sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

O nome certo para o Itamaraty – Editorial | O Estado de S. Paulo

Desde o afastamento de Dilma Rousseff, a diplomacia brasileira, sob o comando do chanceler José Serra, deixou de servir ao sectarismo ideológico de um partido político para colocar em pauta a defesa dos verdadeiros interesses nacionais. Passaram para o primeiro plano as preocupações com a ordem econômica mundial, a abertura de mercado para os produtos e serviços brasileiros e o realinhamento do Brasil com as nações e organizações internacionais empenhadas na promoção dos direitos humanos. Passou-se, também, a ver a integração da América Latina, em especial o Mercosul, com outros olhos, mais práticos e ansiosos por resultados concretos. Com o pedido de demissão de Serra por razões de saúde, o desafio que se coloca agora diante do presidente Michel Temer é garantir que, quem quer que venha a ser o novo ministro, esteja assegurada a manutenção pelo Itamaraty da política externa que recolocou o Brasil no mundo moderno e está reabrindo as portas da economia à indispensável participação dos investimentos externos.

A política exterior brasileira vigente durante os quase 13 anos e meio em que o PT esteve no poder se manteve sempre e rigorosamente atrelada às diretrizes políticas e ideológicas do Foro de São Paulo, organização de partidos e movimentos de esquerda da América Latina criada, por iniciativa de dirigentes petistas, num primeiro encontro realizado em junho de 1990 na capital paulista.

Especializou-se essa política, entre outras extravagâncias, a exaltar a personalidade do presidente Lula da Silva. Essa política externa desastrada resultou dos pensamentos enviesados do chanceler Celso Amorim e do todo-poderoso assessor presidencial Marco Aurélio Garcia. Sucedido o governo Lula pelo de Dilma Rousseff, Celso Amorim cedeu lugar para diplomatas que mal esquentaram a cadeira, todos incapazes de atender aos caprichos mal formulados da presidente.

Marco Aurélio Garcia, no entanto, mesmo sem ter a influência que exerceu no governo Lula, continuou a postos, mantendo a política externa amarrada às confusas visões de mundo concebidas pelo lulopetismo e fecundadas pelo bolivarianismo do coronel Hugo Chávez. A festa acabou quando Garcia foi demitido por Temer em seu primeiro dia de governo provisório.

Já nos primeiros dias da interinidade de Michel Temer, o Itamaraty reagiu energicamente à tentativa bolivariana de estigmatizar como “golpe” o impeachment de Dilma Rousseff. Em nota oficial, sob o título Manifestações sobre a situação interna brasileira, a Chancelaria foi categórica: “O Ministério das Relações Exteriores rejeita enfaticamente as manifestações dos governos da Venezuela, Cuba, Bolívia, Equador e Nicarágua, assim como da Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América/Tratado de Cooperação dos Povos (ALBA/TCP), que se permitem opinar e propagar falsidades sobre o processo político interno no Brasil. Esse processo se desenvolve em quadro de absoluto respeito às instituições democráticas e à Constituição Federal. Como qualquer observador isento pode constatar, o processo de impedimento é previsão constitucional; o rito estabelecido na Constituição e na Lei foi seguido rigorosamente, com aval e determinação do STF; e o vice-presidente assumiu a presidência por determinação da Constituição Federal, nos termos por ela fixados”.

Em menos de um ano à frente do Itamaraty José Serra conseguiu desatrelar o Brasil do ideário esquerdista bolivariano, a começar pela neutralização da influência da Venezuela no Mercosul – do qual foi suspensa no fim do ano passado por não ter cumprido acordos e tratados do protocolo de adesão ao bloco. Outra importante conquista do Itamaraty pós-PT foi superar os entraves aos acordos bilaterais de comércio, imposição ideológica altamente prejudicial aos interesses comerciais brasileiros.

A nomeação do novo chanceler já está despertando a cobiça dos políticos insaciáveis por poder que integram a base parlamentar do governo. O País confia, porém, que o presidente Temer saberá escolher um novo chanceler com a competência e determinação necessárias para manter e aperfeiçoar a política externa brasileira.

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