segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

Em SP, Doria usa posse para lançar Alckmin presidente

Por Cristiane Agostine, Ricardo Mendonça, José de Castro e Paula Selmi | Valor Econômico

SÃO PAULO - No comando da cidade com o maior eleitorado do país, o prefeito João Doria (PSDB) usou ontem seu discurso de posse para defender a candidatura à Presidência da República do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, do mesmo partido. À plateia repleta de correligionários, mas sem lideranças nacionais tucanas, Doria bradou: "Com Geraldo Alckmin, vamos colocar o país nos trilhos". Em seguida, foi ovacionado.

Durante a cerimônia de transmissão de cargo de Fernando Haddad (PT) para Doria no Theatro Municipal, o tucano explorou o mote de sua campanha, de "João trabalhador", ao exaltar que o importante é "acordar cedo, trabalhar duro, com honestidade, decência e respeito pelos mais pobres". Nesse momento, uma pessoa da plateia gritou: "Vamos colocar São Paulo nos trilhos". Foi a deixa para Doria adaptar a frase e defender Alckmin à Presidência.

Antes da fala de Doria, o clima "pró-Alckmin presidente" já parecia latente entre os aliados do prefeito. Quando o governador foi chamado para discursar, alguns da plateia gritaram "presidente" em meio aos aplausos.

Em seu discurso, Alckmin buscou fazer conexões entre o Estado e o país, em uma tentativa de nacionalização do sentido do evento. "Ao longo de nossa história, as ruas de São Paulo inúmeras vezes demonstraram sua inequívoca capacidade de refletir a vontade nacional. O Brasil fala mais alto aqui", disse o governador.

No evento de transmissão de cargo, participaram pelo menos sete secretários da gestão Alckmin, anunciados durante o evento, mas lideranças tucanas do Estado como os ministros Alexandre de Moraes (Justiça), José Serra (Relações Exteriores) e o senador Aloysio Nunes Ferreira não compareceram. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso também não foi e nem ligou para o prefeito. Doria afirmou ter recebido uma "mensagem carinhosa" de FHC por WhatsApp, o aplicativo de troca de textos.

O prefeito elogiou em diversos momentos seu padrinho político e disse que Alckmin é um "grande brasileiro", que governa com "eficiência, decência, transparência, grandeza, humildade". O governador foi citado até mesmo quando Doria anunciou que poderá recuar de propostas e promessas. O prefeito disse que sua gestão "saberá ouvir e que terá humildade, seguindo o exemplo de Alckmin, de sempre que necessário e comprovadamente necessário, recuar para poder avançar".

Nos três discursos que fez - dois no teatro e um na Câmara Municipal, mais cedo- o prefeito afirmou que não vai governar para um partido, "mas para todos", garantiu que vai ficar no cargo pelos próximos quatro anos e que não tentará um novo mandato em 2020. O tucano defendeu um governo ousado e novamente sinalizou que poderá recuar de medidas. "Qualquer erro cometido com ousadia é facilmente corrigido. Todos admiram os corajosos, ninguém louva os covardes. Faremos uma gestão corajosa".

Ao reforçar o mote de "João trabalhador", o tucano anunciou que começará o primeiro dia de trabalho hoje às 6h vestido de gari, junto com todos os seus secretários, com a mesma vestimenta. Doria disse que o fato de vestir-se como um gari é uma "demonstração de igualdade e humildade". A equipe irá varrer e limpar um corredor viário que começa na Praça 14 Bis, na região central.

Na Câmara Municipal, o prefeito repetiu a palavra "respeito" e afirmou que o Executivo deve respeitar o Legislativo. Doria prometeu que ouvirá os vereadores e disse que disse que seu governo despachará uma vez por mês na Câmara com os parlamentares.

Depois do anúncio das medidas, o prefeito negou que seu governo será demagógico, ao ser questionado. "Demagogia não, será gestão", disse o prefeito, ao parar para cumprimentar populares ao chegar no Theatro Municipal.

Durante a transmissão de cargo, entre as principais autoridades estava o cardeal de São Paulo, dom Odilo Scherer, que se disse surpreso de ter sido convidado para falar no evento. O convite partiu do próprio tucano. O cardeal fez uma crítica indireta a Haddad ao dizer que "há necessidade de dar grande atenção ao povo da periferia" e pediu para Doria olhar pelos mais carentes, que estariam abandonados.

Em aceno a dom Odilo, Doria deu especial destaque à sua fé e disse sempre fazer orações. "Tenham fé meus amigos e minhas amigas. Seja qual for sua fé, professe, não negue sua fé, exerça sua fé. Vai ajudar você a vencer, a superar e a compreender a grandeza da fé, que não é a grandeza material. Não é ter, é ser".

Outro destaque do evento foram as trocas de gentilezas entre Doria e Haddad. "Fiz uma transição como se tivesse feito com um irmão", disse o petista, sob aplausos. Depois, foi novamente elogiado pelo tucano. A troca de gentilezas apareceu desde o início do discurso de Haddad. "Vou chamar o prefeito de João porque temos uma relação cordial e amistosa há bastante tempo", disse. "Eu o prestigio usando essa gravata, que ele me deu de presente na semana passada", destacando a peça azul, "uma das mais bonitas que eu tenho".

Depois de afirmar que São Paulo é uma das cidades mais "eletrizantes" do mundo, Haddad afirmou ter certeza que Doria terá a "estatura" e a "envergadura" para honrar o desafio.Na metade final de sua fala, o petista destacou a questão financeira. "Você recebe uma cidade em ordem", afirmou, dirigindo-se a Doria. "Você está com caixa para honrar todos os compromissos assumidos por essa gestão, e uma dívida que é um terço da que eu herdei".

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