quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

Corte de vagas é o maior em 30 anos

Desde 2015, foram fechadas 420 mil vagas com carteira assinada no Estado do Rio, na pior crise de emprego em três décadas, informa Daiane Costa

A pior crise em 30 anos

• Desde 2015, foram fechados 420 mil postos de trabalho com carteira assinada no estado

Daiane Costa | O Globo

A recessão dos últimos dois anos atingiu em cheio o mercado de trabalho do Estado do Rio, que viveu seu pior período nas últimas três décadas, apesar de toda a expectativa criada em torno das vagas geradas pelos Jogos Olímpicos. É o que mostra levantamento feito pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) com base em dados do Ministério do Trabalho. Entre 2015 e 2016, foram fechadas 420,5 mil vagas formais no Rio — o correspondente a quase um quarto dos dois milhões de empregos criados nos 14 anos anteriores (2000 a 2014). É um desempenho pior do que o da década de esvaziamento econômico, entre 1989 e 1999, quando o estado acumulou uma perda de 389 mil postos de trabalho formais, de acordo com a Firjan.

Num outro recorte, essas 420,5 mil vagas eliminadas representam 43,1% do total de postos abertos entre 2007 e 2014. Nessa comparação, o Rio foi a unidade da federação que mais fechou vagas formais de trabalho, segundo a Firjan, mas todos os estados e o Distrito Federal ficaram com saldo negativo no período.

Economistas apontam que a industrialização do interior do estado, a valorização do preço do petróleo, o boom imobiliário e o avanço da renda, impulsionando comércio e serviços, ajudaram a construir o período de bonança no mercado de trabalho nos anos 2000 no estado, que também foi na esteira do pujante crescimento da economia brasileira.

— Você teve criação de empregos quando houve geração de empregos no país inteiro. O estado se beneficiou disso. E agora tivemos dois anos seguidos de perda muito significativa do PIB brasileiro. Foram dois anos terríveis para o país. Não tem como aqui ser diferente. É uma situação dramática. E poderia ter sido pior sem a Olimpíada. O Rio teve essa vantagenzinha até o início do ano passado. Foi uma crise muito concentrada em dois anos, diferentemente dos anos 1990, quando houve períodos de alta e baixa na atividade — analisa João Saboia, economista da UFRJ.

LEVE MELHORA NO SEGUNDO SEMESTRE
Em segundo lugar vem o Espírito Santo, com eliminação de 38,3% das vagas criadas nos sete anos anteriores; depois Amapá, com 33,9%; Minas Gerais, com 30,4%; e São Paulo, com 28,5%. Roraima foi o estado que menos fechou postos (0,1%) na mesma comparação.

Lúcia Helena Barreto, de 47 anos, e o companheiro, Raphael Soares Tavares, de 25, trabalhavam na mesma rede de supermercados até o fim do ano passado, quando foram demitidos junto com um grupo de cerca de 90 pessoas. Ela era auxiliar de cozinha, e ele, repositor de mercadorias. Lúcia Helena está procurando emprego em casa de família, mas não descarta outras alternativas:

— Eu tenho experiência em serviços gerais e como cozinheira, mas não me aperto. Já fui até camelô para ajudar a pagar as contas lá de casa. Se precisar, vendo água e sorvete lá perto de casa mesmo, em Madureira. Já Raphael quer fazer curso profissionalizante: — Estou pegando qualquer trabalho que apareça, mas tenho vontade de fazer curso técnico para conseguir oportunidades melhores.

As previsões para o mercado de trabalho do estado, no entanto, assim como para o Brasil, são que o desemprego continue elevado em 2017, arrefecendo um pouco no segundo semestre. Os dados mais recentes do IBGE para o Rio, medidos pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), mostram que o número de desempregados já estava perto de um milhão no terceiro trimestre de 2016, e a taxa de desemprego atingia 12,1% da força de trabalho do estado — um pouco maior que a média nacional naquele período (11,8%). O grupo de ocupados também nunca foi tão pequeno desde que essa pesquisa começou a ser feita, em 2012. Só 7,2 milhões de pessoas estavam empregadas no Rio no trimestre encerrado em setembro.

No caso do Estado do Rio, economistas destacam que os atrasos no pagamento de servidores públicos e o risco de enxugamento desses quadros, que têm um peso grande na geração de riquezas local, são um entrave adicional para a melhora do mercado de trabalho, já que são famílias que deixam de comprar e contratar serviços. Segundo dados mais recentes da Relação Anual de Relações Sociais (Rais) do Ministério do Trabalho, a participação da administração pública na geração de renda no Estado do Rio é de 25%.

— A falta de solução para a crise fiscal do país afeta tanto a atividade econômica quanto o mercado de trabalho. Tanto empresas quanto consumidores são movidos por expectativas, e isso é uma grande trava para o consumo das famílias, para os investimentos das empresas e, logo, para a geração de empregos — observa Guilherme Mercês, economista-chefe da Firjan.

Nesses últimos dois anos, o setor que mais demitiu no Estado do Rio foi serviços, que eliminou 169,5 mil vagas, seguido da construção civil (-111,5 mil) e da indústria de transformação (-83 mil postos de trabalho).

— O estado e a capital do Rio são conhecidos pela prestação de serviços, que está diretamente ligada à extração de petróleo e à renda das famílias. Ambas perderam muito nos últimos dois anos. A construção civil também teve um peso econômico grande no Rio, por conta do boom imobiliário, mas os setores que mais cresceram são os que mais sofreram com a crise — avalia Fábio Bentes, economista da Confederação Nacional do Comércio e Serviços (CNC).

Para Bruno Ottoni, economista e pesquisador do Ibre/FGV, o saldo de empregos no estado em 2017 ainda vai ficar negativo, e a informalidade deve voltar a crescer, funcionando como uma alternativa ao desemprego:

— O setor de serviços tem um nível de informalidade alto, e, como ele tem tradição no estado, é natural que pessoas acabem empreendendo nessa área, mesmo que de forma informal.

Colaborou Annelize Demani, estagiária sob a supervisão de Daiane Costa

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