terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

Tamanho da queda - Míriam Leitão

- O Globo

Há um quase consenso no mercado de que a Selic vai cair 0,75 ponto percentual. É um corte forte, mas desde que o BC começou a reduzir os juros, em outubro, a inflação caiu ainda mais. Isso fez com que os juros reais subissem quando se compara IPCA com a Selic atual. Quando a conta é feita olhando para frente — a expectativa de inflação e os juros futuros — houve queda, mas a taxa ainda é alta.

Como a diminuição da inflação foi mais forte do que a redução da Selic, houve aumento da taxa real de juros, na medida que o mercado chama de ex-post. Em pouco mais de um ano, ela subiu de 3,54% para 7,65%. Mas o que os economistas mais olham é o ex-ante, ou seja, a expectativa de inflação comparada aos juros futuros, e, nessa medida, ela despencou. O problema é que, mesmo assim, é alta para um país que está há dois anos em recessão.

Há espaço para uma redução mais agressiva nos juros, mas os economistas dizem que o Banco Central tem indicado, nos seus comunicados, que prefere fazer um ciclo mais longo do que um corte maior agora. Pelo nível de atividade, em queda há sete trimestres, e pela taxa de inflação, que caiu em um ano e um mês de 10,71% para 5,35%, com previsão de novas reduções nos próximos meses, há, sim, espaço para um corte de um ponto percentual, desde que decidido, claro, por razões técnicas e não por influência política.

O Brasil teve uma experiência recente que mostra que o voluntarismo na política monetária não dá certo. Em 2011, o Planalto forçou uma queda maior das taxas. A decisão virou combustível para elevação da inflação, e a Selic voltou a subir.

Por outro lado, os economistas dizem que, pela ótica das expectativas de inflação, os juros despencaram. Alexandre de Ázara, economista-chefe da Mauá Investimentos, acha que o BC até poderia acelerar os cortes mas não acredita que isso será feito.

— Pegando juros futuros e expectativa de inflação, os juros reais estão em queda forte, já em 5,7%. O BC até poderia acelerar, mas acho que ele vai manter o ritmo de queda da Selic para reforçar a comunicação e enfrentar as incertezas no campo político — afirmou.

O economista José Márcio Camargo, da Opus Gestão de Recursos, concorda. Ele avalia que o ritmo de 0,75 ponto será mantido para que o BC possa consolidar o cenário de inflação mais baixa. Explica que, mesmo nesse ritmo, os juros reais vão cair em ambas as formas de se fazer a conta.

— Em algum momento, a inflação vai parar de cair e a Selic vai continuar em queda. Então no fim do ciclo de cortes, os juros reais estarão na casa de 5% e poucas vezes na história isso aconteceu. O BC trabalha para consolidar a inflação baixa — disse.

É preciso reduzir os juros de forma estrutural, mas no curto prazo há outros elementos que afetam diretamente a política monetária. A direção do BC tem que considerar que o país tem um déficit púbico enorme, sem perspectiva de eliminação do desequilíbrio primário em pouco tempo. O BC precisa manter também no seu radar o ambiente político de enorme incerteza. Há reformas tramitando que podem levar a uma redução do problema fiscal no médio prazo, mas nada é garantido em um momento tão cheio de turbulências na política.

O mercado aposta em Selic em um dígito no fim do ano, mas o economista Arnaldo Curvello, da Ativa Investimentos, acha que a taxa não cairá abaixo de 10% e pode até subir para 11% em 2018:

— Com a recuperação do PIB, acredito que haverá recomposição de margens em vários setores da economia. Além disso, será ano eleitoral, e isso pode pressionar o dólar. O BC talvez faça um ajuste nos juros para lidar com essa turbulência.

Há um equilíbrio precário que terá que ser medido pelos dirigentes do Banco Central. O país precisa retomar o crescimento para diminuir o desemprego, mas ao mesmo tempo o déficit fiscal está alto demais. Há propostas de reformas, mas o ambiente na política é turbulento.

Do ponto de vista da economia, poderia sim haver um corte de 1%. A recessão é profunda, e a queda dos juros ajudaria a estimular o nível de atividade, principalmente porque a inflação está chegando no centro da meta. O dólar e o risco-país, medido pelo CDS, caíram muito nos últimos meses. A política, porém, permanece conflituosa e o poço fiscal ainda é enorme.

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