segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

Pluralidade na folia – Editorial | O Globo

• Hoje, entre os quase 500 blocos com autorização para desfilar, existem opções para todos os gostos

Um dos pontos positivos do carnaval de rua no Rio é que ele não tem amarras — e os poucos grupos que importaram da Bahia a ideia das cordinhas foram devidamente rechaçados, pelos próprios foliões. O renascimento dos blocos, espécie de retomada do carnaval carioca, trouxe muita coisa boa e, como era de se esperar, alguns efeitos colaterais, como a sujeira deixada pós-desfile. Mas, como mesmo durante o reinado de Momo há que se ter regras, as autoridades trataram de estabelecer normas e providenciar uma infraestrutura mínima para a festa, que inclui banheiros químicos e esquemas de trânsito.

E o carnaval seguiu, animado e, cada vez mais, diversificado. Há um bom tempo as marchinhas deixaram de ter exclusividade na folia de rua. Hoje, entre os quase 500 blocos autorizados pela Riotur a desfilar — e existem outros tantos não habilitados que saem assim mesmo, tornando a festa ainda mais democrática —, existem opções para tudo quanto é gosto. Quem é fã de Chico Buarque, tem o Mulheres de Chico; música brega, o Fogo e Paixão; Raul Seixas, o Toca Rauuul; Zeca Pagodinho, o Mulheres de Zeca; samba retrô, o Primeiro Amor; música sertaneja, o Chora Me Liga; trilhas de cinema, desenhos animados e comerciais, o Marcha Nerd; MPB, o Monobloco; música baiana, Agytoê. Só para citar alguns.

Diante disso, não dá para entender o rebuliço causado no meio carnavalesco pelo anúncio de que a prefeitura havia permitido o desfile da Banda Eva, da Bahia, depois de duas tentativas frustradas do grupo em anos anteriores. As críticas vieram não apenas de representantes da folia. Moradores do Jardim Oceânico, na Barra, engrossaram o coro dos descontentes, embora a autorização oficial fosse para o Recreio, e não para a Praia do Pepê, como queriam os organizadores. E o desfile aconteceria somente no dia 4 de março, sábado das Campeãs, portanto, pós-carnaval.

Em meio à polêmica, a Banda Eva divulgou um comunicado na quarta-feira passada anunciando que não iria mais desfilar. Aparentemente, o motivo não teve a ver diretamente com as críticas, mas com o lugar escolhido para a apresentação: o Parque Olímpico, na Barra da Tijuca. O grupo baiano agradeceu a autorização dada pela prefeitura, mas argumentou que a “realização do desfile no Parque Olímpico, um local fechado, não contempla a energia e o modelo de carnaval de rua esperado pelo grupo Eva e pelos cariocas.”

O grupo de axé seria mais um ingrediente no rico universo da folia carioca, hoje aberta a todos os ritmos. Como comprova, por exemplo, o bem-sucedido Sargento Pimenta, que toca Beatles. O temor de que a banda de axé importasse de Salvador os abadás e cercadinhos — elementos estranhos à folia carioca — não se justifica, já que, no Rio, eles são proibidos. Para o bem da folia.

Independentemente de qual tenha sido o real motivo da desistência do grupo Eva, sairá perdendo o carnaval de rua do Rio.

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