na condição de réu por crime de peculato —e alvo de mais 11 outros inquéritos—, Renan Calheiros certamente não ostenta requisitos éticos mínimos para se manter à frente do Senado.

Um dos principais alvos das manifestações anticorrupção do último domingo, o peemedebista parece dotado de infinita capacidade de sobrevivência. De um modo que espantosamente confirma seu poder político, o Supremo assegurou-lhe a intocabilidade de que desfruta.

Sem dúvida, variados argumentos jurídicos podem ser invocados a seu favor. A decisão monocrática de Marco Aurélio, concluindo pelo afastamento, trazia componentes de intempestividade e de ambiguidade na interpretação da lei.

Criara-se, na verdade, uma espécie de quebra-cabeça lógico com sua liminar. Tal gênero de decisões unilaterais exige, pelo texto legal, que haja urgência na deliberação —o que de fato não havia.

Decidia-se uma questão que, em si mesma, não continha tais características. Tratava-se de aplicar, ao caso Renan Calheiros, a regra de que um réu não pode constar como eventual sucessor do presidente da República.

Ocorre que, no raciocínio de Marco Aurélio, não havia como dissociar a condição de presidente do Senado daquela de eventual sucessor de Michel Temer (PMDB). O tema da urgência desaguou, assim, na decisão de afastá-lo do cargo.

Por maioria de votos, o STF decidiu "fatiar" a questão, impedindo Renan de suceder ao presidente, mas capacitando-o a continuar à testa do Senado, o que de qualquer forma será por tempo breve.

Enfraquece-se o tribunal, por mais de um motivo. O senador o afrontara diretamente, ao recusar-se a receber a ordem de seu afastamento. Com que moral se poderá punir, de agora em diante, outro cidadão que desobedeça às determinações de um magistrado?

Ademais, o papel de Renan como articulador de importantes medidas econômicas no Congresso foi reconhecido, em alguns votos do STF, como fator a ser considerado.

O STF possuía a imagem de estar acima do conchavo político. No que tem toda a aparência de sê-lo, Renan dá sinais de que, mantido no cargo, não persistirá no projeto contra abusos de autoridade. Poderá abusar da sua, ao que tudo indica, por mais tempo.

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