terça-feira, 31 de janeiro de 2017

Recuperação e expectativas - Editorial | O Estado de S. Paulo

Os brasileiros terão uma boa surpresa até o fim do primeiro trimestre, prometem fontes da equipe econômica do governo. O crescimento, garantem, será retomado já no começo do ano. A reação, lenta no início, será conseguida com medidas de estímulo, baseadas em boa parte em maior oferta de crédito. Os mesmos informantes anunciam para breve ações destinadas a reanimar o setor imobiliário. A liberação de R$ 30 bilhões das contas inativas do FGTS também é parte do cenário de reativação. Expectativas podem fazer diferença. Obviamente essas fontes põem parte de suas fichas na melhora do humor de empresários e consumidores.

Sondagens divulgadas nas últimas semanas têm mostrado sinais de maior otimismo – ou menor pessimismo, em alguns casos – e isso entra nos cálculos. Mas expectativas podem mudar em pouco tempo, se faltarem dados concretos para sustentar a aposta em tempos melhores. Por enquanto, as novidades boas são limitadas. Os ministros econômicos sabem disso e precisam trabalhar duramente para multiplicá-las.

Inflação em queda, juros em baixa e uma promissora safra de grãos e oleaginosas – arroz, feijão, milho, soja e trigo são os principais produtos – são provavelmente as três principais notícias positivas. São dados importantes, mas insuficientes para garantir uma ampla recuperação da economia. Economistas de instituições financeiras e das principais consultorias continuam projetando para este ano um Produto Interno Bruto (PIB) 0,5% maior que o de 2016.

Esse número é a mediana das estimativas fornecidas ao Banco Central (BC) por uma centena de fontes do mercado. A recuperação, segundo o Ministério da Fazenda, será mais sensível no fim do ano. A comparação dos dados do último trimestre de 2017 com os do último do ano passado mostrará, segundo o ministro Henrique Meirelles, um crescimento em torno de 2%. Pode ser, mas esse resultado só será conseguido se as condições de consumo e de produção forem reconstruídas ao longo do ano. Para isso os chamados agentes econômicos deverão estar dispostos a apostar.

Há sinais de melhor disposição, mas, por enquanto, esses indicadores apenas começam a definir-se. Em janeiro, o consumidor mostrou-se mais confiante, segundo sondagem da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Melhora semelhante foi detectada em pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Mas os comerciantes mostraram-se menos confiantes do que em dezembro, de acordo com relatório da Confederação Nacional do Comércio (CNC).

“As incertezas quanto à recuperação do mercado de trabalho e da atividade econômica têm injetado cautela nos tomadores de decisão e do setor produtivo como um todo”, comentou na última semana do mês uma economista da CNC.

Nesta segunda-feira mais uma pesquisa sobre o estado de espírito dos brasileiros foi acrescentada ao conjunto. Em janeiro, o Indicador de Incerteza da Economia, produzido pela FGV, caiu 9,1 pontos e chegou a 127,3 pontos, depois de dois meses de alta. Boa notícia, mas o índice ainda é alto e continua longe “do nível neutro para a economia brasileira, algo entre 95 e 105 pontos”, advertiu o economista Pedro Costa Ferreira, da FGV.

De modo geral, o estado de espírito dos brasileiros pode ter melhorado, a partir do meio de 2016, mas uma pergunta continua sem resposta: de onde virá o empurrão inicial para a retomada dos negócios?

O desemprego deverá dificultar a retomada do consumo. As compras poderão aumentar, mas a cautela e a perda de renda funcionarão como freios. Empurrões poderão vir de mais de uma fonte – limitados, mas suficientes, em conjunto, para fazer alguma diferença. O BC projeta maiores exportações. Se parte do aumento vier da indústria, haverá maior efeito positivo sobre o emprego e, portanto, sobre o consumo. Estímulos ao setor imobiliário poderão ter efeitos multiplicadores, por causa da variedade de materiais usados na construção. Enfim, o governo poderá contribuir de forma direta, se destravar as concessões de infraestrutura. Esse passo está demorando.

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